Por José Marques – Folha de São Paulo
No antigo hotel que servia, até março, de alojamento para cerca de 350 terceirizados do setor de extração de ferro, restam apenas um secretário e uma faxineira. A energia foi cortada, e o telefone não pode receber ligações.
O prédio fica no Alto dos Pinheiros, em Itabira (MG), um dos maiores produtores do minério no Estado, afetado pela queda de arrecadação –R$ 19 milhões a menos que os R$ 85 milhões esperados entre janeiro e fevereiro– com a venda do minério de ferro e desemprego.
De acordo com dados do Ministério do Trabalho, neste ano foram 136 contratados para trabalhar diretamente com extração mineral, ante 450 demissões –número que não leva em conta empresas que trabalham indiretamente no setor, como pequenas empreiteiras.
Os cortes, aliados ao anúncio de que a Vale teve prejuízo de R$ 9,5 bilhões no primeiro trimestre e a boatos de que as minas mais caras da região seriam fechadas, fazem os moradores temer que Itabira vire cidade fantasma.
De maio do ano passado a abril de 2015, o Brasil demitiu quase 10 mil pessoas a mais do que contratou na mineração, o maior número ao menos desde 2004.
O freio nas contratações é puxado pela recessão nacional e pela redução do crescimento chinês, que passou a comprar menos. O minério de ferro, carro-chefe da indústria itabirana, responde por 73% das exportações minerais, segundo o DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral).
“Estamos com um quadro de excesso de oferta de minério. Produzimos mais, mas o preço, que chegou a US$ 110 a tonelada em 2013, deve chegar a US$ 45”, diz o economista Adriano Porto, da UFMG. As demissões, diz, ajustam o mercado à nova realidade.
Em Minas, além de Itabira, cidades como Araxá e Ouro Preto enfrentam consecutivos meses com desemprego maior que admissões no setor, assim como Poços de Caldas, produtora de bauxita, minério do alumínio.
‘DE FERRO’
Conhecida por ser o berço da Vale e a cidade “de ferro” dos versos de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), Itabira agora busca soluções para diminuir a dependência da empresa.
No último mês, um movimento organizado por sindicatos, comerciantes e igrejas fez protestos contra os desligamentos. As demissões, diz o movimento, afetaram toda a economia do município, em um efeito cascata.
“Tivemos uma queda de 20% a 30% nas vendas desde o início do ano”, afirmou Maurício Martins, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas itabirana.
Dono de uma imobiliária, Sidney Lage afirma que assinava cerca de 20 contratos de aluguel por mês, principalmente para trabalhadores ligados à mineração. Em maio, foram apenas dois.
Após os protestos, o sindicato dos trabalhadores da categoria se reuniu com a Vale e afirma ter acordado que, de junho ao fim do ano, a rotatividade na região não passe de 2,5%.
Procurada, a mineradora não comentou a reunião. Em nota, disse que mantém uma rotatividade “bem abaixo da média da indústria brasileira de mineração e siderurgia, que é de 15%”.
O comunicado diz ainda que, com a conclusão de dois projetos em Itabira, orçados em US$ 2,6 bilhões, houve “redução do ritmo de obras” e um “processo natural” de desligamentos de terceirizados, previsto desde a contratação das empresas.
NO PARÁ
Embora tenha um saldo positivo de 4% no crescimento do emprego nos últimos 12 meses, as mineradoras do Pará também demitiram mais do que admitiram desde o início do ano. O Estado é o segundo maior produtor de minérios do Brasil.
Na expectativa da principal cidade mineradora do Estado, Parauapebas, a tendência é que a queda continue.
A prefeitura já fala que espera uma arrecadação 30% menor em 2015. “É culpa da retração no mercado asiático, por causa do preço do minério de ferro. Há uma onda considerável de demissões porque temos que diminuir a promoção”, diz Marcel Nogueira, secretário de Comunicação do município.
Ainda assim, a cidade, localizada no sopé da serra dos Carajás, teve 850 contratados a mais que demitidos –uma variação positiva de quase 9%– desde maio do ano passado. Parauapebas recebe 22% da compensação financeira pela exploração de recursos minerais do país, de acordo com o DNPM.
O minério da cidade é qualificado pela Vale como “o melhor do mundo” e tem processo de beneficiamento mais barato que o mineiro.