Brasília – Em um breve pronunciamento de despedida no final da tarde desta sexta-feira (15), com exatos sete minutos de duração, o agora ex-ministro da Saúde Nelson Teich evitou criticar o presidente Jair Bolsonaro após o seu pedido pela manhã.
Teich não explicou o motivo de sua saída do cargo e, sem mencionar a pressão do presidente para alterar o protocolo para o uso de cloroquina contra a Covid-19, disse apenas que foi uma decisão pessoal. “A vida é feita de escolhas e eu hoje escolhi sair”, afirmou Teich, que ficou menos de um mês no cargo. “Dei o melhor de mim nesse período.”
Lacônico, o ex-ministro disse que as políticas públicas de saúde são uma missão tripartite, que envolve a União, estados e municípios. “Isso é muito importante deixar claro”, explicou, reforçando em seguida que a divisão de tarefas entre as três esferas administrativas é “essencial para conduzir a saúde no país”.
A declaração vai em sentido contrário à “guerra” travada pelo presidente contra estados e municípios em relação às medidas para combater a pandemia de Covid-19. Bolsonaro é contra o distanciamento social, defendido por governadores e prefeitos em todo o país, e prega a reabertura imediata de comércios e serviços não essenciais.
Teich agradeceu a Bolsonaro por fazer parte do Ministério da Saúde e pela oportunidade de ter o Sistema Único de Saúde (SUS) em seu currículo. “Não aceitei o convite [para o ministério] pelo cargo. Aceitei porque achava que podia ajudar o Brasil e as pessoas”, garantiu.
“Agradeço ao presidente Jair Bolsonaro a oportunidade que me deu de ter feito parte do Ministério da Saúde. Isso é uma coisa muito importante para mim. Seria muito ruim para minha carreira não ter tido a oportunidade de atuar no ministério pelo SUS. Eu nasci graças ao serviço público, estudei em escola pública, minha faculdade foi pública, minha residência foi em hospitais federais”, disse, resumindo sua trajetória profissional.
Teich agradeceu também à sua equipe e disse que os integrantes do Ministério da Saúde sempre atuaram ao seu lado. O ex-ministro disse ter deixado o governo com um plano de ação “pronto” para enfrentar a pandemia de Covid-19. “Existe plano pronto para auxiliar secretários, prefeitos e governadores a tentar entender o que está acontecendo e definir próximos passos. Aqui a gente entrega quais são os pontos que tem que ser avaliados, quais são os itens que são críticos e auxilia no entendimento do momento e da tomada de decisão”, esclareceu. Entre as medidas que afirmou ter deixado para seu sucessor está um programa de testagem “que está pronto para ser implementado”, segundo o ex-ministro.
Cloroquina
O ministro demissionário não disse uma palavra sobre a utilização da combinação de um coquetel de medicamentos sendo prescrito por um grupo de médicos espalhados por todo país, que já salvaram milhares de vidas – dentre eles, as polêmicas cloroquina e azitromicina, que Teich garante não possuírem efeito com comprovação científica de cura.
Sua opinião foi categoricamente contestada por um dos médicos que compõem uma corrente nacional, que vem utilizando uma combinação de drogas já avalizadas pelas grandes publicações médicas do mundo, associado ao protocolo da Fiocruz.
“Comecei a ministrar o coquetel agora, cada caso é um caso e já tenho 73 pacientes totalmente curados e sem qualquer sequela em vários estados do Brasil”, declarou Faure Lopes, médico cirurgião, que suspendeu por dois meses a sua pesada agenda de operações nas cidades do sul do Pará para fazer um estudo de dois meses, adentrando nos segredos do comportamento do vírus.
“O governo tem que entender que já temos uma estatística consolidada em mãos. Se o coquetel for associado a alguns outros medicamentos já plenamente aprovados pela Organização Mundial de Saúde, e dependendo de cada caso de paciente, o que estamos fazendo é provar que, em média, após cinco dias estamos conseguir resultados animadores e a cura dos pacientes. A agressividade da Covid-19 enfraquece após 24 horas da primeira dosagem, e quanto mais cedo o paciente for medicado, mais rápido ele é curado”, explicou Faure Lopes.
Essa corrente médica pretende apresentar um documento, muito bem fundamentado com o passo-a-passo do protocolo adotado, detalhando todo o ciclo da doença, em três fases: baixo, médio e alto risco, de acordo com os sintomas de cada indivíduo. “Aqui não estamos falando de casos que já evoluíram para o nível de alto risco da doença, e sim aqueles contaminados que apresentam todos os sintomas”, detalhou.
“Na minha avaliação, o governo tem que disponibilizar imediatamente os remédios e controlar via SUS como eles serão administrados ao povo brasileiro, especialmente aos nortistas e nordestinos”, comentou Lopes.
Sem tiroteio
O ex-ministro não saiu atirando, afirmou que “não é simples” estar à frente do ministério em um período “tão difícil”. “É uma luta intensa para que a gente consiga apoiar estados e municípios a passar por isso”, disse. Teich não fez qualquer referência às dificuldades na relação com o presidente.
Ontem (14), Bolsonaro declarou que iria “exigir” de Teich que o ministério alterasse o seu protocolo para recomendar o uso da cloroquina para doentes em estágio inicial da Covid-19. O ex-ministro, no entanto, tem dito que não recomenda o uso do medicamento porque a eficácia no combate à doença não tem comprovação científica.
Nesta semana, o ministro disse ter sido surpreendido com a decisão de Bolsonaro de liberar o funcionamento de academias, salões de beleza e barbeiros sem consultá-lo.
Teich relatou que, com sua saída do cargo, interrompe o trabalho que vinha fazendo em campo, com visitas aos sistemas hospitalares de cada região. “A gente iniciou as visitas nas cidades mais atingidas e isso foi fundamental. Porque é fundamental você estar na ponta, ver o que acontece no dia a dia, entender melhor o que acontece na ponta. Esse entendimento foi fundamental para o desenho de ações que foram implementadas em seguida”, disse Teich, em sua despedida do comando do órgão.
Finalizando, o ex-ministro fez um agradecimento especial: “Aqui eu agradeço aos profissionais de saúde mais uma vez. Quando você vai na ponta e vê o que é o dia a dia dessas pessoas, você se impressiona. A dedicação dessas pessoas o tempo todo correndo riscos”.
Por Val-André Mutran – em Brasília