Durante a sessão ordinária desta terça-feira (25), a Câmara Municipal de Marabá (CMM) abriu uma discussão sobre meio ambiente e sustentabilidade, sugerido pela vereadora Vanda Américo (UNIÃO) por meio de requerimento e com a participação de Bernardo Tomchinsky, da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa); Pablo Santos, da Fundação Casa da Cultura de Marabá (FCCM); e André Macedo, chefe do Núcleo de Gestão Integrada do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Carajás.
Os convidados apresentaram um projeto de criação de unidades de conservação no Paleocanal do Rio Tocantins.
Américo alertou que é preciso “colocar as barbas de molho” com tantos eventos climáticos que estão acontecendo em vários cantos do Brasil, e advertiu que é preciso fortalecer a luta pela preservação das riquezas ambientais que ainda existem em Marabá e região, como as unidades do Paleocanal do Rio Tocantins.
“Desde a década de 1970, os pesquisadores estão lutando pela criação de unidades de conservação próximo ao Rio Tocantins. Estamos trazendo essa causa ambiental para a Câmara, porque sabemos de como essa Casa Legislativa é mobilizadora e consegue levar mensagem aos deputados federais para fazerem lobby junto ao governo federal para que essas duas unidades sejam criadas,” afirmou.
O geólogo Pablo Santos disse que a comunidade científica da região de Carajás se mobiliza em prol da criação de duas Unidades de Conservação de Uso Sustentável – chamadas de Área de Proteção Ambiental (APA) do Paleocanal do Rio Tocantins e a APA Bico do Papagaio. O que falta para que o projeto saia do papel e se torne realidade é o apoio político, e também da sociedade.
“A ideia é uma proposta de criação de duas APAs que são de uso sustentável. Elas são compatíveis com a agricultura familiar,” explicou.
No total, 304 lagos estão localizados nas regiões, que somadas, possuem expressivos 128.461,82 hectares – o que equivalente à área total do município de São João do Araguaia.
Especificamente, a APA Paleocanal do Rio Tocantins abrange regiões dos municípios de Marabá, Itupiranga e Nova Ipixuna, onde se concentram 56 lagos em uma área de 31.736,9 hectares. Nesses locais também existem cinco Projetos de Assentamento (PA) – unidades agrícolas instaladas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em um imóvel rural.
A APA Bico do Papagaio é três vezes maior, com 96.724,92 hectares e sua ocupação se estende pelos estados do Pará, Tocantins e Maranhão. Ela inclui os municípios de Bom Jesus do Tocantins, São João do Araguaia, Marabá, Esperantina, São Sebastião do Tocantins, Buriti do Tocantins, São Pedro da Água Branca e Vila Nova dos Martírios. Essa região ostenta 248 lagos e reúne 22 PAs.
Criar as áreas de preservação em regiões antropizadas não é um problema, contudo, pode ser desafiador uma vez que as APAs devem ser unidades de uso sustentável. Não há intenção de retirar desses territórios as pessoas que já moram neles. Além disso, o Paleocanal do Rio Tocantins possui uma imensurável importância geológica, biológica e arqueológica que ainda precisa ser catalogada.
Há meio século, em 1974, o projeto Radar da Amazônia (Radam) sugeriu pela primeira vez a criação das duas unidades de reserva biológica, conceituadas naquele momento como “Áreas de Proteção ao Ecossistema para Preservação da Flora e Fauna”.
A proposta inicial versava sobre a fundação da “Reserva Biológica do Tocantins-Araguaia”. Atualmente, parte da área proposta naquela época está inserida na APA Bico do Papagaio.
Já na segunda unidade, então chamada de “Reserva Biológica do Rio Tocantins”, hoje em dia está localizado 50% do polígono da APA do Paleocanal do Rio Tocantins, batizado em 1984 pelo geógrafo Aziz Nacib Ab’Saber. Então, a recém-criada FCCM assumiu os estudos nas regiões dos lagos de Marabá, sendo a instituição responsável por receber a visita de Ab’Saber.
Anos depois, ele publicou um artigo onde recomendava a preservação do Paleocanal do Tocantins.
Em 1988, o Instituto do Desenvolvimento Econômico-Social do Pará (Idesp) avaliou esta zona e entendeu que, graças a sua intensa antropização, seria inviável a criação das reservas apontadas pelo Radam. A entidade então orientou a implementação de APAs.
Os registros históricos de todo o estudo da área ao longo dos últimos 40 anos, atualmente estão sob os cuidados da FCCM, que os assumiu em 1984. Desde então, a fundação já catalogou 55 espécies de plantas aquáticas, 30 de palmeiras, 42 lagos plotados, 27 sítios arqueológicos e 72 espécies de orquídeas.
Além disso, foram identificados pelo menos cinco ecossistemas: campina, campinarana, terra firme, lacustre e floresta de várzea. As comunidades abrigam uma imensidão de animais de diversas espécies, sendo computadas em torno de 281 só de vertebrados.
Para além do estudo ambiental, a FCCM, politicamente, fez diversas tentativas de criar algum mecanismo de proteção para essa região. A própria Lei Orgânica do Município indicou o Paleocanal do Rio Tocantins como área de importância para conservação, mas até 2015, data do último relatório da entidade sobre o assunto, nenhuma providência havia sido tomada para preservação da região na esfera municipal.
Pablo Santos revela que mais de 400 lagos foram extintos nos últimos 15 anos, de acordo com análise técnica realizada pela equipe da Fundação Casa da Cultura de Marabá. O próximo passo, segundo ele, é conseguir apoio das comunidades, com reuniões com associações agrícolas das regiões beneficiadas, além de dialogar com deputados federais para defenderem o projeto.
Bernardo Tomchinsky, da Unifesspa, também usou a tribuna para endossar e reforçar a importância dos dois projetos de criação das unidades de conservação ambiental: “A proposta principal é proteger o ecossistema que está em processo de degradação avançado”.
Ele informou que o mais recente estudo construído por várias mãos está disponível para quem desejar ter acesso: “[O relatório] parte da sociedade, com envolvimento de vários pesquisadores, mas de outros órgãos, como Semas [Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade] e ICMBio”.
De acordo com Tomchinsky, foram desmatados 8.853,4 quilômetros quadrados em Marabá, e apenas 28,32% de área protegida. Fora de áreas de conservação e Terras Indígenas, há apenas 13,28% vegetação conservada. “Marabá é um município grande em área geográfica, mas o território desmatado é muito maior do que a área permitida pela legislação. Cerca de 80% do que não é protegido está desmatado,” lamenta o professor da Unifesspa.
Chefe do Núcleo de Gestão Integrada do ICMBio Carajás, André Macedo falou sobre a proteção das seis unidades de Conservação do Mosaico Carajás, sendo que três delas têm áreas dentro de Marabá. “Não se cria uma nova unidade de conservação se não for com mobilização social,” resumiu.
Os projetos de criação de novas APAs entraram em fila com 240 outros projetos para criação de UC federal, explicou. Ele é lento para priorizar o processo participativo da sociedade, inclusive com esse momento com discussão junto à CMM.
Macedo explicou também que a criação de uma APA não causa prejuízo aos moradores já assentados, mas ajuda a potencializar, por exemplo, turismo de base comunitária e a realização de projetos e parcerias para fortalecer a produção local.
O vereador Márcio do São Félix (PSDB) parabenizou os convidados pelos estudos realizados, entendendo que é preciso continuar a mobilização social para que os dois projetos sejam aprovados, seja nessa geração ou para as futuras. “Só temo que quando isso acontecer, não haja mais nada a preservar nessas duas áreas,” advertiu.
O presidente em exercício da CMM, Ilker Moraes (MDB), parabenizou a Fundação Casa da Cultura de Marabá por coordenar um estudo tão relevante e reconheceu que é dever do parlamento sensibilizar a bancada federal do Pará para cobrar do governo federal a aprovação dos projetos de APA. “As discussões amplas são altamente importantes para fortalecer a luta pela conservação do meio ambiente em nossa região,” concluiu.