Levantamentos superficiais que precisam ser confirmados com perfurações sofisticadas, estão à espera da solução de uma luta, que embora titânica, segue ocorrendo silenciosamente nos bastidores do poder, a partir de Brasília. Envolve a gigante Petrobras S.A. (Petrobras), o Ministério das Minas e Energia (MME) e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais), o poderoso órgão regulador ambiental do governo federal. Aflitos e atônitos, seis estados da região mais pobre do Brasil: Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte, aguardam o desenrolar dos fatos.
São nesses seis estados, cujos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) têm como competidores diretos países africanos paupérrimos e sem recursos naturais, que o governo proibiu sondagens exploratórias de pesquisa para quantificar o que já é chamado de Novo Pré-Sal, por especialistas da área de energia, petróleo e gás natural, na faixa marítima que se estende do litoral do Amapá ao Rio Grande do Norte, e inclui cinco bacias sedimentares (Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar). Tal exploração já é uma realidade nos países vizinho da Guiana e do Suriname, que estão mudando da água para o vinhos as suas economias.
A recente decisão do Ibama que negou a licença sustentado em parecer técnico para a atividade de perfuração de um poço pioneiro pela Petrobras na Foz do Amazonas, na Margem Equatorial brasileira trouxe ao centro das discussões a transição energética necessária para garantir que o Planeta não superaqueça. A decisão é urgente, uma vez que muito antes do que era previsto há poucos anos está ocorrendo agora: eventos climáticos cataclísmicos, morte, destruição e prejuízos trilionários somando-se os eventos recentes ao redor do mundo.
Atualmente, existem 41 blocos exploratórios sob concessão na região, todos fruto da 11ª Rodada da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), ocorrida em 2013. A então diretora-geral da ANP na época da concessão, Magda Chambriard, afirmou em audiência pública no dia 14 de junho na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, que a rodada foi pensada para descentralizar a atividade petrolífera no Brasil, concentrada no Sudeste.
Desde então, no entanto, a produção na margem equatorial tem sido marginal, motivada por fatores como dificuldades para a obtenção das licenças ambientais e centralização de investimentos petrolíferos na camada pré-sal, na bacia de Santos.
A gerente-geral de licenciamento ambiental da Petrobras, Daniele Lomba, afirmou aos deputados que a companhia tem tecnologia de ponta capaz de minimizar eventuais riscos ambientais da atividade, como vazamentos de óleo. “A gente tem uma capacidade bem robusta. Pelos nossos modelos, no pior caso, de vazar 1.500 metros cúbicos/dia de óleo, a gente tem capacidade para recolher 8.900 metros cúbicos. Então a gente tem estrutura”, disse Lomba.
Ela também afirmou que a elaboração da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) não é de responsabilidade da Petrobras, e sim dos ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente. O documento avalia os riscos ambientais da presença de poluentes nos sedimentos e as consequências aos ecossistemas.
“Fontes de energia fósseis coexistirão com as renováveis”, atesta relatório apresentado pela Gerente Executiva de Segurança, Meio Ambiente e Saúde da Petróleo Brasileiro S.A (Petrobras), Daniela Lomba.
• Apesar de decrescente, a demanda global de petróleo projetada se mantém essencial em todos os cenários alinhados ao Acordo de Paris;
• Mesmo em cenários de transição energética acelerada, onde todos os compromissos assumidos pelos países visando a neutralidade de emissões são cumpridos (International Energy Agency – IEA, 2022), a demanda de petróleo modelada para o Brasil e região é crescente, passando por um pico em 2030, mas maior em 2050 do que em 2021;
• O petróleo brasileiro deverá substituir outros produzidos com mais emissão, frequentemente, retratado nos países desenvolvidos.
Durante a audiência pública, o secretário de Meio Ambiente do Pará, Mauro de Almeida, informou que os secretários dos estados da Amazônia Legal enviaram uma carta ao Ibama concordando com a exploração de petróleo e gás na Foz do Amazonas, pois dizem que os recursos podem ajudá-los a resolver questões econômicas e sociais da região.
Muitos debatedores pontuaram, no entanto, que é preciso equilibrar as necessidades de produção de petróleo com a transição energética, e a qualidade de vida das populações locais da Amazônia, citando os compromissos do país com a Convenção Quadro de Mudanças Climáticas, com o Acordo de Paris e com a Convenção sobre Biodiversidade, de preservação de recursos naturais.
Licenciamento
A ausência da AAAS foi um dos pontos levantados pelo Ibama para negar a licença ambiental à Petrobras em maio. Também presente ao debate, o coordenador-geral de Licenciamento Ambiental de Empreendimentos Marinhos e Costeiros do Ibama, Itagyba Alvarenga, afirmou que o órgão entende que a falta do documento impede uma melhor avaliação sobre o impacto da atividade exploratória na margem equatorial.
Ele disse ainda que o Ibama está aberto ao diálogo para resolver o impasse. “O Ibama tem sido um grande parceiro do setor energético do país. Boa parte do desenvolvimento do pré-sal se deve a eficiência do processo de licenciamento ambiental”, disse Alvarenga.
Disputa
O Brasil atuará com “mão firme” para cumprir etapas ambientais e avançar na exploração de petróleo e gás na margem equatorial brasileira, afirmou 5) o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Efrain Cruz, ressaltando que a pasta está empenhada apesar das negativas do Ibama.
Ao ler um discurso enviado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, Cruz frisou ainda que o país não pode prescindir da exploração na região, que engloba bacias sedimentares do Rio Grande do Norte ao Amapá, com grande potencial para descobertas, mas enormes desafios ambientais.
Ao iniciar sua fala, Cruz mencionou que o tema foi discutido em uma reunião com o presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Aloizio Mercadante.
“Estávamos falando da dificuldade e do enfrentamento que foi explorarmos o pré-sal brasileiro [no passado] e não é diferente do que estamos vivenciando hoje com a margem equatorial”, disse Cruz, durante cerimônia de assinatura dos contratos do 1º Ciclo da Oferta Permanente no Regime de Partilha de Produção de Petróleo no pré-sal, em Brasília.
“Pela coragem, pela resiliência e pela capacidade de articulação do presidente Lula à época, hoje estamos aqui assinando esses contratos de partilha.”
Na época em que o pré-sal foi descoberto, nos primeiros mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o país optou por adiar a concessão de novas áreas exploratórias enquanto um novo regime fiscal exploratório fosse desenvolvido.
No caso da margem equatorial, houve nos últimos anos debates intensos que envolvem os desafios ambientais da região, onde não há a realização de novos poços exploratórios desde 2015.
O Ibama negou, em maio deste ano, um pedido de licença ambiental da Petrobras para uma perfuração na bacia Foz do Amazonas, uma das áreas que integra a margem equatorial. A petroleira recorreu então da decisão.
Para o órgão ambiental, a autorização depende da realização de uma AAAS (Avaliação Ambiental de Área Sedimentar), estudo que ficaria a cargo do Ministério de Minas e Energia e do Ministério do Meio Ambiente, para análise mais ampla da região, a fim de avaliar se ela está apta a ser explorada.
No final de maio, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, afirmou que a região é pouco estudada e, por isso, os impactos ambientais não estão bem detalhados na documentação apresentada até o momento.
Cruz destacou ainda perspectivas do país de aumentar a produção nacional de petróleo, o que o ministério considera fundamental para que haja êxito durante o processo de transição energética no país.
Esses planos, no entanto, se chocam com a necessidade de frear o uso de combustíveis fósseis para combater as mudanças climáticas.
Segundo Agência Internacional de Energia, para zerar as emissões líquidas de carbono até 2050, é essencial que não sejam feitos investimentos em novos projetos de combustíveis fósseis. A meta é um dos passos para cumprir o Acordo de Paris e limitar o aquecimento global em 1,5°C.
ANP e avanços exploratórios
Também presente no evento, o diretor-geral da reguladora do setor de petróleo ANP, Rodolfo Saboia, defendeu a realização de novos leilões e também o avanço da exploração nas novas fronteiras exploratórias.
Segundo ele, a autarquia tem a expectativa de que seja possível anunciar uma nova rodada permanente de áreas para exploração e produção de petróleo e gás natural ainda neste ano.
O início do quarto ciclo de oferta permanente “depende apenas de manifestação de interesse por parte de empresas interessadas e nós temos a expectativa de isso possa ocorrer em breve”, afirmou.
“Para além disso, desejamos manter a produção crescente a partir de 2030. Precisaremos também buscar novas fronteiras exploratórias, essa é uma escolha estratégica que a sociedade precisa fazer e a ANP está pronta a fornecer todas as informações necessárias para que essa escolha seja consciente e bem informada”, afirmou.
Passados dez anos do primeiro leilão do pré-sal sob regime de partilha de produção, o Brasil falhou em confirmar novas grandes descobertas até agora, e a indústria do país urge por novos caminhos exploratórios que permitam manter a curva de produção em ascensão, antes que ela comece a declinar já a partir de próxima década.
Fala do ministro
Indagado sobre a discussão ‘”acalorada” sobre a exploração de petróleo na região da Foz do Amazonas, na Margem Equatorial, o ministro disse que não se trata de uma questão divergente da sustentabilidade. “Fizeram uma narrativa que não é verdadeira de uma exploração na Foz do Amazonas. Nós estamos tratando de um pedido de pesquisa da Petrobras a 500 quilômetros da Foz do Amazonas, a 188 quilômetros do Oiapoque”, disse, ressaltando que é preciso compreender que a Margem Equatorial não está apenas no Amapá. “Está no Ceará, no Piauí, no Rio Grande do Norte, no Maranhão, no Pará e Amapá.”
Declínio
Durante a audiência pública, os convidados também defenderam a ativação da nova fronteira. O diretor do Departamento de Política de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural do Ministério de Minas e Energia, Rafael Bastos, afirmou que estudos recentes do governo apontam que a produção de petróleo e gás no pré-sal, hoje responsável por quase 80% da produção nacional, vai declinar no médio prazo.
“Se não houver reposição de reservas, na década de 2030 poderemos ter o risco de perder a autossuficiência de petróleo e termos a necessidade de importar petróleo bruto”, afirmou. A mesma advertência foi feita pelo diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia. “Se não produzirmos petróleo, teremos que importá-lo”, disse.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.