Brasília – Um grupo de congressistas estão protocolando nas Mesas Diretoras do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, requerimentos de pedido de informação ao Ministério da Saúde para confirmar a informação de que 6,86 milhões de testes RT-PCR para detectar a covid-19 comprados pela pasta vencem entre dezembro deste ano e janeiro de 2021. A comissão da Câmara que acompanha a resposta à pandemia irá realizar na próxima quarta audiência pública com técnicos da pasta e representantes de Estados e municípios sobre o caso. Há ainda movimento no Congresso para convocar o ministro Eduardo Pazuello a dar explicações sobre o caso.
O governo tenta prorrogar o prazo de vencimento dos produtos para evitar que sejam descartados. Somente a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) pode autorizar uma renovação da validade dos exames. O ministério precisará provar que o teste segue eficaz e seguro. Custa em média R$ 350,00 em redes de laboratórios particulares. Se as quase 7 milhões de doses do Ministério da Saúde perderem a validade, o prejuízo aos cofres públicos será de aproximadamente R$ 240 milhões em valor de mercado.
O presidente de comissão da Câmara sobre a covid-19, o deputado Dr. Luizinho (PP-RJ), criticou o planejamento do governo federal para a entrega de testes. “Estimativa de compra errada, distribuição errada. Vamos chamar uma audiência pública para o ministério explicar esse absurdo e cobrar qual a estratégia a ser implementada.”
O ex-ministro da Saúde deputado federal, Alexandre Padilha (PT-SP) disse que a revelação sobre o iminente vencimento do prazo de validade dos testes será usada em pedidos já feitos ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério Público Federal (MPF) de apuração sobre falta de estratégia do governo na pandemia e para reforçar pedido de convocação de Pazuello para dar explicações no Congresso Nacional. “Vejo uma mistura de incompetência do ministério e estratégia do governo de esconder casos e óbitos”, disse.
Ministério da Saúde
Técnicos da Anvisa dizem que a prorrogação de validade não é incomum. Caso a Anvisa reprove a renovação, porém, os exames podem ser recolhidos e incinerados.
Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que: “Os estudos de estabilidade necessários para prorrogar a validade devem chegar ao Brasil nesta semana e que, se aprovada a renovação da validade, irá elaborar nota informativa sobre a segurança de uso dos testes”. O ministério também afirmou que distribui os testes conforme demanda de Estados e municípios.
Teste rápido em farmácias
A resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que aprovou a permissão em todo o Brasil para farmácias aplicarem teste rápidos para a covid-19 não é recomendado como diagnóstico pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Entretanto, de acordo com a OMS, o produto serve como ferramenta de auxílio para verificar se pessoas já tiveram contato com a doença.
O teste rápido detecta anticorpos da covid-19 em poucos minutos. Por isso deve ser aplicado após o sétimo dia de sintomas, quando o corpo já reagiu ao vírus.
Antes deste período, a chance de “falso negativo” é alta, atestam médicos infectologistas. Segundo análise encomendada pelo Ministério da Saúde, o exame doado pela mineradora Vale ao governo federal erra 75% dos resultados negativos, se aplicado no tempo errado.
A resolução aprovada pelos diretores da agência determina que farmácias devem informar a gestores locais sobre os resultados dos exames. “Resultados negativos não excluem infecção. Resultados positivos não devem ser usados como referência absoluta”, disse o presidente substituto da Anvisa, Antonio Barra Torres. O ideal, afirmou, é que exames complementares sejam feitos para confirmar a doença.
O teste de “padrão ouro” é o RT-PCR, que detecta o material genético do vírus em amostras coletadas, por exemplo, por “swab”, um instrumento semelhante a um cotonete usado em vias respiratórias dos pacientes, da nasofaringe e orofaringe. Apesar de preciso, este produto é mais caro e demorado.
Fazemos hoje em todo o território nacional testes, inclusive em via pública. Não há de se considerar risco de testes em ambiente protegido e sob regramento sanitário”, disse Torres.
Segundo integrantes do ministério, há forte pressão do Palácio do Planalto para ampliar o número de testes no País. A Saúde tem sinalizado que pretende aumentar o público-alvo para exames de diagnóstico rápido.
No começo da crise, o Ministério da Saúde recomendava apenas a aplicação de testes rápidos para quem atua na “linha de frente” do combate à covid-19, como profissionais da saúde. Em boletim epidemiológico publicado na última semana, no entanto, o ministério afirma que deseja “progressivamente” incluir idosos, portadores de condições de risco para complicações da covid-19 e a população economicamente ativa na rotina de testagem. A ideia seria também aumentar a “carteira” de curados e imunes à doença que poderiam retornar ao trabalho, dizem integrantes do governo.
A cúpula do Ministério da Saúde chegou a resistir à proposta, mas passou a apoiá-la recentemente. O ex-ministro da pasta, Nelson Teich, afirmou que melhorar o grau de informação sobre a doença no Brasil seria um pilar de sua estratégia de resposta à pandemia, que tem como um dos pontos a saída do distanciamento social, como defende Bolsonaro.
Qualidade
Para o advogado e ex-diretor da Anvisa Renato Porto, o Brasil não pode dispensar comprovações de qualidade dos testes rápidos autorizados para venda no Brasil, mesmo durante a covid-19. Ele cita como essencial a apresentação de certificado de “boas práticas de fabricação”, documento que assegura que o mesmo produto manterá qualidade ainda que fabricado em larga escala.
Porto afirma que o teste rápido é uma ferramenta útil para elaboração de políticas públicas de saúde sobre o novo coronavírus, ao permitir, por exemplo, medir se determinada região já foi exposta à doença. Com estes dados, um governo pode tomar decisões sobre relaxar ou reforçar medidas de isolamento. Ou uma empresa pode avaliar se já é hora de encerrar o home office, de seus colaboradores.
Mas para o diagnóstico de um paciente o produto mais indicado segue sendo o teste RT-PCR, de alta precisão, disse o ex-diretor da agência. “O que falta nesse processo é protocolo de uso de teste rápido. No caso do teste para HIV há regras e treinamento de equipes de saúde. Os profissionais acompanham o paciente, o governo sabe quem são essas pessoas”, exemplificou.
Val-André Mutran – É correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília