Dois temas dominam a pauta do Congresso Nacional, na semana que antecede o recesso legislativo previsto para o dia 18 de julho. Na Câmara dos Deputados, o primeiro dos dois projetos que regulamentam a Reforma Tributária é prioridade na Ordem do Dia. No Senado, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), pode votar o projeto que concede autonomia orçamentária ao Banco Central.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse que o primeiro texto da regulamentação da reforma tributária, que vai a Plenário na forma de um substitutivo ao projeto de lei complementar (PLP n° 68/2024), começa a ser votado na próxima quarta-feira (10). Lira trata a regulamentação da Reforma Tributária como prioridade total nessa fase da legislatura sob seu comando.
Até lá, associações e frentes parlamentares negociam a modificação do texto do substitutivo. A conversa agora é com o próprio Lira e com líderes partidários, já que a intenção é deixar tudo azeitado para poupar o alongamento da votação.
Na semana que antecede o início do recesso legislativo (18 de julho), quando os trabalhos na Câmara dos Deputados e do Senado Federal param e só retomam em agosto, Arthur Lira quer concluir pelo menos a votação do PLP n° 68/2024, que regulamenta regras do novo sistema tributário nacional, preconizado pela Emenda Constitucional n° 32/2023.
Na terça-feira (9), o presidente da Câmara e líderes partidários se reúnem para decidir o dia de votação do texto principal, o projeto de lei complementar 68 de 2024. É o que institui o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), a CBS (Contribuição Social sobre Bens e Serviços) e o IS (Imposto Seletivo).
O Imposto Seletivo é o que tem causado mais questionamentos. Setores atingidos, como carros elétricos, discordam e ainda tentam ser excluídos do imposto seletivo. Dois pontos distintos geraram reações: as inclusões de setores econômicos no chamado “imposto do pecado [imposto seletivo], com taxação, que em alguns casos aumentam os impostos desses setores, e a exclusão de carnes, da cesta básica desonerada. A essa altura, há poucas chances de mudanças significativas.
O texto final, que ainda pode ser modificado na votação em Plenário, foi apresentado na quinta-feira (4/7). “Agora, é uma questão política”, disse o deputado federal Joaquim Passarinho (leia aqui). Não há muitas objeções. A meta de Lira, porém, é que não haja nenhuma. Quer o texto como seu legado político à frente da Casa Baixa.
Ainda ficará faltando o segundo texto, o PLP n° 108 de 2024, que trata do Comitê Gestor e da distribuição de receita do IBS. O relatório final deve ser apresentado nesta segunda-feira (8/7), mas Arthur Lira, tacitamente, quer votá-lo apenas após o retorno do recesso para não misturar os assuntos e acirrar as resistências.
Integrantes do grupo de trabalho, porém, querem a votação antes do recesso. O impasse está posto e a solução ainda não está dada.
Mobilização
Nos últimos dois anos, desde o início desta legislatura no Congresso Nacional, um fenômeno político tem se destacado na rotina de articulações e decisões políticas: a força de mobilização das frentes parlamentares setoriais ativas no Parlamento, tem mostrado força para a aprovação de matérias cruciais da pauta.
São colegiados suprapartidários, detém assessoria técnica altamente qualificada, e funcionam como suporte para as decisões de seus membros. Exemplo proeminente desse fenômeno, ficou marcante na aprovação do Projeto de Reforma Tributária, ainda na legislatura passada.
Agora, com o relatório do PLP apresentado pelo grupo de trabalho (GT) na última semana que não incluiu as carnes na cesta básica, com isso, esses produtos não terão alíquota zero. Após o anúncio, o setor já prevê que a medida pode aumentar o custo para o consumidor final e a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) quer reverter a situação.
Ela não está sozinha, como diz o deputado federal Joaquim Passarinho (PL-PA), presidente da segunda maior frente parlamentar do Congresso Nacional, a do Empreendedorismo (FPE), que também fechou questão para criar as condições de inclusão de carnes na cesta básica desonerada.
O tema pode ser um empecilho na hora da votação, já que a bancada ruralista é a maior da Câmara dos Deputados e o presidente, deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), afirmou, em nota, que não vai “permitir que qualquer ponto da proposta traga malefícios para o setor”. Somada a força de outras frentes, a possibilidade de inclusão de carnes na cesta básica aumentou consideravelmente.
“Todo mundo tem direito de comer mignon [um dos cortes mais caros da carne bovina], mas precisamos tirar imposto, por isso discordamos totalmente dos números apresentados sobre os impactos”, destacou Lupion. De acordo com o GT, o acréscimo das proteínas na cesta básica traria um aumento de 0,57% na alíquota de referência, que está prevista em 26,5%.
Em nota, a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) disse que a carne não é tributada em PIS e Cofins, além de ter incentivos de ICMS em alguns estados. A entidade também apontou que o produto é essencial para “uma alimentação nutritiva e saudável”. “A nova tributação sobre as carnes terá impacto sobre os preços e reduzirá o acesso às proteínas por parte da população que mais necessita”, acrescentou a Abrafrigo.
Além das proteínas, a FPA também busca incluir outros produtos na lista da cesta básica. A intenção é que sejam colocados também:
• produtos hortícolas;
• sucos naturais sem adição de açúcar e conservantes;
• molhos e preparações;
• farinhas, grumos, sêmolas, grãos esmagados e floco de aveia.
Joaquim Passarinho, da FPE, e Pedro Lupion, da FPA, e outras frentes parlamentares, articularam uma coalizão para fechar questão sobre a discussão dessas incertezas que rondam a aprovação da regulamentação da reforma tributária.
Coalização
A Coalizão de Frentes Parlamentares entende que a regulamentação da Reforma Tributária é uma das pautas mais urgentes e necessárias para o desenvolvimento do Brasil. “Compartilhamos do desafio de garantir maior segurança jurídica, eficiência e autoaplicabilidade à Legislação Tributária do Brasil com o Grupo de Trabalho de Regulamentação da Reforma Tributária, responsável pelo relatório apresentado nesta quinta-feira (4/7), fruto de amplo diálogo com todo o setor produtivo brasileiro”, diz o documento divulgado à imprensa.
“Deste modo, reafirmamos neste documento os pontos essenciais para serem observados e implementados no Projeto de Lei Complementar nº 68/2024, para que os líderes partidários da Câmara dos Deputados, bem como o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, possam dialogar nesta construção. Veja-se:
1. Autoaplicabilidade da Norma: assegurar norma jurídica clara, com eficácia plena e sem necessidade de regulamentação infralegal posterior, exceto nos casos em que a Constituição de 1988 determinar ou que já houver sido regulamentada;
2. Incidência sobre o fornecimento não oneroso ou a valor inferior: é importante garantir que o IBS e a CBS não incidam sobre os serviços para uso e consumo pessoal de cônjuges, companheiros ou parentes, consanguíneos ou afins, até terceiro grau, das pessoas físicas;
3. Não-cumulatividade plena: estabelecer e regulamentar um regime que garanta a não- cumulatividade tributária, afastando a incidência em cascata, de modo a assegurar maior justiça fiscal e evitar distorções no sistema tributário brasileiro;
4. Imposto Seletivo: a hipótese de incidência deve ser estabelecida por Lei Complementar específica, bem como a incidência deve ser monofásica para garantir a simplificação na arrecadação e na administração desse tributo, conforme disposto no PLP 29/2024;
5. Crédito tributário: assegurar a validade e o pleno aproveitamento dos créditos tributários, tanto para empresas do Simples Nacional quanto para as empresas regidas pelos regimes específicos, de modo a assegurar que os créditos possam ser utilizados nas mesmas situações de fiscalização tributária. Além disso, é de suma importância a redução do prazo para devolução do crédito para as empresas, bem como a possibilidade de as empresas venderem esse crédito. No caso dos bens imóveis, a restituição do crédito é permitida somente após o habite-se. Portanto, é necessário criar uma regra uniforme para todos os casos e evitar inseguranças jurídicas;
6. Definição de fato gerador: é fundamental estabelecer uma definição clara e precisa do fato gerador de cada tributo no PLP 68/2024, a fim de garantir segurança jurídica e evitar disputas interpretativas que possam ampliar o contencioso administrativo e judicial tributário;
7. Split payment: garantir a redução dos custos de investimentos, financiamento e implementação do novo sistema, de modo a estimular o crescimento econômico;
8. Valor de referência em operações imobiliárias: adoção de valor da operação efetiva, e não o valor de referência com base nos cálculos nas operações imobiliárias;
9. Cesta básica: elaboração de lista ampla de produtos destinados à alimentação humana com benefícios tributários, nos termos da Constituição, possibilitando redução no custo dos alimentos para a população;
10. Defesa do meio ambiente: a defesa do meio ambiente não deve ocorrer apenas com viés punitivo, mas pode ser utilizada de forma a promover o desenvolvimento econômico e regional, inclusive estimulando a inovação e sustentabilidade nas atividades produtivas tradicionais”. Continua o documento.
“Solicitamos, portanto, que as sugestões mencionadas sejam cuidadosamente consideradas, pois acreditamos firmemente que a implementação dessas medidas contribuirá significativamente para a adoção de um sistema tributário mais equitativo, institucionalizando uma nova abertura e diálogo com o setor produtivo nacional por meio da Coalizão de Frente Produtivas aqui disposta”, prossegue a proposta das frentes parlamentares.
“Entendemos que a Reforma Tributária é assunto complexo. Assim, a Coalizão das Frentes Produtivas se coloca à inteira disposição de todos os líderes partidários para garantir o cenário político adequado e capacitado para conduzir uma discussão profunda e aprovar esta legislação com a devida atenção que o tema requer, na garantia do desenvolvimento econômico, do fomento da criação de empregos e do aumento da renda em nosso país”, conclui o manifesto.
Confira a íntegra do documento.
Senado vota autonomia financeira do Banco Central
Está previsto a votação, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o projeto que concede autonomia orçamentária ao Banco Central.
Depois da comissão, fica faltando o voto em plenário. O governo é contra. Se for aprovado, será mais uma derrota para Lula, que deseja mais influência sobre a autoridade monetária.
Fontes do governo dizem que o anúncio do novo presidente da autarquia federal vinculada, mas não subordinada, ao Ministério da Fazenda, responsável pela gestão da política monetária do Brasil, só será feito pelo governo em agosto.
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.