O próximo prefeito de Marabá terá de encarar um desafio que persegue o município há mais de 100 anos, mas que sempre é jogado para debaixo do tapete: garantir saneamento básico, de forma universal, aos atuais 235 mil moradores da 4ª mais populosa área urbana do Pará. E não só. Será preciso resgatar literalmente da fossa a dignidade da população, que está pejorada como a que vive na cidade com os piores indicadores conjuntos de oferta de saneamento básico entre as localidades com mais de 100 mil habitantes do Brasil.
No final de semana, Marabá estrelou um estudo da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) em que aparece como a pior cidade num pacote de oferta de serviços compostos por água encanada, coleta e tratamento de esgoto, coleta e destinação de resíduos sólidos. A esses indicadores adiciona-se a taxa de internações por doenças causadas pela falta de saneamento básico. De uma escala de 0 a 500 pontos pelo pacote de serviços, a nota da cidade mais movimentada do interior paraense foi de 127,77.
As informações foram levantadas com exclusividade pelo Blog do Zé Dudu, que também identificou que as três piores grandes cidades brasileiras são do Pará. Além de Marabá, estão boiando no mesmo esgoto Ananindeua (137,69 pontos) e Santarém (140,48 pontos). A capital paraense, Belém, é a 9ª pior cidade brasileira e a 2ª pior capital nacional, com nota 180,77. Sua vizinha Marituba, com nota 162,42, é a 6ª pior.
É uma situação nada gloriosa que expõe o Pará e suas cidades, pela enésima vez, ao ridículo e afugenta investidores, que correm léguas de ambientes precários, apelidados nos bastidores como favelões e pocilgas urbanas. Para a Abes, Marabá, Ananindeua e Santarém são os municípios mais distantes de alcançar a universalização do acesso ao saneamento básico, hoje privilégio de somente três cidades paulistas e todas as quais com Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) entre os mais elevados do Brasil. São Caetano do Sul, Rio Claro e Piracicaba são as únicas cidades, entre 5.570, que ofertam saneamento básico com nota máxima a todo mundo.
Para chegar ao nível delas, Marabá, última colocada, ou teria de priorizar os investimentos locais em saneamento para conseguir oferecer saneamento a todos em, pelo menos, 15 anos, ou, no ritmo atual, será eternamente subdesenvolvida. Hoje, a cidade paraense com os melhores (ou menos piores) indicadores de saneamento é Altamira (350,44 pontos). A sede do maior município do mundo foi beneficiada em parte por investimentos sanitários como contrapartida social pela instalação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
Parauapebas é 21ª pior
A riquíssima cidade de Parauapebas, onde a nota é 228,55 pontos, é a 21ª pior do Brasil em saneamento básico entre as 170 cidades consideradas de grande porte. Com cerca de R$ 13 bilhões em receitas arrecadadas ao longo de pouco mais de três décadas, a prefeitura local nunca conseguiu ofertar serviços estruturais de forma plena.
Falta água encanada para 10% da população; 84% dela convivem com esgoto a céu aberto; e em se tratando de destinação adequada do lixo recolhido, a nota é zero. Por tudo isso, a cada 100 mil parauapebenses, 74 adoecem e vão parar em hospitais todos os anos por falta de saneamento básico, é mais que o dobro das internações registradas em Marabá pelo mesmo motivo, 35 por 100 mil.
Outra que também passa vergonha é Canaã dos Carajás. A cidade que tem uma das dez prefeituras proporcionalmente mais ricas do país — pelo tamanho da população oficial governada — amarga 273,56 pontos no grupo das cidades pequenas e médias. Sem esgoto para metade da população, com tratamento baixo e nota zero em destinação de resíduos, Canaã está longe de ser uma “terra prometida” no quesito saneamento básico. Serão necessários ao menos oito anos de ininterruptos investimentos no setor para corrigir o grave opróbrio a que a cidade foi relegada. Mesmo endinheirada, Canaã tem menos oferta de saneamento que cidades do sertão nordestino ou do vale do Jequitinhonha mineiro, duas das áreas mais pobres do país. É a dura realidade da riqueza e das lástimas num só casamento precário