Brasília – O descontrole generalizado por casos de Covid-19 está relacionado a uma histórica deficiência brasileira por infraestrutura de saneamento. É o que constata pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelando que 34% dos domicílios brasileiros não têm acesso à rede de esgoto.
A relação se dá porque quando foi feita a Pesquisa Nacional de Saúde 2019, do IBGE, em parceria com o Ministério da Saúde, não havia a pandemia do novo coronavírus no Brasil. Após seis meses de Covid-19 e quase 130 mil mortos pela doença tornaram ainda mais gritantes os números divulgados na última sexta-feira (11). Pelos dados da PNS, 34% (24,9 milhões) dos lares brasileiros não têm banheiro ou acesso à rede geral de esgoto. Mesmo no Sudeste, 11,3% das residências estão nessa condição. Na Região Norte, a situação é ainda mais dramática: apenas 20,8% das casas são ligadas à rede coletora de esgoto e Ananindeua, na região metropolitana de Belém é a pior cidade nesse quesito em todo o Brasil.
Não é coincidência que estados do Norte tenham enfrentado uma tragédia na pandemia. Como conseguir a adesão da população a protocolos de higiene fundamentais para prevenir a transmissão da Covid-19 — lavar as mãos, limpar e lavar superfícies — se cidadãos não dispõem nem de acesso ao esgoto? A pesquisa mostra que o saneamento continua a ser o gargalo crítico, já que o fornecimento de água (96,7%) e a coleta de lixo (91,4%) são quase universais.
O novo marco do saneamento, sancionado em julho depois de dois anos de tramitação, abre uma esperança para, se não resolver, ao menos melhorar esses índices vergonhosos. Um dos pontos-chave da nova legislação é aumentar a participação de empresas privadas num setor dominado por estatais, muitas delas de desempenho sofrível, como Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa).
Responsável pela distribuição de água e coleta de esgoto na maior parte dos municípios paraenses, inclusive a capital, a Cosanpa coleciona índices pífios e prejuízos há décadas.
Ranking
O novo Ranking do Saneamento Básico foi produzido pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a consultoria GO Associados. Trata-se de um trabalho abrange, uma vez que contempla as 100 maiores cidades do país, onde habitam 40% da população. O trabalho foi feito com base nos dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS).
Uma das principais conclusões do levantamento é a de que os avanços na área são pouco relevantes. Dessa forma, o país fica cada vez mais distante de atingir as principais metas de saneamento básico. Isso inclui, por exemplo, compromissos assumidos pelo país junto à Organização das Nações Unidas. Entre eles, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Para analisar os 20 piores colocados, o ranking detalhou os mesmos critérios utilizados para os 20 melhores, são eles: indicadores de atendimento de água, coleta e tratamento de esgotos, índice de perdas e investimentos.
Belém está na desonrosa 10ª posição com o prior saneamento entre as 20 piores colocadas entre as metrópoles brasileiras. Santarém ocupa a 17ª e a pior de todas, Ananindeua levanta o triste troféu de 19ª pior metrópole da lista, só sendo superada por Porto Velho.
O estudo “Panorama da participação privada no saneamento 2019”, feito pela Abcon/Sindcon, mostra que o Brasil, onde apenas 66% dos domicílios têm acesso à rede de esgoto, está aquém de economias de características similares, como Chile (99,1%), México (85,2%), China (76,5%) ou Peru (76,2%).
Pelo menos já se tem uma legislação mais adequada ao desafio de universalizar os serviços até 2030 — meta viável apenas se houver investimentos privados. Tornar os números lamentáveis menos díspares no país deverá ser uma agenda prioritária para o pós-pandemia.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.