Polícia Federal cumpre pedido do Ministério Público e prende oito funcionários da Vale

Foram cumpridos também 14 mandados de busca e apreensão em três Estados

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Brasília – A Polícia Federal cumpriu nesta manhã oito prisões e 14 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Rio e Minas Gerais requeridos pelo Ministério Público e autorizados pela justiça mineira. Todos os presos são funcionários da mineradora Vale.

Entre os presos há dois executivos, dois gerentes e quatro integrantes da equipe técnica da empresa. Segundo o Ministério Público (MP), todos tinham conhecimento da situação de instabilidade da barragem, e poder, dentro da hierarquia da empresa, para adotar providências, seja para estabilizar a estrutura da barragem ou providenciar a evacuação das pessoas das áreas de risco.

O objetivo das prisões, que devem durar 30 dias, é apurar a responsabilidade criminal pelo desastre que causou a morte de ao menos 166 pessoas em 25 de janeiro.

A polícia também cumpriu 14 mandados de busca e apreensão em três estados. Policiais foram até a sede da Vale, no Rio de Janeiro, para procurar documentos e computadores que possam auxiliar na investigação. Outros mandados de busca estão sendo cumpridos em endereços de Minas Gerais, Rio de e São Paulo ligados a quatro funcionários da empresa

alemã Tüv-Süd. responsável por emitir dois laudos no segundo semestre do ano passado que atestaram a estabilidade da barragem.

Um dos presos nesta sexta-feira é o gerente-executivo da Vale Alexandre Campanha, apontado em depoimento à Polícia Federal do engenheiro Makoto Namba, da empresa alemã TÜV SÜD, o teria pressionado para assinar o laudo que atestou a segurança da barragem no segundo semestre do ano passado.

Preso em 29 de janeiro em outra operação do MP relacionada à tragédia e solto nove dias depois por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em depoimento, o engenheiro relatou que Campanha teria lhe dito, durante uma reunião sobre o laudo: “A TÜV SÜD vai assinar ou não a declaração de estabilidade?”.

Namba disse, então, que assinaria o documento se a mineradora se comprometesse com as melhorias que os técnicos apontaram como necessárias. Ainda de acordo com o depoimento, o engenheiro “sentiu a frase proferida pelo mesmo (Campanha) e descrita neste termo como uma maneira de pressionar o declarante e a TÜV SÜD a assinar a

declaração de condição de estabilidade sob o risco de perderem o contrato”.

Campanha era gerente-executivo de geotecnia e, segundo os promotores, era o principal elo entre as auditorias externas e a área operacional da mineradora, sendo responsável pela regularidade formal das estruturas de barragem, revisões periódicas e auditorias de segurança.

Direção da Vale dava como certa as prisões

A direção da Vale não quis comentar as razões do pedido do MP, mas dava como certa a ação. Os outros funcionários da Vale presos são Artur Bastos Ribeiro, Cristina Heloíza da Silva Malheiros, Felipe Figueiredo Rocha, Hélio Márcio Lopes da Cerqueira, Joaquim Pedro de Toledo, Marilene Christina Oliveira Lopes de Assis Araújo e Renzo Albieri Guimarães

Carvalho.

Ao determinar a prisão, Chaves afirmou em despacho que, de acordo com os depoimentos já coletados na investigação, todos os oito funcionários da Vale tinham conhecimento da situação precária da Barragem I da Mina do Córrego do Feijão desde o primeiro semestre de 2018 e assumiram o risco de não acionar o plano de emergência e realizar a evacuação da

área. A barragem se rompeu no dia 25 de janeiro, deixando pelo menos 166 mortos já identificados até agora.

Em maio de 2018, funcionários da Vale e da consultoria Tüv-Süd, que atestou a estabilidade da barragem, trocaram uma série de emails sobre a situação instável da barragem.

A Vale, por sua vez, havia listado uma série de providências a serem tomadas, como rebaixamento do lençol freático e remineração dos rejeitos. Num e-mail enviado a seus pares da consultoria, no dia 13 de maio de 2018, porém, o engenheiro Makoto Namba havia ressaltado que tais medidas listadas pela Vale levariam “2 a 3 anos para surtir o efeito

desejado”.

Segundo o juiz, diversas mensagens foram trocadas entre consultores da TÜv-SÜd e funcionários da Vale entre os dias 23 e 24 de janeiro, véspera da tragédia de Brumadinho, sobre a situação de instabilidade da estrutura e que não havia outra alternativa aos funcionários da Vale senão acionar o plano de emergência e evacuar a área.

No entanto, afirma o magistrado, eles assumiram o risco de manter a mina em funcionamento, e, por isso, podem responder por homicídio qualificado. “Caso os investigados tivessem optado pelo acionamento do plano é forçoso concluir que, provavelmente, quase todas as vidas seriam poupadas”.

Chaves diz ainda que, “em um país que ‘pretende ser sério’, é preciso aprofundar as investigações e saber se os executivos que ocupam cargos mais relevantes na Vale tinham conhecimento da situação”. E acrescenta que os funcionários da Vale poderão trazer novas informações que desfaçam o quadro apurado até agora, mas que se alguma medida tivesse sido tomada depois da leitura do dia 10 de janeiro seriam evitadas as centenas de mortes.

Em nota lacônica, a Vale informou que está colaborando plenamente com as autoridades e permanecerá contribuindo com as investigações para a apuração dos fatos, juntamente com o apoio incondicional às famílias atingidas.

Val-André Mutran – É correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.