O governo federal editará nos próximos dias, por meio do Ministério do Desenvolvimento Regional, uma Medida Provisória (MP) que colocará na parede as construtoras que paralisaram obras com recursos da União, do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV). pelo texto da MP, as construtoras que não aceitarem retomar os trabalhos terão de devolver com juros os recursos já recebidos da União em municípios com até 50 mil habitantes.
Numa auditagem minuciosa nos contratos, o governo descobriu que estão inconclusas 44.426 moradias em 1.895 municípios de 25 estados. Desse universo, o Estado do Pará é um dos líderes do ranking nacional da paralisação, com metade das obras estagnadas. Não se vê viva alma em 19 das 42 obras previstas do Minha Casa, Minha Vida em solo paraense, de acordo com o Sindicato das Indústrias da Construção Civil (Sinduscon), o que representa cerca de 23 mil famílias à espera da casa própria no Estado.
O Minha Casa Minha Vida foi lançado em 2009 pelo Governo Lula, mas há paraenses inscritos no programa desde 2013 aguardando sua vez para realizar o sonho de ter a casa própria.
Segundo o presidente do Sinduscon, Alex Carvalho, o dinheiro liberado pelo governo federal não cobre os custos dos serviços. “O que se quer é uma solução rápida e que seja em prol das pessoas que estão esperando pelas unidades”, afirmou.
O ritmo das 23 obras em andamento também desacelerou. O residencial Viver Maracacuera, em Icoaraci deve conter 960 unidades habitacionais, que começaram a ser construídas em 2018. O engenheiro de planejamento do empreendimento, Marcos do Carmo, disse que o número de operários na obra deveria ser maior. “Nós estamos hoje com algo em torno de 300 homens trabalhando na obra”, informou, temendo novos atrasos. A previsão de conclusão, segundo ele, passou para dezembro de 2020 numa estimativa otimista, mas a obra deve entrar pelo ano de 2021.
Consultado pela Reportagem, o deputado federal Joaquim (PSD-PA) que é arquiteto de formação, disse: “Acabei de receber uma minuta do projeto do governo nesse exato momento que você está falando comigo, ainda não analisei o escopo da MP e não posso fazer um juízo de valor, mas te adianto que, se a linha de corte para a retomada das obras paralisadas alcança os municípios de até 50 mil habitantes, é sinal que o governo vai injetar dinheiro novo, mas isso não vai resolver o problema”.
O parlamentar crê ser necessária uma imediata ação política e vai levar o assunto para a pauta da próxima reunião da bancada paraense tão logo o texto da MP chegue à Câmara dos Deputados. “Esse problema vem do governo passado. Contrataram a construção de 50 mil unidades habitacionais e só tinham em caixa dinheiro para pagar 25 mil. No atual ambiente econômico temos de analisar com muito cuidado a questão da geração de empregos que a indústria da construção civil sempre lidera numa retomada da economia. Outra coisa é analisar os prejuízos que as construtoras tiveram com o atraso do repasse dos recursos que não foram pagos pela Caixa Econômica como estabelecido nos contratos”, explicou Joaquim Passarinho.
Realidade de 2019
Estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM) aponta que o programa enfrenta grave crise com queda de recursos, em especial do Orçamento Geral da União, e grande volume de obras paralisadas. Até o momento, não há perspectivas de novas contratações para atendimento da Faixa 1 – que hoje atende os grupos familiares com renda de até R$ 1,8 mil.
Nos últimos dias, o governo tem sinalizado a priorização de setores para retomada de obras paralisadas e conclusão das que estão em andamento. Estudo técnico inédito da CNM revela que cerca de 58% dos recursos do então Ministério das Cidades estavam alocados no Minha Casa Minha Vida.
A pesquisa aponta para o volume de obras paralisadas na área rural e à inoperância do programa em municípios que possuem população de até 50 mil habitantes. O programa apresenta sérias dificuldades de operacionalização em mais de 80% dos municípios brasileiros.
Em reuniões no Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), o presidente da CNM, Glademir Aroldi, reforçou a importância da manutenção do Minha Casa. Ao ministro, Gustavo Canuto e ao Secretário Nacional de Habitação do MDR, Celso Matsuda, Aroldi destacou a demanda dos prefeitos e lembrou que, apesar da queda nos investimentos, o programa é um importante gerador de econômica local.
Texto final
O texto da MP está agora no Ministério da Economia, onde se discute a liberação de R$ 280 milhões para o término das obras, sendo R$ 150 milhões em recursos novos, segundo dados do governo. A MP trata da modalidade do programa para cidades de até 50 mil habitantes e famílias com renda de até R$ 1,6 mil por mês o que ameaça a continuidade dos projetos no Pará devido essa linha de corte do ministério. “Esse ponto será um ponto de atrito”, prevê o deputado federal Joaquim Passarinho.
As obras dessa modalidade do programa que a MP quer atacar estão paralisadas desde 2018, porque expirou o prazo para conclusão previsto em lei. A MP não trata de regras para a expansão do Minha Casa, Minha Vida.
O texto determina que empresas ou agentes financeiros responsáveis por obras atrasadas devem se manifestar em até dois meses (a partir da assinatura da MP) para demonstrar interesse em entregar as unidades habitacionais. Caso não haja resposta, o governo deve inscrever os inadimplentes na dívida ativa da União.
Os recursos que restam para finalizar a construção só seriam liberados após a entrega da unidade. Segundo nota assinada no começo de novembro por técnicos do MDR, a ideia é distribuir gradativamente os recursos: R$ 100 milhões em 2020; R$ 100 milhões em 2021; e R$ 80 milhões em 2022.
A medida deve permitir ainda que Estados e municípios trabalhem com as empresas para a conclusão das obras, desde que não sejam utilizados recursos da União. A troca de ofícios entre técnicos do Desenvolvimento Regional e da equipe econômica mostra que havia interesse em inserir na proposta de Orçamento de 2020 recursos para a conclusão das obras – o que não ocorreu.
Em documento ao secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, o número dois do MDR, Mauro Biancamano Guimarães, afirma que um novo aporte será necessário para terminar as obras, mesmo contando com os recursos do chamado restos a pagar – despesas registradas no Orçamento, mas transferidas de um ano para outro. O ofício foi enviado em 13 de novembro.
Para ganhar força de lei, a MP precisa ser assinada pelo presidente Jair Bolsonaro e publicada no Diário Oficial. O texto ainda poderá ser alterado no Congresso, com sugestões de deputados e senadores.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu, em Brasília