Brasília – Dois dos projetos mais polêmicos em tramitação no Congresso Nacional tiveram o regime de urgência aprovados antes do recesso parlamentar no dia 18 de julho, e o Plenário da Câmara pode votar a qualquer momento as duas matérias. O projeto de lei (PL 2633/2020) que estabelece critérios para a regularização fundiária de imóveis da União, incluindo assentamentos, e o projeto de lei (PL 591/2021) que extingue o monopólio dos Correios sobre o serviço postal, permitindo a entrada da iniciativa privada em todos os serviços, como a entrega de correspondência.
Os projetos sofrerão forte resistência da oposição para a aprovação. O PL 2633/2020, que permite a regularização sem vistoria física de propriedades rurais de até 6 módulos fiscais no país, área que varia de 5 a 110 hectares, dependendo da região e nos assentamentos promete uma batalha em Plenário durante as discussões para votação.
Histórico
Este projeto tem origem em uma medida provisória (MP 910/2019) que perdeu a validade por não ter sido votada pelo Congresso. A MP permitia a regularização de propriedades de até 15 módulos fiscais e o projeto pronto para ser votado foi apresentado pelo então relator da medida, deputado Zé Silva (Solidariedade-MG).
Ele limitou o tamanho das propriedades a serem regularizadas a no máximo 6 módulos fiscais e estabeleceu que só as áreas ocupadas antes de 2008 podem ser regularizadas. Apesar das mudanças, deputados ambientalistas consideram que a proposta beneficia grileiros e vai permitir o aumento do desmatamento. É o que disse o deputado Nilto Tatto (PT-SP). Manifestações anteriores de líderes de partido de esquerda também são radicalmente contra a matéria e já disseram que vão obstruir a matéria.
“Quando se fala em propiciar aqui, através do sensoriamento remoto, é uma espécie de uma autodeclaração que vai regularizar aquilo que foi roubado. É importante também que se diga aqui que, para 95% da demanda por regularização fundiária, nós já temos legislação. O que falta é estrutura para o Incra fazer o processo, inclusive de forma remota, usando os instrumentos que a gente tem hoje”, destacou Tatto.
O autor do projeto, deputado Zé Silva, rebate os argumentos. Segundo ele, a proposta beneficia pequenas e médias propriedades e contém exigências que obrigam os proprietários a preservar o meio ambiente.
“Nosso projeto: primeiro quesito, que traz uma mensagem de seriedade e de segurança, é definindo o marco legal de ocupação em 2008, que é o mesmo marco temporal de ocupação do Código Florestal. O segundo ponto: nós procuramos fazer um recorte, permitindo sensoriamento remoto até 6 módulos fiscais porque, até 6 módulos fiscais, nós estamos contemplando 92% dos que já se inscreveram para se regularizar no Incra.”
Na primeira sessão do Plenário depois do recesso da Câmara prevista para esta terça-feira (3), iniciada a instantes, o PL 2633/2020 da regularização fundiária está sendo votado pelos deputados. No fechamento dessa reportagem, 488 deputados estavam em Plenário, quórum considerado alto.
Quebra de monopólio
O projeto que permite a exploração de todos os serviços postais pela iniciativa privada foi enviado ao Congresso pelo governo. Apesar de a proposta não falar em privatização, é assim que a oposição classifica o PL 591/2021, que na prática quebra o monopólio dos Correios sobre o serviço postal, o que vai permitir a entrada da iniciativa privada em todos os serviços, como entrega de correspondência.
O ministro das Comunicações Fábio Farias fez um pronunciamento em rede de Rádio e TV na segunda-feira (2), resumindo a situação em que se encontra a centenária empresa. Ao fim do resumo, restou claro que devido os passivos que a estatal acumulou, os quase R$ 2 bilhões no balanço operacional do ano passado não são suficientes para mantê-la competitiva.
O governo argumentou também que a mudança no marco legal dos serviços postais é necessária porque os Correios não teriam condições financeiras de melhorar a qualidade dos serviços prestados à população nem condições de enfrentar a concorrência privada, que hoje já pode fazer entregas de encomendas. O governo afirma ainda que não tem capacidade para fazer investimentos na empresa.
Para a oposição, o projeto tem a intenção de beneficiar a iniciativa privada, como disse o líder da Minoria, deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ), quando o regime de urgência foi aprovado em Plenário.
“O real interesse não é melhorar serviços, sofisticar. Não é nada disso. Estão de olho na compra da Internet. Estão de olho numa empresa que chega com qualidade nesses lugares. A privatização vai aumentar o lucro de quem já pode fazer isso. Esse comércio já pode ser feito pela empresa privada. A empresa privada já pode comercializar produtos comprados na Internet. Esse monopólio já foi quebrado. Não vem com discurso de que monopólio atrapalha. Não tem esse monopólio.”
De acordo com a proposta, o governo manteria uma empresa de Correios estatal para continuar explorando o serviço postal universal, como a entrega de cartas e encomendas simples, uma exigência da Constituição. Mas não teria mais o monopólio.
Para o relator da proposta, deputado Gil Cutrim (Republicanos-MA), o projeto não privatiza os Correios, mas garante a manutenção da qualidade dos serviços para a população.
“Fala da regulamentação e modernização do sistema postal brasileiro. Não se trata nem em um só minuto da palavra privatização. Então é bom que fique claro que essa narrativa de privatizar os Correios está muito longe de acontecer antes que aconteça um amplo e pleno debate sobre um tema fundamental. Precisamos de instituições fortes, eficientes, sem interferências políticas, com capacidade de autossustento”, finalizou.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.