O feito é inédito e esta publicação do Blog do Zé Dudu vai entrar para a história: pela primeira vez, o município de Canaã dos Carajás, que começou lá no final de 2016 a produzir timidamente minério de ferro, ultrapassou Parauapebas, o maior produtor nacional desde 2005. As informações foram levantadas com exclusividade pelo Blog junto ao Ministério da Economia, que divulgou nesta sexta-feira (7) números finais da balança comercial nos municípios referentes a maio.
A disputa mineral entre ambos os municípios, que neste momento só tem importância para os planos da mineradora multinacional Vale, confirma o que o Blog vem exaustivamente divulgando: a prioridade da poderosa empresa é seu projeto S11D, na Serra Sul de Carajás, dentro dos limites de Canaã, enquanto a Serra Norte, dentro de Parauapebas, em franco processo de exaustão, deverá continuar a passos mais lentos.
Em maio, de acordo com o Ministério da Economia, Canaã dos Carajás exportou 8,23 milhões de toneladas de minério de ferro, um recorde, movimentando 538,7 milhões de dólares com a commodity. No mesmo período, Parauapebas lavrou 8,16 milhões de toneladas, tendo exportado 532,8 milhões de dólares. A diferença ainda é pequena, mas equivale à produção de minério de ferro inteira da Serra Leste, em Curionópolis, em alguns meses do ano. Ou seja, é significativo para o mercado externo, que atualmente se ressente da diminuição de produção da Vale no Brasil, em decorrência da tragédia registrada em Brumadinho (MG), quando uma barragem de rejeitos de minério de ferro se rompeu e matou quase 300 pessoas.
No total, Canaã foi o 4º maior exportador brasileiro em maio, movimentando quase 595 milhões de dólares. Parauapebas foi o 5º, com operações de 533 milhões de dólares. Desde 1997 Parauapebas não era ultrapassado no Pará no ranking das exportações.
Arrecadação de Canaã agradece
O impacto da corrida na produção terá efeito prático na vida de quem mora em Canaã e em Parauapebas e será especialmente sentido pelas prefeituras. Acontece que a extração do minério em maio é “fato gerador” dos apetitosos royalties de mineração que vão cair na conta no mês que vem, julho. E a menos que qualquer dos municípios receba algum “atrasado” como agora em junho, o que não se cogita no momento, os royalties recebidos pela Prefeitura de Canaã serão, também pela primeira vez, superiores aos recebidos pela Prefeitura de Parauapebas.
Além disso, a competição para ver quem produz mais minério inaugura uma dinâmica nova nas finanças e nas economias locais. Com o aumento do passo em Canaã, a prefeitura local vai, gradativamente, aumentar a arrecadação, sobretudo de royalties de mineração e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Já com Parauapebas em marcha a ré, as receitas oriundas das mesmas fontes podem minguar e, em caso de exaustão da atividade mineradora, secar.
Esses recursos financeiros, que deveriam chegar à vida de todos os habitantes que residem nos municípios mineradores em questão, não se permitem contemplar em políticas públicas. Parauapebas, com sua arrecadação bilionária anualmente, sofre com doenças erradicadas no início do século passado em lugares mais desenvolvidos. Do ponto de vista da atividade mineral, já é considerado maduro e, por ter sido intensamente explorado desde os anos de 1980, seus estoques minerais estão se esgotando.
Canaã, por outro lado, tem crescido um pouco melhor que Parauapebas quando tinha seu tamanho. Sua prefeitura é uma das que mais enriquecem no país e a expectativa é de que, com o avanço de S11D, a administração tenha mais dinheiro que Parauapebas em dez anos. Com população ainda pequena e receita gigantesca, vai dar para fazer muita coisa e colocar Canaã no topo do desenvolvimento nacional. Mas será?
Maldição do excesso de dinheiro
A julgar pelo Pará, que tem tradição de concentrar riquezas naturais e misérias de toda sorte em um só casamento, Canaã terá muita dificuldade de encontrar o caminho do progresso social, uma sina de todos os municípios paraenses. Hoje, nenhum lugar do estado, por mais rico que seja ou por mais dinheiro que sua prefeitura tenha em caixa, é considerado um dos 500 mais desenvolvidos do Pará, ou com melhor educação pública, ou com melhor distribuição de renda, ou com menor taxa de pobreza, ou com melhor oferta de saúde pública, ou com melhor infraestrutura urbana.
Quem mais se aproxima dos padrões de melhor é justamente Canaã dos Carajás, ao lado de Belém, Ananindeua e Parauapebas. Se sua fartura em recursos financeiros for canalizada para o desenvolvimento local, por meio de incentivos à educação, à transformação mineral, à logística e à agropecuária, conseguirá progredir e dar exemplos ao Pará de como se arruma a casa. Os municípios paraenses, via de regra, só têm apresentado exemplos e indicadores nada copiáveis.
Do contrário, Canaã dos Carajás poderá repetir a trajetória de Parauapebas, cujo orgulho, para alguns, são apenas os milhões na conta, enquanto nos bairros mais afastados das tomadas de decisão milhares não têm saneamento, não têm acesso a serviços de saúde, não têm renda, estão desempregados e passam fome.
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