Brasília – Nesta terça-feira (29), ao participar de debate virtual com a Coalizão Direito na Rede, que reúne cerca de 40 instituições acadêmicas e da sociedade civil, o relator do Projeto de Lei 2630/20, das fake news, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), defendeu alterações que estão sendo feitas na redação do texto aprovado pelo Senado no fim de junho. Um dos pontos polêmicos é o novo tipo penal para punir, com cinco anos de reclusão e multa, o disparo em massa de notícias falsas. O deputado explicou o alcance da punição.
“Alguém me perguntou: ‘por que o serviço de mensagens está na linha de tiro? E as outras plataformas?’ Vejam, existe uma realidade de desinformação subterrânea que é típica dos serviços de mensagem. O texto literalmente, nos termos em que está proposto, fala de “uso de conta automatizada ou meios e expedientes não fornecidos pelas plataformas’. Não se trata aqui da tia do Whatsapp, que vai utilizar o mecanismo disponível pela plataforma. Aqui se trata de milícias digitais,” adicionou ao explicar a alteração para tipificar o considerado crime virtual com propagação de notícias falsas.
Alguns debatedores avaliam que a forma e o tamanho da punição só deveriam ser propostos após a conclusão de inquéritos no Supremo Tribunal Federal e da investigação da CPMI das Fake News. A coordenadora de privacidade e vigilância do InternetLab, Nathalie Fragoso, sugeriu ajustes no texto.
“Tem algumas terminologias que não estão definidas na lei em que esse tipo está sendo inserido ou que podem dar margem a interpretações amplas, que aumentam o número de condutas que podem ser reunidas aqui. Afinal de contas, a gente está falando de um delito de perigo abstrato. Então, considerando que há antecipação do poder penal, é importante que os termos do artigo sejam definidos da maneira mais estrita possível,” defendeu.
“O que nos interessa são as organizações criminosas. O debate público vai nos oferecer a possibilidade de fazer os ajustes necessários para não termos tipos penais abertos, insuficientes e que ofereçam riscos à sociedade,” garantiu o relator.
Orlando Silva ainda admite aperfeiçoamentos nesse item da proposta, mas os debatedores questionaram o relator quanto ao que significam e quais os riscos para a sociedade nas novas propostas para o PL, sobre publicidade digital, remuneração para empresas jornalísticas e regulação das plataformas.
O deputado também esclareceu o conceito de autorregulação regulada, prevista como forma de se garantir transparência e responsabilidade no uso da internet. Segundo ele, a proposta vai além da regulação do Estado e de experiências como a do Conar, o Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária.
“A discussão que estamos fazendo é a possibilidade de construção um outro modelo. Se é autorregulação, é regulação pelas plataformas. Mas, por que não é uma mera autorregulação, tal qual é o Conar? Porque há que se ter os princípios, os conceitos, os parâmetros e os procedimentos fixados em lei. Por isso, é uma autorregulação regulada pelo que a lei estabelece,” explicou.
Coordenadora da Coalizão Direito na Rede, Bia Barbosa citou os três principais avanços no substitutivo que Orlando Silva apresentou ao projeto de lei contra as fake news.
“A remoção do mecanismo de rastreabilidade: o relator faz a proposta de alterar a maneira como a questão da identificação das mensagens é feita no Whatsapp. A gente acha que foi um avanço o novo texto incluir a proibição da monetização de canais – principalmente em redes, como o Youtube – por políticos, parlamentares e detentores de cargos eletivos. E também foi um avanço a redução dos mecanismos de identificação, que, na nossa avaliação, gerava uma identificação massiva”.
No entanto, os participantes querem aprofundar o debate em torno de outros temas. A coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, Renata Mielli, criticou os artigos que preveem remuneração de empresas jornalísticas pelo conteúdo utilizado nos provedores de internet. O fórum vê risco de maior precarização da atividade dos jornalistas, agravada pela recente reforma trabalhista.
Marina Pitta, do Coletivo Intervozes, alertou para a futura lei não tentar aplicar no meio digital regras concebidas para os veículos tradicionais de massa. O deputado Orlando Silva disse que a referência aos jornalistas no texto se deve à necessidade de valorizar a informação de qualidade, apurada com compromisso ético. Durante o debate, o relator não se comprometeu com data para a votação do chamado “projeto das Fake News” na Câmara.
Por Val-André Mutran – de Brasília