Procurador cria, no Pará, modelo que convence clientes a evitar fornecedores que agridem a natureza

Continua depois da publicidade

Quando Daniel César Azeredo Avelino deixou Brasília para atuar no Ministério Público Federal (MPF) no Pará, em 2007, tinha 26 anos e um desafio: ajudar a reduzir o desmatamento da Floresta Amazônica. Como advogado da União, seu cargo anterior, já havia percebido que recorrer à Justiça não era suficiente para resolver o problema. Menos de 0,01% das multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) eram de fato pagas, mas, além da morosidade no julgamento das ações, 98,5% das penas eram transformadas em tarefas sociais, como doação de cestas básicas em valores ínfimos. Surgiu, então, a percepção de que o melhor era envolver nessas tarefas toda a cadeia de negócios que se segue ao corte da floresta.

– O desmatamento é difícil de se reparar. Por isso, é preciso impor metas com o conceito de premiação – diz Avelino.

Depois que os madeireiros entram nas matas e retiram as árvores de maior valor, o primeiro negócio instalado é a pecuária. E foi justamente nesta cadeia de produção que o procurador passou a agir. Em junho de 2009, o MPF e o Ibama processaram empresas e pessoas acusadas de desmatar uma área de 157 mil hectares no Pará. As indenizações pedidas a fazendas e frigoríficos chegaram a R$ 2 bilhões. Ao mesmo tempo, 69 renomados clientes desses frigoríficos, muitos deles no Sudeste do país, receberam a recomendação de evitar compras de quem contribuía para destruir a floresta. Redes como Pão de Açúcar, Wal Mart e Carrefour aderiram. Diante do prejuízo, o MPF passou a negociar com os frigoríficos os chamados Termos de Ajustamento de Conduta (TACs).

Um mês depois, foi fechado o acordo. Em troca da extinção das ações judiciais, o MPF obteve de frigoríficos como Bertin e Minerva o compromisso de não comprar de fornecedores que continuassem a desmatar ilegalmente e atuassem sem licenciamento ambiental. Foram excluídos ainda da lista de fornecedores fazendas embargadas ou processadas por trabalho escravo ou invasão de áreas indígenas. A partir da data do acordo, as fazendas tiveram prazo de dois anos para fazer o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e obter licenciamento ambiental; e 60 meses para obter a regularização fundiária.

– Não perdoamos simplesmente o desmatamento passado. Estabelecemos metas que, se cumpridas, são premiadas – explica Avelino.

A partir daí, os TACs se tornaram instrumento eficiente no combate ao desmatamento no Pará. Além de atuar com cadeias de produção, Avelino passou a engajar municípios e produtores na empreitada. E o primeiro município a aderir é emblemático: Paragominas, onde a sede do Ibama foi incendiada em 2008, depois de uma operação para combater o comércio ilegal de carvão. A situação começou a mudar quando Adnan Demachki, então prefeito, produtores rurais e líderes comunitários criaram um programa de regularização fundiária por meio do Cadastro Ambiental Rural. Mapeada cada propriedade, qualquer desmate ilegal pode ser verificado por equipes da própria prefeitura, que aciona o Ministério Público e o Ibama.

O resultado é visível. Enquanto o desmatamento cresce na Amazônia Legal, no Pará ele está em queda a cada ano: 4.281 km² em 2009; 3.770 km² em 2010; e 3.008 km² em 2011. Apesar de o Pará ainda ser o que mais desmata na Amazônia, fiscalização e novos pactos prosseguem.

– Tínhamos grandes áreas desmatadas, de 400, 500 hectares. Agora, temos de 15 hectares – conta o procurador, que pretende levar o modelo a toda a Amazônia Legal.

Fonte: O Globo