Por ampla maioria de votos, deputados e suspendem mudanças no Marco do Saneamento

Congressistas não admitem que governo alterem uma Lei por decreto
Plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (3)

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Brasília – “Não se trata de disputa política, mas o que está em jogo é o papel de todos nós legisladores”, resumiu o deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS), ao descrever o estado de espírito que motivou 295 deputados votarem a favor, contra 136, na aprovação do projeto de decreto legislativo (PDL nº 98/2023), que suspende dispositivos de dois decretos presidenciais redigidos pelo Ministério das Cidades e assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que modificou a regulamentação do novo marco do saneamento básico, na sessão desta quarta-feira (3). A matéria será enviada ao Senado.

No entendimento da maioria absoluta dos deputados, decreto presidencial é para regulamentar normas, jamais para alterar uma lei e nesse caso um conjunto delas denominado Marco Legal do Saneamento.

O texto aprovado é o substitutivo do deputado Alex Manente (Cidadania-SP) para o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 98/23, de autoria do deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES), ao qual estão apensados outros onze PDLs sobre o mesmo tema. O dois decretos editados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no início de abril deste ano revogam outras regulamentações editadas em 2020 e 2021.

Segundo os autores e deputados defensores da suspensão, o decreto permite a regularização de contratos atuais que deveriam ser extintos sem possibilidade de renovação, impedindo a realização de licitação para a contratação do serviço.

Já os defensores da regulamentação argumentam que ela beneficia cidades pequenas que não seriam de interesse de empresas privadas na montagem de blocos de municípios para a prestação regionalizada.

“Estamos sustando a contratação de estatais em diversos estados sem licitação e a possiblidade de contar situações irregulares como parte da capacidade econômica”, afirmou o relator.

No Decreto nº 11.466/2023, o substitutivo suspende trecho que permite ao prestador de serviços de saneamento em atuação incluir no processo de comprovação da capacidade econômico-financeira eventuais contratos provisórios não formalizados ou mesmo instrumentos de natureza precária, em resumo, contratações sem as devidas licitações.

Para contratar esses serviços na comprovação da capacidade econômica, o decreto permite às empresas a regularização dos contratos junto ao titular do serviço ou da estrutura de prestação regionalizada até 31 de dezembro de 2025. A data final do contrato regularizado deveria ser limitada a janeiro de 2040, prazo final permitida caso seja necessária prorrogação do prazo inicial previsto de dezembro de 2033.

Entretanto, a lei determina que os contratos provisórios não formalizados e os vigentes prorrogados fora das regras na nova lei serão considerados irregulares e precários, o que não permitiria sua regularização.

Ainda neste decreto, o PDL suspende outro artigo que lista várias documentações que o prestador de serviço de saneamento deve apresentar para comprovar sua capacidade econômico-financeira até 31 de dezembro de 2023, como cópia dos contratos com a inclusão dos respectivos anexos e termos aditivos e minuta de termo aditivo que pretenda celebrar para incorporar ao contrato as metas de universalização.

O outro decreto

Já no Decreto 11.467/2023, o projeto suspende cinco dispositivos com detalhes de regulamentação da prestação regionalizada dos serviços de saneamento.

Nesse tipo de prestação, os municípios são agregados para viabilizar a execução do serviço com ganho de escala, podendo ser em áreas metropolitanas ou mesmo em blocos de cidades que não compartilhem divisas territoriais.

Os trechos cuja suspensão foi aprovada pelo Plenário permitiam a coexistência de mais de um prestador de serviço dentro da mesma estrutura regionalizada, assim seria possível realizar licitação para apenas parte dos municípios abrangidos se outros já contassem com contratos vigentes ou situações de prestação direta pelos municípios integrantes.

Essa prestação direta poderia ocorrer com autorização da entidade de governança interfederativa e, nos casos de municípios que já tivessem atingido as metas de universalização, a eventual concessão da prestação do serviço neste município seria sempre condicionada à sua anuência.

De igual maneira, em regiões metropolitanas, aglomerações urbanas ou microrregiões, a prestação dos serviços no âmbito da prestação regionalizada por entidade estadual seria equiparada à prestação direta e condicionada à formalização dos termos da prestação.

Governo

Durante a discussão da proposta, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), tentou negociar mais prazo para chegar a um acordo. Ele lamentou a aprovação do texto. “Aqueles que estão defendendo este novo marco do saneamento não tiveram a preocupação com aqueles que mais precisam, porque o que prevaleceu foi o interesse econômico”, disse.

O deputado Fernando Monteiro (PP-PE), autor de um dos projetos, disse que tentou negociar com a Casa Civil desde a semana passada, mas que o governo não se manifestou. “O silêncio, para mim, muitas vezes fala mais alto, e ele falou mais alto que o governo não queria acordo. Que o governo não queria conversar, queria apenas ganhar tempo”, declarou.

Bancada do Pará

O deputado federal Joaquim Passarinho (PL-PA) fez questão de se manifestar na sessão, durante a discussão da matéria.

Dep. fed. Joaquim Passarinho denunciou que na Amazônia, apenas 3% da população tem acesso a água e esgoto tratados

“Para nós, que somos do Norte deste país, esse PDL é muito importante. Todo mundo fala, principalmente quem não mora na Amazônia, em defesa do meio ambiente. Somos hoje 27 milhões morando naquela região que não tem 3% de esgoto tratado. Isso é mais que qualquer tipo de poluição que nós possamos imaginar”, protestou.

“O pior para esse Brasil é deixar como estar. O pior é que pessoas querem é deixar do jeito que estar. Do jeito que estar não aguentamos mais. Precisamos de saneamento básico, de água tratada, de esgoto tratado. A Amazônia precisa disto. Precisamos sair da estagnação que nós estamos para trazer saúde para o nosso povo”, cobrou.

Três deputados estavam ausentes e não votaram o projeto: Antonio Doido e Elcione Barbalho, do MDB-PA e Celso Sabino (União-PA).

Veja no quadro como votaram os outros 14 deputados paraenses presentes.

Quadro de votação da bancada do Pará

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.