Está na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (7), a análise do recurso de uma das suas decisões mais controversas com repercussão geral, que ameaça a liberdade de imprensa. Em novembro de 2023, o colegiado da Corte decidiu que empresas jornalísticas de qualquer natureza podem ser responsabilizadas civilmente por injúria, difamação ou calúnia por causa de declarações feitas por pessoas entrevistadas.
Também foi fixada a tese de repercussão geral, que deve ser usada como baliza por outras instâncias para julgamentos de casos similares. O caso concreto analisou uma ação que trata de uma entrevista publicada em 1995 pelo jornal Diário de Pernambuco.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apresentou embargos de declaração (um tipo de recurso) sete dias depois, visando a esclarecer os termos do julgamento e também propôs nova tese para análise dos ministros, que agora está na pauta.
O jornal Diário de Pernambuco também apresentou embargos.
Reações ao STF
À época do julgamento, jornalistas e entidades de imprensa, como a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Abraji, criticaram a redação da tese final.
Segundo as entidades, os termos, considerados amplos e vagos, dariam margem para ataques à liberdade de imprensa e ao direto constitucional de acesso à informação.
A Abraji afirma ainda que a medida pode ser aplicada de forma inconstitucional, de forma que viole a liberdade de imprensa.
Entenda o caso
A tese fixada pelos ministro do STF trata de uma ação referente à entrevista publicada em 1995 pelo jornal Diário de Pernambuco.
Na publicação, Ricardo Zarattini Filho (1935-2017) foi acusado por um entrevistado de ter participado de um ataque a bomba em 1966 que deixou três mortos no aeroporto de Guararapes. Zarattini foi militante do PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário) e deputado federal pelo PT de São Paulo. Ele é pai do atual deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP).
A Corte já havia decidido que o jornal deveria ser responsabilizado pela declaração. Agora, com a fixação da tese, a definição deve ser usada para guiar outros casos semelhantes que tramitam na Justiça.
Eis a tese fixada pela Corte:
“A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas”.
“Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.
Congressistas apresentam projeto para derrubar o entendimento do STF
Também em reação à controversa decisão do STF, congressistas apresentaram projeto de lei e até uma proposta de emenda à Constituição tratando do assunto.
O deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP) apresentou em 1º de novembro de 2023, um projeto de lei para anular a decisão do STF que responsabiliza civilmente jornais por eventuais informações falsas pronunciadas por entrevistados. O deputado federal Mendonça Filho (União Brasil- PE) é coautor do texto.
A proposição dos congressistas estabelece a não imputação de responsabilidades à atividade da imprensa. “As empresas jornalísticas não podem ser responsabilizadas civilmente por fala de entrevistado, mesmo se à época da publicação havia indícios concretos da falsidade de imputação e se o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos”, diz um dos artigos. Confira a íntegra do PL nº 5.817/2023.
Na justificativa do projeto, Kataguiri afirma que a decisão do STF “limita a atividade da imprensa e viola a liberdade de expressão e comunicação, que são direitos fundamentais”.
PEC
O senador Rogério Marinho (PL-RN), líder da Oposição no Senado, apresentou um projeto de emenda à Constituição (PEC) que, na prática, invalida a decisão do STF que responsabiliza jornais por declarações de entrevistados. Trata-se da PEC nº 67/2023. Eis a íntegra do texto.
A PEC inclui um parágrafo no artigo 220 da Constituição Federal. Eis o que diz a nova redação:
“§ 7 – Veículo de comunicação não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa”.
“A proposta que ora submetemos ao Senado visa a estabelecer segurança jurídica aos veículos de comunicação e de imprensa no exercício regular de sua atividade de informar“, declarou o senador na justificativa da proposta.
No total, 28 senadores assinam a PEC. Para ser aprovada, é necessário que 49 senadores, de um total de 81, votem a favor da proposta. Depois, 308 dos 513 deputados teriam de dar o aval também.
Por razões não reveladas, os três senadores do Pará não subscreveram apoio à PEC da Liberdade de Imprensa. Eis os nomes dos senadores que assinam a PEC junto a Rogério Marinho:
• Eduardo Girão (Novo-CE);
• Mecias de Jesus (Republicanos-RR);
• Alan Rick (União Brasil-AC);
• Jorge Seif (PL-SC);
• Margareth Buzetti (PSD-MT);
• Marcos Pontes (PL-SP);
• Styvenson Valentim (Podemos-RN);
• Marcos Rogério (PL-RO);
• Lucas Barreto (PSD-AP);
• Marcio Bittar (União Brasil-AC);
• Luis Carlos Heinze (PP-RS);
• Wilder Morais (PL-GO);
• Magno Malta (PL-ES);
• Chico Rodrigues (PSB-RR);
• Damares Alves (Republicanos-DF);
• Jaime Bagattoli (PL-RO);
• Izalci Lucas (PSDB-DF);
• Sergio Moro (União Brasil-PR);
• Cleitinho (Republicanos-MG);
• Carlos Portinho (PL-RJ);
• Esperidião Amin (PP-SC);
• Dr. Hiran (PP-RR);
• Hamilton Mourão (Republicanos-RS);
• Tereza Cristina (PP-MS);
• Ciro Nogueira (PP-PI);
• Plínio Valério (PSDB-AM);
• Wellington Fagundes (PL-MT).
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.