Brasília – O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), após mais de mês do resultado da eleição, anunciou a primeira rodada de nomes que integrarão o pelotão ministerial de seu terceiro governo. OS demais nomes serão anuniados aos poucos. Apenas na semana que vem está previsto a entrega dos 32 relatórios setoriais que detalharão a modelagem do novo governo, inclusive a quantidade final de ministérios e secretaria especiais com status de ministério.
Se a expectativa dos movimentos de esquerda que apoiaram a eleição de Lula, em especial os mais identitários, era a construção de um ministério “inclusivo”, com paridade entre homens e mulheres, maior presença de negros e outras minorias, os primeiros anúncios do presidente eleito frustraram quem nutria essa ideia.
Pouco antes do anúncio dos cinco primeiros nomes de seus ministros homens, de meia idade, brancos (apenas Flávio Dino se autodeclara pardo junto ao Tribunal Superior Eleitoral) — Lula afirmou: “Vocês devem estar pensando: ‘presidente Lula, não tem mulheres, não tem negros?’. Vai chegar uma hora que vocês vão ver mais mulheres aqui do que homens, vai chegar uma hora que vocês vão ver a participação de muitos companheiros afrodescendentes aqui.”
Durante a coletiva à imprensa, ao ser questionado sobre a falta de diversidade, Lula apontou para o ex-governador do Maranhão e futuro ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), e disparou: “Não entendo você pensar que esse cara é branco. Se ele fosse perguntado pelo IBGE, no mínimo ele ia dizer que era pardo.”
Na sequência, Lula garantiu que vai “tentar montar um governo que seja a cara da sociedade brasileira em sua total plenitude”. “Quando você monta um governo, monta olhando o conjunto da sociedade brasileira (…) e vai escolher das pessoas que são aptas para determinadas funções. Esses companheiros que estão aqui são aptos, eu diria são pessoas da mais extraordinária qualificação e qualidade para exercer a função que lhes foi delegada. Vai ter outros ministérios e vocês vão ver que vamos colcoar muita gente para participar”, disse.
Promessas de campanha a aliados
Durante um debate na Band, em agosto, Lula preferiu não se comprometer com a paridade numérica de gênero em seu ministério. “Você vai indicar quem tem capacidade para o cargo. Pode até ter maioria de mulheres, mas não se pode assumir o compromisso numericamente”, declarou.
Na época, a reação de aliadas foi um movimento tentando convencer o petista a preencher pelo menos 30% das vagas com mulheres. “Lula sempre teve uma política feminista no governo dele. Poderia ter afirmado um porcentual mínimo, não precisava ter ficado na defensiva. Tem que ter resposta concreta”, disse a deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ). Na sexta, no entanto, Feghali se limitou a comemorar a escolha: “Parabéns aos novos ministros!”
Responsável pela elaboração do plano de governo de Lula, Aloizio Mercadante — cotado para assumir o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) —, ressaltou na ocasião a impossibilidade de fixar um porcentual de mulheres e minorias raciais nos ministérios. “A participação paritária de negros e mulheres é uma meta política do PT, mas é preciso saber quais vão ser as indicações dos outros partidos com os quais vamos compor o governo”, justificou.
De acordo com aliados de Lula, pelo menos um terço de mulheres era o desenho inicial para cargos do primeiro escalão na Esplanada dos Ministérios. Segundo esses interlocutores do presidente eleito, o assunto é uma preocupação da futura primeira-dama Rosângela Silva, a Janja, para quem uma maior equidade de gênero seria importante neste momento. Integrantes da transição, inclusive, estariam citando a fotografia do gabinete do primeiro-ministro canadense Justin Trudeau, com ênfase para diversidade de gênero e raça, como um referencial para o novo governo.
Reação de apoiadores
A reação à falta de “diversidade racial e de gênero”, esperada por apoiadores e militantes, veio logo em seguida ao anúncio. “Errou o presidente Lula ao começar com cinco homens. Péssimo”, reclamou a jornalista Míriam Leitão. A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, cotada para assumir, mais uma vez, o Ministério do Meio Ambiente, elogiou os escolhidos, mas cobrou diversidade. “Parte muito importante do time já foi revelada hoje pelo técnico Lula. Chegou a vez de serem escaladas as mulheres, juntamente com os pretos, os jovens e os indígenas de nossa esperançosa seleção”, tuitou.
“Independente do acerto nos nomes anunciados [Dino e Haddad são excelentes nomes] e em que pese mais nomes virão, é um erro político e estratégico grave que Lula e Alckmin não anunciem ministras no primeiro anúncio. Política é feita de sinais e este é um mau sinal. Que melhore”, opinou o advogado Thiago Amparo, articulista na imprensa paulista.
Reação semelhante foi a da professora do departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) Lorena Barberia. Cinco ministros anunciados pelo presidente Lula e nenhuma mulher. Mulheres são mais de 50% da população e foram decisivas na vitória do governo”, escreveu no Twitter. “Estou recebendo respostas que as mulheres precisam ter paciência, que precisamos entender que há outros ministérios. Minha resposta: Sei fazer contas, sou cientista política, e não ganhamos nada ‘esperando’”, completou.
Monica de Bolle, membro do Instituto Peterson de Economia Internacional, em Washington, concordou com a cientista política: “Exatamente. Sobretudo porque os anúncios foram de cinco Ministérios estratégicos, sempre reservados aos homens. Poderia Lula ter usado essa oportunidade, SIM, para mostrar a que veio em relação às mulheres”, respondeu pela rede social.
A data do anúncio, pouco antes do jogo do Brasil contra a Croácia na Copa do Mundo, também foi motivo de piadas e questionamentos nas redes sociais. “Ainda bem que não é o Lula que escala a seleção brasileira!”, reagiu o deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP). “Brincadeiras à parte, a escolha desses ministros só confirma que teremos anos difíceis pela frente”, comentou.
Trio na articulação política
Lula continua com as últimas tratativas para fechar a articulação política do seu novo governo. Os prováveis nomes são: Alexandre Padilha (PT-SP), deputado federal, para o ministério responsável pela articulação política; Jaques Wagner (PT-BA), senador, para a Liderança do Governo no Senado; José Guimarães (PT-CE), deputado federal, para a Liderança do Governo na Câmara.
Alexandre Padilha é médico e trabalhou durante muitos anos em Santarém e transferiu seu domicílio eleitoral do município para São Paulo, onde se elegeu deputado federal. Foi ministro da Saúde no governo de Dilma Rousseff (PT) e da Secretaria de Relações Institucionais no 2º mandato de Lula à frente do Planalto. É tido como um negociador habilidoso. No entorno do presidente eleito, a expectativa é que o deputado seja anunciado para o cargo na semana que vem numa segunda rodada de anúncio dos novos ministros, provavelmente na terça-feira (13). Na véspera, Lula será diplomado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Os demais nomes não necessariamente serão anunciados ao mesmo tempo. Devem ficar para o início dos trabalhos do Congresso, em fevereiro de 2023. Jaques Wagner é um dos mais graduados integrantes do PT e amigo de Lula há mais de 40 anos. Ele se envolveu no esforço político para aprovar no Senado a PEC (proposta de emenda à Constituição) que permite ao novo governo furar o teto de gastos para bancar promessas de campanha em 2023 e 2024.
O provável ministro da articulação política, por ser deputado, tem mais trânsito na Câmara. Deve ter o auxílio de Wagner enquanto aumenta sua inserção entre senadores. José Guimarães é o principal responsável pela articulação da PEC na Câmara. Também é um dos petistas com melhor interlocução com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que deve conseguir a reeleição ao cargo.
Há, ainda, um 4º posto importante para a articulação política do governo: o líder no Congresso. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) é citado para o cargo. Não há, porém, um nome consolidado.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.
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