Hoje pretendo tratar do exagero de leis.
Nosso Brasil, em ritmo de Estado Democrático de Direito, possui mais de 1.000.000 de leis vigentes. Se é verdade que o ser humano deve ser controlado para que a vida em sociedade seja saudável (em todos os sentidos), não menos verdade é que esse controle deva ser sério, viável, eficaz, mas, em especial, necessário e legal. Em um contexto do montante de leis hoje existente, por evidente que algumas necessidades devem ser repensadas.
Chega-se então a uma dúvida: como controlar a necessidade e legalidade do controle que nos deve controlar (perdoem pela cacofonia)? A quem cabe essa tarefa ímpar? Afinal, fazer as leis é tarefa do Poder Legislativo. Efetivar o seu cumprimento, do Poder Executivo. Resta aquele Poder que tem a incumbência de, não somente definir a legalidade da lei, mas também, em sua capacidade jurisdicional mais próxima do cidadão, servir de amparo ao doente jurídico.
O Poder Judiciário, hoje também sofrendo de uma doença social – sofre com a quantidade de demandas que lhe são trazidas – tem o dever de zelar pela manutenção da democracia. E essa instituição somente será mantida com o consagramento diário da Constituição Cidadã (como pretendeu Ulisses Guimarães, ainda em 1988). Nesse andar, coube ao Supremo Tribunal Federal, guardião da Carta, decretar a inconstitucionalidade de 650 leis aprovadas pelo Poder Legislativo e sancionadas pelo Poder Executivo na última década (Revista Veja, 02/3/2011). O fez, por evidente, ao saborear seu dever, na medida em que lhe postas as demandas.
Nas últimas semanas muito se leu, ouviu e viu a reconhecimento da inconstitucionalidade da aplicação imediata da apelidada “Lei da Ficha Limpa”. A sociedade civil dividiu-se entre os que entendiam pela necessidade de sangramento da Constituição em prol do bem-estar político e ético e, de outra banda, pela garantia da ordem constitucional. O Supremo Tribunal Federal, por maioria mínima (6×5) optou pelo atendimento a segunda hipótese. E, mais uma vez, o fez bem.
Não cabe ao Poder Judiciário subverter a ordem jurídica, mas garanti-la. Cabe a nós, seus jurisdicionados, repensarmos alguns conceitos e atos. Ao invés de atacar o ministro Luiz Fux pelo seu voto de desempate (e foi um entre seis), devemos pensar que Jader Barbalho foi eleito senador da República com mais de 1.800.000 votos, mesmo ao vento das acusações e ameaças de não ser diplomado. Devemos procurar entender por que Tiririca recebeu a confiança de mais de 1.300.000 eleitores ou ainda como Jair Bolsonaro, com sua história de turbulências, consegue manter-se deputado federal, mesmo após ofender grotescamente os homossexuais e os negros.
A responsabilidade é nossa, é do eleitor. Nós elegemos representantes por vezes incompetentes para fazer leis. Aliás, Tiririca integra a Comissão da Educação da Câmara Federal, muito embora tivesse que ser submetido a exame de sua capacidade de alfabetização. Bolsonaro, por sua vez, integra a Comissão de Direitos Humanos da mesma Câmara… Essas obras são também de responsabilidade daqueles que elegemos. Digamos que, no mínimo, nosso Congresso tem algumas excentricidades, cuja participação nossa foi fundamental.
Enfim, e retornando ao Poder Judiciário. Tem ele nos auxiliado a ajustar os efeitos das nossas escolhas. Nossa eventual incapacidade de escolha sendo ajustada pela sua atuação. No âmbito de Supremo Tribunal Federal, para fins do controle de uma constitucionalidade por vezes irritantemente descontrolada. No âmbito de Justiça Estadual, como forma de atender aos anseios de uma sociedade que cresce e evolui ao passo que a legislação não a acompanha.
Entretanto, esse crescimento de anseios e direitos tem acarretado em uma avalanche de litigância desmedida. Se é também garantia Constitucional a busca pelo direito de cada um, poderíamos pensar na solução consensada, conversada, ajustada. Formas alternativas de solução de conflitos, como a mediação e a conciliação prévias, têm espaço cada vez maior em razão do atendimento a duas premissas básicas: rapidez e paz.
Uma solução rápida evita o prolongamento das dores de cada um; quanto menos dor cada um sentir, mais perto da paz eles chegam. E, nesse andar, a redução da quantidade de demandas fará com que a doença do Poder Judiciário vá sendo gradativamente medicada até uma cura definitiva.
Por Theobaldo Spengler Neto / Professor Universitário
9 comentários em “O exagero de leis no Brasil”
O trânsito, como as demais questões referentes a cidadania,é matéria fundamental para que possamos construir uma parauapebas melhor para nossos filhos.
Os senhores Claudio Feitosa e Bruno Monteiro deram a discussão do tema contribuição valiosa, discussão essa que deveria sensibilizar os poderes constituidos,e, através deste, se espraiar por toda a sociedade.
Parabéns.
Caro Cláudio,
É certo que estamos sim do mesmo lado da “briga”. Concordo integralmente com você.
Também agradeço a oportunidade de debater a questão, e tenho uma boa inveja da sua “fracoesperancionite”. Perdi ela a algum tempo…
Fraterno abraço,
Bruno Monteiro.
Caro Bruno,
Renovo meus parabéns aos teus comentários. Concordo com a essência das tuas reflexões.
Não tenho muito a acrescentar, todavia faço uma última ponderação: se vamos apostar todas as fichas nas crianças, será preciso, obrigatoriamente – ainda que apenas algumas poucas fichas -, apostar naqueles que vão ajudar a educar essas crianças, pois não? Daí que não podemos jogar a toalha em relação aos marmanjos iníquos – eles podem ainda ter jeito (confesso ter surtos de “fracoesperancionite”, mas são pequenos surtos, quase imperceptíveis rsrsrs!).
É nesse aspecto que me parece ser necessário relativizar a questão da educação, buscando conceituá-la “lato sensu”, e os bons exemplos, que entram nessa história como elemento de educação, podem estar em todos os lugares, inclusive naqueles em que os maus exemplos parecem vicejar serelepes e fagueiros: o Estado brasileiro em todas as suas versões – municipal, estadual, federal e intergaláctico!
Em outras palavras: existem duas formas de ver o Estado. A primeira e mais antiga – vem do absolutismo, com aquela história do “Eu sou o Estado”. Nessa lógica prevalece a ideia do Estado como um ente externo, independente e superior a nós, pobres mortais. A segunda forma vem de um conceito mais moderno, que atende pelo nome de Estado Ampliado. Nesta lógica, nós também somos o Estado, e a nossa luta diária, cotidiana, faz parte de um processo por uma nova hegemonia, uma nova maioria. Eu gosto mais do segundo conceito, e penso que o teu raciocínio se encaixa também nesta vertente ideológica. Portanto, estamos, suponho, do mesmo lado dessa briga por uma sociedade mais decente, digamos assim.
Agradeço a oportunidade em participar de um debate tão qualificado e instigante,
Atenciosamente,
Cláudio Feitosa
Caro Cláudio Feitosa,
Muito bom vê-lo por aqui.
Como homem de espírito democrático e republicano, não melindro ao ser contraditado, ainda mais quando por meio de objeção de tanta qualidade e elegância como a sua.
Concordo que o Estado tem de dar o exemplo aos cidadãos como forma de se estimular e multiplicar boas práticas de convivência humana. Sei também que o ser humano é sugestionável e pode mudar seu comportamento para melhor quando se vê isolado em suas iniquidades. No entanto, voltando os olhares para o nosso microcosmo, para a realidade de nosso município, vejo os maus exemplos se multiplicarem e as vilezas dando as mãos.
Não vejo sequer o bom exemplo do Estado, consubstanciado nas ações da municipalidade ou do Governo do Estado. O que percebo é a tolerância com os maus motoristas, funcionários de órgãos públicos (estaduais e municipais) dando maus exemplos no trânsito, inércia das autoridades diante das injustiças que se vêem à luz do dia em nossa cidade etc. Ja vi, inclusive, carros do DMTT, praticando “barberagens” no trânsito de Parauapebas.
Outro dia fui fechado por caminhão do DMTT, fui atrás dele, abri o vidro e disse a ele que deveria dar o exemplo. Ficou calado, anotando a placa de meu carro. No momento, estou esperando a – injusta – multa…
É por essas e outras que tenho fé é nas crianças, elas sim serão capazes de instaurar uma nova sociedade. Prefiro apostar minhas fichas em quem está ainda em formação moral e psicológica. Depois de adultas, as pessoas não são tão receptivas às mudanças e novas proposições quanto elas.
Façamos a nossa parte educando nossas crianças e dando bons exemplos aos demais, mesmo que nos sintamos solitários como o “exércíto de um homem só.”
Quanto às práticas patrimonialistas que vemos em nossa sociedade, não será a diminuição da quantidade de leis que garantirá uma maior participação popular no processo político ou administrativo.
Se é ruim com elas, bem pior será sem a garantia e segurança delas. O grande volume de leis não é causa de nada, é apenas reflexo, consequência de nossa formação histórica tendente à burocratização e ao paternalismo, como bem sinaliza você.
Agradeço sua excelente intervenção e estou no aguardo da tréplica.
Fraterno abraço,
Bruno Monteiro.
Bruno,
Parabéns pelo belo comentário. Entretanto, permita-me uma ponderação.
Proponho um pequeno exercício de abstração a partir da sua “crônica sobre a cidade” – o relato da viagem que fazes, diariamente, da casa ao trabalho, e as suas “entrelinhas”. Imaginemos que estes mesmos motoristas fossem, todos ao mesmo tempo, transferidos para o trânsito de Brasília, por exemplo. A capital do País, todos sabem, é a cidade onde mais se respeita a faixa de pedestre. Como se comportariam nossos motoristas em Brasília? Da mesma forma que por aqui ou rapidamente se adaptariam as normas do lugar? Em minha opinião, seríamos positivamente surpreendidos com uma mudança repentina de hábitos. Digo isso porque, no seu argumento, penso ser necessário colocar explicitamente a função do “exemplo” no processo de educação. E aí, meu caro, acho que se encaixa a função do Estado, como regulador, disciplinador e evocador dos “exemplos”.
Não acredito que o homem seja bom ou ruim por natureza. Além das condições naturais de reprodução, a espécie humana aprendeu a viver com regras para garantir sua perenização.
Gosto de citar o filme Gangues de Nova Iorque, como exemplo desse processo. Quem viu o filme vai se lembrar da incivilidade marcante dos primeiros anos de formação da maior metrópole mundial. Guardando as devidas proporções – e que proporções! -, acho que Parauapebas vive um momento “Gangues de Nova Iorque”.
Não acho que chegaremos a ser uma Nova Iorque – nem a de lá nem a daqui – mas podemos nos tornar uma cidade com ótima qualidade de vida. Para tanto, julgo ser imperativo que o Estado se faça presente e garanta o bom exemplo.
Também concordo contigo quando argumentas que não é a quantidade de leis que impedem esse processo de civilização. Entretanto, esta “inflação jurídica” espelha um processo de formação cartorial e patrimonialista do nosso Estado. Uma herança resultante de um aspecto nefasto da nossa formação histórica, que se consagrou por ser uma sociedade definida somente pelos arranjos das elites – as elites “fizeram” a independência, a abolição da escravatura, a República, o Estado Novo, O golpe militar e a Nova República. E com isso criaram o Estado Paternalista, que tudo precisa fazer: da CLT ao Bolsa Família.
Fico por aqui, esperando a continuação do debate,
Atenciosamente,
Cláudio Feitosa
Trabalho no Judiciário e posso garantir: não são as leis que estão em demasia, mas sim a educação que está rarefeita.
Deixando de lado a polêmica em torno do que inflama os leitores (Jader Barbalho e a “Lei da Ficha Limpa”), darei minha opinião focado na existência ou não de real prejudicialidade no fato de existir grande número de leis em vigor em nosso país.
Alguém já disse que se as pessoas agissem de forma ética e moral, não precisariam nem de leis, nem de Judiciário. A configuração de Estado que temos hoje (o tal Estado Democrático de Direito), é resultado de séculos de labuta da raça humana, forjada muitas vezes na bigorna das guerras. As leis representam o que temos de mais avançado e precioso nas relações humanas. Sem elas, infelizmente tratamos as coisas com personalismos, de forma apaixonada e, inevitável e consequentemente, de maneira injusta. A lei, em nosso regime democrático, apesar de toda crítica que se possa fazer ao sistema representativo, pelos seus resultados práticos, é sim a vontade do povo na casa onde as leis são elaboradas. Se elas são boas ou ruins é uma outra história e, mesmo admitindo-se que hajam leis ruins, isso não deve nos preocupar sobremaneira, já que ela (a lei), apesar de ser a principal fonte do Direiro, não é a única, e os magistrados devem ser corajosos para decidirem contra ela, quando visivelmente ofenderem o bom senso e o que se entende por justiça.
Mas o que eu quero mesmo fazer não é teorizar se tema tão chato. Iniciei este comentário afirmando que não sobram leis e que falta educação.
Pois bem.
Vou relatar como vejo as coisas aqui nosso microcosmo para termos uma pequena dimensão de como a educação faz falta em nossa sociedade e como isso impacta sobremaneira nosso judiciário.
Saio de casa de segunda à sexta-feira, às 7:40h, em direção ao meu trabalho. Moro no bairro Rio Verde e vou carro. Saindo de casa, ao dobrar a esquina de minha rua, invariavelmente me deparo com carros vindos na contramão; dobrando a próxima esquina, deparo-me com vanzeiros alucinados que fazem do trânsito em Parauapebas um cavalo de batalha; exatamente na próxima esquina (Rio de Janeiro com JK), o semáforo quase sempre não está funcionando fazendo com que séculos de civilização humana caiam por terra, já que instaura-se a completa barbárie entre os homens; os veículos maiores – que segundo nosso Código Nacional de Tránsito, um dos mais avançados do mundo, devem sempre “cuidar” dos veículos menores – subvertem a ordem e desrespeitam os veículos menores, na seguinte ordem: os ônibus agridem as vãs, as vãs agridem os carros de passeio, os carros de passeio agridem os motoqueiro e estes, por sua vez, agridem e desrespeitam os ciclitas, pedestres e todos os anteriores também.
Mais adiante, passo em frente aos bancos – que sequer abiram sua portas – e vejo a população sendo humilhada pelas instituições bancárias, públicas e privadas, com as autoridades de braços cruzados…
Helena P. Blavastski, em sua obra intitulada “A Chave da Teosofia”, ao discorrer sobre o que chama de “a voz do silêncio”, nos afirma que há em nós uma consciência nata, que nos silaniza quando estamos indo em direção contrária ao que é bom e justo, e precisamos estimular essa tal consciência com formação de qualidade. Se as pessoas forem corretamente educadas em casa e na escola, não precisarão de leis para lhes dizer o que é correto ou incorreto, justo ou injusto. A tal voz lhe dirá em alto e bom som que não é justo sair com seu carro como quem sai para uma guerra; que não é educado obrigar as outras pessoas a ouvirem suas músicas em volume alto; que se deve parar nas faixas de pedestre e dar passagem às pessoas; que quando você estiver com raiva, saberá que tem todo o direito de estar com raiva, mas que isso não lhe dá o direito de ser cruel com ninguém (Willian Shakespeare); que como empresário ou autoridade pública, se tem obrigações e responsabilidades sociais, e que as pessoas merecem respeito e devem ser tratadas com dignidade.
Se as pessoas passarem a agir melhor para com seus semelhantes, certamente não haveriam tandas ações em curso em nosso já estrangulado Judiciário.
Enfim, não há nada de errado com o número de leis, o que precisamos é de mais educação, e falo de educação de qualidade, em casa e na escola.
Perdoem o pessimismo, mas esqueçam os que aí estão, eles não tem mais jeito…
Cuidemos das nossas crianças, elas sim representam a nossa esperança de uma sociedade mas justa. Se você educar bem o(s)seu(s) filho(s) já estará fazendo muita diferença.
Cordialmente,
Bruno Monteiro.
“Dura lex sed lex – A lei é dura, mas é a lei”! Sabemos que quantidade não é qualidade e quando se trata de lei no Brasil isso fica muito mais evidente. Temos uma grande Constituição, mas cumprí-la que é bom nada de “petibiriba”. As leis precisam existir, agora muito mais do que isso é preciso criar meios concretos para que estas leis saiam do papel e que sejam praticadas de forma igualitária.
ABÇ
Fico muito feliz q o nobre professor pemaneça como professo; de matemática espero. Imaginar q Jader foi injustiçado e q agora tem seus direitos reconhecidos é simplesmente pueril para um professor. Votos conquistados a qualquer preço e em curral eleitoral não deveriam valer. Por isso a lei !!!!
Todos somos sabedores q os votos dedicados ao Tiririca foram de protesto e que, pelo menos ele é um palhaço declardo . . . Quanto ao deputado Carioca; acredito q ele representa muito bem os desejos de chefes de familia em todo o País. Imagine seu filho indo estudar e ter acesso ao kit guey !!! Seria simplesmente o fim. A base familiar deve ser respeitada, temos q ter filhos com Pai e Mãe e não com dois pais ou duas maes.
Thanks, it’s usefully