Podem não ser fartos como aqueles provenientes dos minérios, mas os royalties recebidos sobre o aproveitamento da água abastecem e enriquecem as prefeituras que se posicionam nas cercanias da Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Em 2018, os governos cujos municípios têm área inundada pelo reservatório da usina embolsaram, juntos, R$ 67,88 milhões pela chamada Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos (CFURH). As informações foram levantadas com exclusividade pelo Blog do Zé Dudu junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Muito pouco popular no Brasil, a sigla CFURH corresponde aos royalties hídricos que fazem a alegria de prefeitos que administram populações residentes em áreas de lagos de hidrelétricas. No Pará, oito prefeituras das cercanias da usina de Tucuruí recebem royalties proporcionados pelo caudaloso Rio Tocantins: Novo Repartimento, Goianésia do Pará, Jacundá, Nova Ipixuna, Breu Branco, Tucuruí, Itupiranga e Marabá. As cotas-partes são distintas porque variam conforme a extensão alagada.
Outras hidrelétricas no Pará também pagam royalties, como Belo Monte (recebem as prefeituras de Altamira, Vitória do Xingu e Brasil Novo), Curuá-Uma (prefeituras de Santarém e Mojuí dos Campos), Santo Antônio do Jari (Prefeitura de Almeirim), São Manoel e Teles Pires (Prefeitura de Jacareacanga, que recebe pelas duas usinas).
No caso da hidrelétrica de Tucuruí, diferentemente do que muitos pensam, quem recebe mais royalties não é a Prefeitura de Tucuruí, mas, sim, a de Novo Repartimento. Embora a casa de máquinas esteja no município que dá nome à usina (e, por isso, Tucuruí beneficia-se de milhões em taxas e impostos), a maior área alagada do reservatório está em Repartimento. Neste município estão 41% da extensão do lago, e é isso — o tamanho da área coberta por água para a geração de energia — que pesa no cálculo da compensação. Em Novo Repartimento, 1.441.30 quilômetros quadrados foram inundados para a formação do reservatório. É o equivalente a submergir 41 cidades do tamanho de Parauapebas.
A Prefeitura de Tucuruí recebe 17,7% dos royalties porque é com esse percentual de suas terras que o município contribui para a formação do lago — em números absolutos, são 621,62 quilômetros quadrados de área alagada. Marabá é o município que menos empresta terras, contribuindo apenas com 43,57 quilômetros quadrados, praticamente o tamanho de sua malha urbana.
Royalties movem Repartimento
Sem considerar Marabá no cálculo, já que a prefeitura desse município não recebeu sequer R$ 1 milhão em compensação pelo uso da água no ano passado, o Blog do Zé Dudu constatou que os royalties potencializam as contas da maioria das prefeituras à beira do Lago de Tucuruí, em maior ou menor grau.
A Prefeitura de Novo Repartimento, por exemplo, recebeu R$ 27,85 milhões em CFURH durante 2018, o que representou 17% de sua arrecadação líquida. Embora o governo daquele município seja um dos mais omissos e atrasados do Pará na entrega de relatórios das contas públicas, o Blog cruzou os valores de compensação indicados pela Aneel com a receita apurada nos últimos 12 meses e que constam da última prestação de contas disponível, do mês de agosto. O Blog visitou o portal de transparência da Prefeitura de Novo Repartimento (disponível aqui) e percebeu que a gestão não publicou sequer o Relatório Resumido da Execução Orçamentária referente ao 5º bimestre do ano passado.
Repartimento tem a segunda prefeitura mais rica do lago, com previsão de receita líquida de R$ 160,52 milhões. Até agosto, a administração do prefeito Deusivaldo Pimentel, o “Amizade”, havia estourado o limite de gastos com pessoal, que é de 54%, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Amizade usara 57,61% no segundo quadrimestre de 2018 e, desde que assumiu o comando de Repartimento, em 2017, vem avançando o sinal vermelho da lei consecutivamente. Se os royalties hídricos deixassem de existir hoje, Repartimento iria à falência, visto que o governo local não consegue se ajustar nem mesmo com a fartura financeira de hoje.
Compensação garante serviços
Uma prefeitura que também poderia ir à lona não fossem os royalties hídricos é Goianésia do Pará, cuja receita líquida de R$ 82,18 milhões ao longo de 2018 teve 12,84% (ou R$ 10,55 milhões) de contribuição da compensação pelo uso da água. Lá, sem a CFURH, o prefeito José Ribamar Lima teria dificuldades para tocar obras da área de urbanismo, serviço com o qual o seu governo liquidou R$ 6,99 milhões no ano passado, ou para garantir a oferta da educação infantil, que custou R$ 8,26 milhões aos cofres públicos.
Em Jacundá, os R$ 6,62 milhões que o prefeito Ismael Barbosa viu entrar no caixa como royalties hídricos são praticamente equivalentes aos gastos de seu governo com assistência hospitalar e ambulatorial (R$ 6,75 milhões). Já em Breu Branco, os R$ 4,6 milhões recebidos em CFURH são um reforço para potencializar a agricultura, cujo orçamento previsto pelo prefeito Francisco Garcês ano passado foi menos da metade desse valor.
Mesmo para prefeituras com caixa poderoso como Tucuruí, que tem o 9º governo mais rico do Pará, com arrecadação líquida de R$ 304,5 milhões ano passado, os royalties importam. Os R$ 12 milhões que entraram na conta da administração comandada por Artur de Jesus Bruto são quase o mesmo tanto que o governo previu desembolsar com infraestrutura urbana da cidade que beira 100 mil habitantes.
Em maior ou menor grau de dependência, as prefeituras do Lago de Tucuruí navegam mansamente nos recursos financeiros da compensação hídrica e tocam a vida contempladas pela fartura do Rio Tocantins, uma dádiva vertical do Pará e às margens do qual o crescimento das receitas é constante, ainda que desacompanhado do ideal desenvolvimento para as populações que dele carecem.
2 comentários em “Prefeituras do Lago de Tucuruí receberam quase R$ 70 milhões em royalties”
Faltou dizer que o Estado do Pará recebeu o mesmo montante distribuido as prefeituras e adota os mesmos critérios quando o assunto é transparencias no uso dos recursos. O
Abrindo a caixa preta das prefeituras da usina…… isso ai!!……. vamos usar os dados na nossa radio comunitária aqui na vila Permanente.