Nas férias de reveillon na ilha de Fernando de Noronha, onde certamente dona Marisa Letícia deve ter passeado a exibir vistosa estrela vermelha no maiô branco, Lula saiu para caminhar sozinho, certa manhã. Parou ao ver, no meio das espumas da arrebentação, uma garrafa, que logo juntou. Observou longamente o vidro meio esfumaçado e, finalmente, tirou a rolha. Imediatamente tênue névoa cercou o presidente e um gênio surgiu diante dele.
-Como acaba de me libertar desta verdadeira penitenciária – disse a visão — onde eu me encontrava confinado há séculos, concedo-lhe o direito a três pedidos.
-O companheiro gênio está falando sério?
-Claro. Sei que estou diante de um presidente, todavia, por incrível que pareça, presidentes têm muitos desejos, às vezes até mais do que as pessoas comuns.
-Posso, então, começar, companheiro gênio?
-Estou a seu serviço, mestre.
-Queria, em primeiro lugar, que as suspeitas que ainda pairam sobre o companheiro Palocci, hoje brilhante deputado federal de quem continuo gostando muito, sumissem da cabeça de todo mundo, especialmente do Ministério Público, da Polícia e dos juízes, para que ele possa voltar, no terceiro mandato que não sai da cabeça e do coração da adorada petezada, a ser o meu ministro da Fazenda.
-Ora, isto é muito fácil, basta fazer assim – o gênio estalou os dedos para cair imediatamente aos pés de Lula a primeira página do “Correio Popular” anunciando: “Acusações a Palocci eram todas falsas, voltará ao Ministério. Caseiro que o acusou pegará trinta anos de cadeia”.
-Maravilha. Posso fazer o segundo pedido?
-Claro.
-Queria que o mesmo acontecesse com Zé Dirceu, Delúbio, Genoino, Gushiken, Waldomiro Diniz, Silvinho Land Rover, Lorenzetti, o homem da cueca, Marcos Valério, Duda Mendonça, Wladimir Poletto, George Mattoso, Freud Godoy, Ricardo Berzoini, Henrique Pizzolatto, pois preciso ter de volta os meus amigos ao Palácio.
Como da outra vez, caiu sobre a areia um novo número do “Correio” aberto na coluna do Ricardo Alécio, com o título no alto: “Lula tem sua turma de novo no Planalto”.
-Agora, vamos ao último pedido – murmurou o gênio.
-Como derradeiro desejo quero, a partir de agora, ser um presidente diferente. Preciso falar várias línguas para poder viajar por aí sem intérpretes, desejo escrever livros para não me chamarem mais de analfa. Desejo, também, ler e entender os documentos que colocam na minha mesa para assinar, quero ter de volta como amigo o Saramago, deixando de lado o Paulo Coelho que sempre pinta com fundo musical do Zezé de Camargo e Luciano.
Espero, também, me tornar íntimo do Bill Clinton e do ex-primeiro ministro Tony Blair. Quero ter jogo de cintura pra lidar com a corja do Congresso, quero apreciar bons pratos que não sejam “Buchada de Bode” ou “Jabá com Jerimum” e, por fim, ouvir boas sinfonias e esquecer de vez o Zeca Pagodinho.
-É pra já – disse o gênio – e novamente estalou os dedos.
Isso posto sumiu, enquanto Lula correu, feliz, para o hotel da Marinha onde estava hospedado. Só que, na entrada, viu sua imagem refletida num espelho, através do qual constatou, horrorizado, que havia sido transformado no Fernando Henrique Cardoso. Neste instante, acordou do pesadelo, a gritar pelo meio do quarto:
-Sifu, meu Deus, sifu!!!!!
E abrindo os braços:
-Palocci!!! Onde está o companheiro Palocci? Já mandaram o Mantega pra casa, já mandaram o Mantega pra casa?
Ao que, estremunhando entre os lençóis de linho egípcio, dona Marisa Letícia murmurou:
-Calma, meu companheiro marido, quem está aqui sou eu, a sua companheira Galega…
E ele:
-Graças a Deus, pensei que tinha tudo sifu…
Artigo de Antonio Contente