No Pará, só Canaã e Parauapebas têm mais trabalhadores que dependentes do Bolsa Família

Número de beneficiários do programa vence total de trabalhadores em 74% das cidades brasileiras e percentual chega a 99% no Pará. Blog do Zé Dudu traçou raio-x inédito da disparidade entre empregos formais e dependência de Bolsa Família e encontrou abismo social aprofundado pela linha da pobreza

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Um levantamento inédito realizado pelo Blog do Zé Dudu nesta sexta-feira (11) mostra o descompasso entre os empregos formais fomentados e a população carente dependente de benefícios sociais nas cidades brasileiras. E o cenário é de extremos vexatórios: dos 144 municípios do Pará, só dois têm hoje mais cidadãos trabalhando que habitantes sobrevivendo de Bolsa Família; e dos 20 municípios do Brasil que mais dependem do Bolsa Família, sete são paraenses.

Para chegar ao resultado, o Blog do Zé Dudu compilou e cruzou os dados mais recentes de fontes oficiais. Para os números populacionais, a base foi a Estimativa da População 2024 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), enquanto as bases administrativas do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho, orientaram o cálculo dos empregos formais até agosto deste ano. Por fim, dados do Cadastro Único, do Ministério do Desenvolvimento, recortados para os beneficiários de Bolsa Família existentes até setembro, também foram utilizados.

Os indicadores revelam que Canaã dos Carajás é o município com a melhor situação do Pará, com 5.256 trabalhadores a mais que dependentes de Bolsa Família. Com um exército de 31.458 vínculos formais ativos na força de trabalho, a Terra Prometida é, hoje, a localidade paraense com a maior proporção de trabalhadores em relação à população: 36,31%. Já a população canaense dependente de Bolsa Família corresponde a 30,25%.

Depois de Canaã, Parauapebas é o município socialmente mais próspero do Pará, com 1.566 empregos formais a mais que benefícios de Bolsa Família distribuídos. Na Capital do Minério, há no momento 69.776 vínculos empregatícios vigentes em contraponto a 68.210 dependentes de Bolsa Família. A diferença é apertada, mas a geração de trabalho venceu, e 23,35% da população está ativa e bem remunerada no mercado. Estatisticas-do-Bolsa-Familia-2024-1

Belém tem ‘dois’ Castanhal de Bolsa Família

Na outra ponta, os municípios de Santarém e Belém possuem verdadeiros bolsões de pobreza, com mais de uma centena de milhares de dependentes de Bolsa Família. Em Santarém, a diferença entre a quantidade de trabalhadores e beneficiários daquele programa social é de 116.688 indivíduos, algo alarmante e a 4ª maior quantidade do Brasil.

Hoje, a Pérola do Tapajós possui 40.400 trabalhadores formais ante um batalhão de 157.088 beneficiários do Bolsa Família. De cada 100 santarenos, 44 recebem Bolsa Família, ao passo que apenas 11 estão ativos na força de trabalho. São números cruelmente discrepantes: há três vezes mais santarenos dependentes de benefícios sociais do que com emprego certo.

Mesmo Belém, que é o município economicamente mais rico do Brasil, há 104.602 dependentes de Bolsa Família a mais que trabalhadores. Em números exatos, são 400 mil “bolsistas”, o equivalente a duas cidades do tamanho de Castanhal lotadas de pessoas de baixa renda e que têm no Bolsa Família a única esperança. Em compensação, há apenas 296 mil trabalhadores formais, o equivalente a uma cidade do porte de Parauapebas.

74% das cidades ‘sobrevivem’ de benefícios

O Blog do Zé Dudu levantou que, dos 5.570 municípios brasileiros, apenas 1.451 (26%) têm mais trabalhadores formais que beneficiários do Bolsa Família, a maioria deles situada no Centro-Sul do Brasil, notadamente em estados ricos e desenvolvidos, como São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná e Espírito Santo.

Há também coincidências: dois municípios têm os mesmos volumes de trabalhadores e “bolsistas”. É o caso do paranaense Ângulo e do catarinense São Bernardino. Em ângulo, há 412 empregados formais e mesmo número de beneficiários de Bolsa Família. Já em São Bernardino há 291 trabalhadores e igual quantidade de dependentes do programa social.

A cidade de São Paulo se destaca com a maior diferença favorável para trabalhadores: há 3.210.256 pessoas empregadas a mais que dependentes de Bolsa Família. Por outro lado, Manaus vive o inverso: 231.784 beneficiários de Bolsa Família a mais que trabalhadores.

Duas cidades têm mais trabalhadores que gente

Em termos proporcionais, os municípios paulistas de Borá e Barueri são imbatíveis. Em Borá, há mais trabalhadores (1.374) que moradores (928), mas é Barueri quem mais chama atenção. Lá, tem mais trabalhadores empregados (366.975) que a própria população (330.339), e a razão é simples: há tanto emprego que o município absorve gente de fora porque apenas a população local não dá conta. Com isso, a taxa de população empregada é de 148,06% em Borá e de 111,09% em Barueri.

No extremo, está Serrano do Maranhão, no estado de mesmo nome, onde há, inclusive, mais pessoas cadastradas e recebendo Bolsa Família que a própria população municipal. O município possui 10.651 beneficiários do Bolsa Família, mas apenas 10.461 habitantes. Há, assim, 1,82% a mais de dependentes do programa em relação à população total, caso único no Brasil.

No Pará, as maiores proporções de população dependente de Bolsa Família estão em Anajás, onde 85,15% dos 30.003 habitantes vivem disso; Mocajuba, onde 85,11% dos 28.821 residentes também sobrevivem do programa; e São João da Ponta, cuja taxa de 84,43% entre os 4.509 habitantes revela a falta de oportunidades e a desigualdade social no município, drama não exclusivo de lá, mas que afeta milhões de brasileiros, inclusive — e sobretudo — os paraenses.