Brasília – Um grupo de diplomatas, parlamentares, representantes de pelo menos cinco ministérios e jornalistas estrangeiros desembarcaram na quarta-feira (8), no aeroporto de Carajás, ciceroneados pelo vice-presidente da República, general Hamilton Mourão (PRTB), que também preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal. Será a segunda missão diplomática à região, “os embaixadores terão a oportunidade de ver o ‘real problema’ da maior floresta tropical do mundo durante a viagem”, resumiu Mourão. Está prevista, ao longo de três dias, a visita aos municípios paraenses de: Parauapebas, Carajás, Altamira, Medicilândia e Belém.
“Esta viagem vai se desenvolver na Amazônia Oriental, mais especificamente no estado do Pará. O objetivo é apresentar a essas autoridades estrangeiras — bem como ao público brasileiro, por meio dos formadores de opinião que irão nos acompanhar — a realidade da região e as principais políticas [federais e estaduais] com vistas ao desenvolvimento da Amazônia Legal”, disse Mourão na segunda-feira (6).
Um “choque de realidade” será o principal objetivo da agenda proposta pelo vice-presidente general Hamilton Mourão e a viagem acontece poucos dias depois de o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o próprio Mourão e alguns ministros terem feito várias declarações criticando a visão que países do exterior têm do Brasil quanto ao meio ambiente.
Serão três dias de viagens para conhecer a realidade da região
Após as críticas de que o governo brasileiro teria escolhido só áreas preservadas da Amazônia, a estratégia do governo mudou nessa segunda visita.
De acordo com a assessoria da vice-presidência, a comitiva composta por representantes do Japão, Espanha, União Europeia, Angola, Paraguai, França, Índia, Uruguai, Reino Unido, Suíça e da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), além dos senadores Nelsinho Trad (PSB-MS) e Kátia Abreu (PP-TO), representantes dos ministérios do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI), Ministério de Minas e Energia, Ministério do Meio Ambiente, Ministério das Relações Exteriores e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, também farão parte desta segunda missão diplomática.
“No ano passado, nós levamos os embaixadores à Amazônia Ocidental. A Amazônia Ocidental, em grande parte, 90% ou 95% está preservada. Agora vamos levar os diplomatas na Amazônia Oriental, onde se encontram realmente os maiores problemas”, disse o vice-presidente Hamilton Mourão. O Pará lidera os maiores índices de desmatamento do Brasil nesse ano, superando o tradicional segundo colocado, o estado do Mato Grosso.
De acordo com o vice-presidente, os embaixadores poderão analisar o terreno para entender como funciona a Amazônia. “Vão ter condições de avaliar efetivamente, olhando o terreno, o que acontece e o que deixa de acontecer”, declarou.
“O que nós pretendemos mostrar: um projeto de mineração correto e uma área que não está correta. Mostrar os trabalhos de pesquisa e de inovação que são feitos com base nos institutos que temos na região de Belém do Pará. Assim como também vão visitar áreas de madeireiras ali na região de Santarém e vão ver madeireira que está ok e madeireira que não está ok”, explicou o vice-presidente.
Uma das medidas adotadas pelos órgãos envolvidos na viagem foi a realização de testes de detecção do coronavírus. “Todos os integrantes da comitiva realizaram testes de detecção do coronavírus, e serão respeitados os protocolos de prevenção à Covid-19, conforme as orientações das autoridades de saúde”, informou a nota.
Veja a programação completa:
8 de setembro
– Partida de Brasília para Parauapebas – Carajás (PA);
– Sobrevoo sobre a Flona – Floresta Nacional de Carajás (PA);
– Exposição sobre as operações da Vale e visita às operações de mineração, em Carajás (PA);
– Deslocamento aéreo para Belém (PA);
– Recepção de boas-vindas oferecida pelo Governo do Pará, em Belém (PA).
9 de setembro
– Deslocamento para Altamira (PA);
– Visita à Usina de Belo Monte e sobrevoo sobre a Volta Grande do Xingu;
– Visita à unidade de processamento de cacau – Gencal, Altamira (PA);
– Deslocamento aéreo para Belém (PA).
10 de setembro
– Visita à Fundação Evandro Chagas, Belém (PA);
– Visita ao Museu Emílio Goeldi, Belém (PA);
– Coletiva de Imprensa;
– Almoço;
– Retorno a Brasília (DF).
Primeira missão
A primeira missão com os embaixadores foi realizada em novembro de 2020 (nos dias 4 a 6) e incluiu visitas a Manaus, São Gabriel da Cachoeira e Maturacá, no Amazonas. Na ocasião, compuseram a comitiva diplomatas da África do Sul, Espanha, Peru, Colômbia, Canadá, Suécia, Alemanha, Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), União Europeia, Reino Unido, França e Portugal.
O convite foi formulado após uma resolução ao término da 6ª reunião do colegiado, em 24 de agosto.
A visita foi organizada após oito países europeus enviarem carta a Hamilton Mourão afirmando que a alta do desmatamento passava uma má impressão e dificultava a compra de produtos brasileiros por parte dos consumidores do continente.
Nos bastidores, a repercussão da viagem foi negativa. O entendimento era de que o mundo todo tem acesso às imagens de satélite que mostram o que está acontecendo na Amazônia e no Pantanal, por exemplo. E o impacto da devastação não seria apagado com um passeio em trechos preservados.
Durante o seminário sobre ações estratégicas para a defesa dos interesses nacionais na questão ambiental, promovido pelo Instituto General Villas Boas, no dia 25 de agosto, Mourão disse: “Quando a gente vê discursos de líderes de outros países se referindo a problemas da Amazônia, é uma forma de intervenção. O seguinte passo é a propaganda, como nós vemos acontecer hoje na comunidade internacional, uma propaganda negativa em relação àquilo que é a realidade na Amazônia brasileira”, disse.
Na ocasião, o número de incêndios registrados na Amazônia bateu o recorde da década. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados no primeiro dia de novembro do ano passado, as queimadas na floresta subiram 25% nos primeiros 10 meses de 2020 na comparação com 2019, foram 2.856 focos de incêndio ao longo de outubro.
O que está em jogo?
Maior floresta tropical do mundo, a conservação da Amazônia desperta atenção internacional, já que, além dos prejuízos imediatos para a população local e para a economia brasileira, sua destruição causaria impactos globais, dentre eles a liberação de grande quantidade de gases de efeito estufa. No início de agosto, após a divulgação dos dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), o vice-presidente disse que o Brasil não atingirá, este ano, a meta de reduzir em 10% o desmatamento da Amazônia.
“Provavelmente, não vou cumprir aquilo que eu achava que seria o nosso papel: chegar a 10% de redução. Acho que vai dar na faixa de 4% a 5%, uma redução muito pequena, muito irrisória, mas que já é um caminho andado”, disse Mourão a jornalistas. Dias depois, o secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Orlando Leite Ribeiro, destacou os esforços da pasta para reverter imagem negativa do Brasil no exterior em relação ao desmatamento e a queimadas.
“É preciso diferenciar o problema que temos do problema da imagem. Temos, sim, problemas com o número crescente de desmatamento. O governo está ciente disso e tenta reverter. Mas existe um problema maior que é a percepção, no exterior, dessa situação. No imaginário popular europeu, a Amazônia está queimando e estão extraindo madeira no coração da Amazônia, mas a gente sabe que não é isso”, disse Ribeiro durante evento promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Forças de Segurança
Além de servidores federais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes (ICM-Bio), militares das Forças Armadas (Aeronáutica, Exército e Marinha) e agentes da Força Nacional de Segurança Pública vêm atuando na prevenção e repressão a crimes ambientais na região amazônica.
Em agosto, o Conselho Nacional da Amazônia Legal prorrogou a operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) Samaúma, por mais 45 dias, contados a partir de 31 de agosto.
Segundo o Ministério da Defesa, entre 28 de agosto e o fim do mês passado, cerca de 1.200 militares e 150 servidores de vários órgãos, incluindo as polícias Federal e Rodoviária Federal, realizaram 191 ações preventivas e 309 inspeções nos estados do Amazonas, Mato Grosso, Pará e Rondônia. Foram apreendidos 8.536,56 metros cúbicos de madeira; 34.396 litros de combustíveis; 50 tratores, escavadeiras, caminhões, veículos diversos e embarcações; 28 armas e 137 maquinários de serraria e mineração. Durante toda a ação, foram aplicadas 189 multas, que totalizaram em mais de R$ 270 milhões.
Já o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou na quarta-feira (8) que mais de 600 policiais e bombeiros da Força Nacional de Segurança Pública estão participando das 17 operações desenvolvidas pela tropa federativa na Amazônia Legal.
De acordo com a pasta, desde o início de janeiro, o efetivo da Força Nacional deslocado para a região participou de ações que, somadas, resultaram na aplicação de mais de R$ 13 milhões em multas ambientais. Os policiais e bombeiros cedidos à tropa federativa também atuaram em 763 ações de fiscalização e da apreensão de 1.946 m³ de madeira ilegal, de 15,5 mil litros de combustíveis, drogas, armas e veículos, além do resgate de 186 animais silvestres e da abordagem a 4.065 pessoas.
Parte das 17 ações que contam com a participação da Força Nacional de Segurança Pública integra a chamada Operação Guardiões do Bioma. Deflagrada no fim de julho deste ano, a operação é parte do Plano Estratégico Operacional de Atuação Integrada no Combate a Incêndios Florestais, cujo objetivo é combater crimes ambientais na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal, segundo demanda dos governos estaduais.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.