As coisas não estão nada boas para a economia e as finanças de Parauapebas. Nesta segunda-feira (28), com a cotação do minério de ferro — principal produto local — abaixo de 100 dólares a tonelada no mercado internacional, a notícia por si só poderia ser ruim. Mas não para por aí: agora, o mercado transoceânico passou a demandar minério de ferro de médio teor, o que vai levar a mineradora multinacional Vale a focar em produto fora de Carajás. As informações foram levantadas pelo Blog do Zé Dudu.
O minério de médio teor, geralmente com concentração de ferro abaixo de 60%, é característico das minas do sudeste do país. O teor do minério, no entanto, é diferente do teor médio para dimensionar o preço de referência, que é o produto com concentração de ferro acima de 62%.
Nas minas de Carajás, o minério do tipo hematita é considerado de alto teor, da ordem de 65% nas serras Norte (Parauapebas), Sul (Canaã dos Carajás) e Leste (Curionópolis). Segundo a mineradora Vale, em Serra Leste há também pequena quantidade de itabirito, cujo teor de ferro oscila entre 35% e 60%. Na barragem de rejeitos do Gelado (Parauapebas), o teor é de cerca de 63%.
A demanda do mercado internacional cada vez crescente por minério de teor inferior ao produzido nas minas do complexo de Carajás não é necessariamente uma preocupação, por enquanto, para os municípios produtores do Pará. Mas se o mercado se reorientar nesse nicho, a Vale, principal motor econômico de Parauapebas, terá de fazer ajustes.
E foi o que ela deixou claro em seu Relatório de Produção e Vendas do 1º trimestre de 2025, ao destacar que, “dadas as condições atuais de mercado”, a empresa “tem priorizado ofertar produtos de teor médio”, como os blendados, “visando maximizar a geração de valor” de seu portfólio.
Produção desaba 14%
Diminuir o ritmo de produção de minério de alto teor para priorizar o de médio teor já está em curso na prática. Não exatamente por essa razão, mas a produção nas minas de Parauapebas tem enfrentado seu inferno astral, e será assim até as reservas se esgotarem.
Nos primeiros três meses deste ano, a Vale extraiu da Serra Norte 15,62 milhões de toneladas de minério de ferro, 14,3% abaixo das 18,22 milhões de toneladas do mesmo período do ano passado, que havia sido muito ruim. Em 2021, no primeiro trimestre, só para comparar, a Vale extraiu de Parauapebas 25,3 milhões de toneladas de minério de ferro.
Esse recuo estratégico privilegia Canaã dos Carajás, onde a produção nos primeiros três meses deu salto de 9,3%, passando de 17,71 milhões de toneladas em 2024 para 19,37 milhões de toneladas em 2025, resultado que levou o município vizinho a superar pela primeira vez Parauapebas numa comparação de base trimestral. A partir de agora, Canaã dos Carajás é líder nacional de minério de ferro e, enquanto sua produção cresce, a de Parauapebas precisará diminuir, já que na Capital do Minério o custo para produzir uma tonelada é infinitamente maior que na Terra Prometida.
Queda na Cfem de 25%
Os reflexos da diminuição da produção são vistos atualmente no caixa da Prefeitura de Parauapebas, em forma de queda nas principais receitas relacionadas à atividade mineradora, sobretudo da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem), que em maio, mês de aniversário do município, virá na faixa de R$ 36 milhões, queda de 25% em relação a maio de 2024. É um verdadeiro presente de grego.
Nos próximos anos, sem sequer precisar de (mais) intervenção do Governo do Pará, a cota-parte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de Parauapebas vai cair de maneira drástica. Isso porque a queda na produção física deste ano de 2025 é fato gerador para a receita de ICMS que será recebida pela prefeitura local em 2027. E se a produção física está despencando, a movimentação de mercadorias e serviços que a sustenta também será derrubada.
Além disso, o Imposto Sobre Serviços (ISS), tributo de competência municipal que é favorecido pela atuação da Vale e de suas prestadoras de serviços na região, também sentirá os efeitos do que está sendo “plantado” hoje.
Arrocho financeiro
Os próximos meses vão ser duros para as finanças de Parauapebas, e, a menos que surjam recursos extraordinários — como pagamento de dívidas de royalties questionados na justiça —, a prefeitura, maior empregadora local e maior vetor financeiro, poderá enfrentar sérias dificuldades para honrar compromissos com fornecedores, prestadores de serviços e funcionalismo. Alguém terá de ser sacrificado e ficar sem receber nesse cenário de perda de receitas, arrocho fiscal e desaceleração da atividade econômica.
O comércio de Parauapebas já está sentido na pele os efeitos da crise financeira e olha com desconfiança anúncios futurísticos de uma suposta “maior fábrica de cimento sustentável do mundo”, tomando como exemplo as anedotas contadas em Marabá sobre a siderúrgica Aços Laminados do Pará (Alpa), que seria a “maior siderúrgica de bobinas a quente do mundo”, mas que nunca saiu do papel.
Nos comércios, consumidores — muitos deles servidores públicos — sumiram devido a medidas antipáticas e impopulares da administração municipal, e donos de negócios veem o endividamento bater à porta. Como efeito, há risco de demissão nos próximos meses nos setores de comércio e serviços.
Nas ruas, cada vez mais imóveis recebem placa de “vende-se” e “aluga-se”, remontando os anos da crise do minério, vivenciada com muita intensidade em 2015 e 2016, quando Parauapebas assistiu à primeira diáspora de cidadãos indo embora para Canaã dos Carajás ou fazendo a migração de retorno à terra natal.
Como tudo em Parauapebas gira em torno do minério de ferro e, especialmente, da Vale, que o extrai, qualquer movimento da empresa fora do trivial afeta Parauapebas. E como, em quase quatro décadas de existência, o município não conseguiu dissociar seu futuro do minério e da mineradora, vai ter de aprender a esta altura do campeonato a suportar o processo. É a máxima do “atura ou surta”.
1 comentário em “Mudanças no mercado do minério de ferro podem afetar ainda mais Parauapebas”
Parauapebas completa 37 anos e o cenário é desolador. É o resultado de anos de gestão míope, que preferiu viver do minério em vez de planejar o futuro. Agora, com o colapso batendo à porta. É hora de adotar uma postura séria, cortar na carne e agir com responsabilidade nos gastos públicos, priorizando o que realmente importa para reverter essa crise.