Brasília – O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), resolveu partir para o tudo ou nada na sessão desta quarta-feira (5), mesmo aguardando um balanço dos votos de cada bancada em reunião nesta tarde na residência oficial da presidência com líderes partidários.
Paralelamente, o relator do Grupo de Trabalho da Reforma Tributária, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB), entra e sai de reuniões com grupos de resistência ao Projeto de Emenda Constitucional nº 45-C/2019, cujo texto vai à apreciação do Plenário. O texto do substitutivo ao projeto original, o PRLP nº 1 PLEN (Parecer Preliminar de Plenário) é considerado ainda pior do que o atual sistema, dizem prefeitos e governadores – principais resistências à votação do texto nesta semana.
Ribeiro está negociando os últimos ajustes. “Estamos arredondando a questão do conselho federativo, que na minha visão tem de ser o mais técnico possível; funcionar como um repassador automático dos impostos”, disse.
Arthur Lira ainda lembrou que, se a Câmara conseguir aprovar a reforma tributária, ainda caberá aos senadores analisá-la e nada impede que promovam mudanças no texto antes que seja promulgado. “O Senado pode alterar. Se alterar, ele volta para a Câmara,” disse, destacando também que haverá a discussão de leis complementares para regulamentá-la.
O presidente da Câmara afirmou que espera votar o projeto de lei do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) esta semana e que “tanto faz” se o governo decidir retirar ou manter o requerimento de urgência para a matéria: “Ele seguirá na pauta”. A urgência, destacou, só serve para trancar a pauta de votações para outros projetos.
Ele reafirmou que a prioridade é a reforma tributária e não garantiu a aprovação do PL citado antes do recesso. “Espero que, se estiver arredondado o texto do Carf, possa ir à votação ainda esta semana,” afirmou.
Além disso, o arcabouço fiscal já está pacificado, explicou, e os deputados devem decidir apenas sobre as emendas feitas pelo Senado. “Não reuni os líderes ainda para tratar de arcabouço. Ele está numa parametrização de terceiro na linha sucessória, atrás da reforma tributária e da urgência do Carf,” comentou.
Uma fonte do Blog disse reservadamente que: “A reforma tributária é importante, mas na verdade o que realmente é o foco do governo é o PL do Carf e o arcabouço fiscal. Com o Carf entra R$ 50 bilhões e com o arcabouço, teoricamente, mais R$ 150 bilhões”.
Quem também atua fortemente nos bastidores são os lobistas do setor de serviços e do agronegócio que veem na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) o caminho certo para aumento de tributos, direção oposta ao espírito original da reforma: simplificação sem aumento de impostos.
Sabedor que o que não falta são “bodes colocados na sala”, alguns bastantes desagradáveis, o governo correu para abrir o caixa temendo uma derrota quase certa no PL do Carf e um temor inaudito na aprovação do arcabouço fiscal após as modificações dos senadores no texto aprovado inicialmente na Câmara dos Deputados.
Balcão de negócios
O Congresso Nacional virou um grande balcão de negociações desde a segunda-feira (3) entre parlamentares, segmentos produtivos e o governo.
O tendão de Aquiles do Executivo é o projeto que recria o voto de qualidade (voto de minerva pró-governo) do Carf, visto como uma pauta de interesse exclusivo da Fazenda, pelo seu potencial arrecadatório, e que não foi abraçada pelo Legislativo. Logo, a avaliação nos bastidores é de que o governo terá de ceder e liberar verbas caso queira aprovar o texto e destravar a pauta da Câmara – já que o projeto tramita em regime de urgência.
Um parlamentar que vem acompanhando as conversas disse que o que se ouve nos corredores é “f***-se o Carf”, uma vez que o foco é total na reforma tributária e que o arcabouço já está encaminhado. A percepção é de que, se o governo quiser votar o Carf, terá de entrar em campo com força.
Em meio a esse cenário, o governo empenhou R$ 2,1 bilhões em emendas parlamentares apenas nesta primeira semana de julho — valor que se aproxima de todo o montante distribuído aos parlamentares durante o mês de junho (R$ 2,7 bilhões).
A maior parte dessas liberações de julho, porém, está concentrada nas emendas de bancada, que são impositivas, ou seja, têm execução obrigatória. Há um grande interesse dos parlamentares em outro dinheiro: cerca de R$ 9 bilhões em antigas emendas de relator, as quais ficaram “penduradas” do governo anterior, do presidente Jair Bolsonaro (PL), e que vêm sendo pagas a conta gotas, gerando insatisfação.
Além da liberação de verbas aos parlamentares, os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, se reuniram na manhã desta quarta-feira (3), com membros da bancada ruralista para negociar apoio ao projeto do Carf. A moeda de troca, segundo fontes, foi o Plano Safra. Um dos interlocutores a par das conversas afirma que um dos pedidos na mesa foi uma cifra adicional de R$ 2 bilhões para a subvenção ao seguro rural.
O encontro foi realizado no ministério da Fazenda e contou com a presença, dentre outros parlamentares, dos deputados Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agricultura (FPA), Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), vice-presidente da FPA, e Fábio Garcia (União-MT), coordenador de política do grupo.
Essas negociações ainda se somam aos acertos finais em torno da reforma tributária, que pode começar a ser discutida no plenário da Câmara ainda nesta quarta-feira. Isso porque há um entendimento interno na Câmara de que a urgência do texto do Carf, que está trancando a pauta, não trava a votação de uma PEC, que é o caso da reforma.
Em Brasília desde terça-feira (4), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, se reuniu com Haddad nesta manhã e pediu alterações na governança do Conselho Federativo, que será o órgão responsável por unificar e distribuir a arrecadação a estados e municípios no novo sistema proposto pela reforma tributária. O objetivo é garantir que aqueles com mais população tenham participação proporcional ao seu peso dentro da federação.
Já o governador do Amazonas, Wilson Lima, e a bancada do estado no Congresso apresentaram ao ministro da Fazenda o pedido de criação de um fundo exclusivo, que seria abastecido com verbas federais e compensaria o fim dos subsídios da Zona Franca de Manaus, que seriam mantidos até 2073.
Enquanto isso, o texto do arcabouço fiscal fica em banho-maria, aguardando uma solução para o impasse do Carf. O relator do texto, deputado Claudio Cajado (PP-BA), já manifestou o seu desejo de retomar a versão votada pela Câmara, revertendo as mudanças feitas pelo Senado, as quais liberam R$ 73 bilhões em gastos fora do novo teto.
Cajado disse, porém, que vai submeter a decisão aos líderes e ao presidente da Casa, Arthur Lira, e afirmou que não fará um “cavalo de batalha” em relação a isso.
Nos bastidores, o relator afirmou a colegas que se sente magoado e traído pelo Senado, que saiu como bonzinho, afrouxando a regra fiscal, enquanto ele e a Câmara ficaram como os vilões. A irritação também se estende ao governo, que não estaria se empenhando para reverter as mudanças feitas pelos senadores.
Por Val-André Mutran – de Brasília