Após o juramento e posse de 513 deputados federais na Câmara dos Deputados e no Senado Federal e dando prosseguimento ao que prevê Regimento Interno das duas Casas, passou-se à eleição da presidência e demais membros da Mesa e composição das Comissões. O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) foi reeleito com 334 votos, para mais dois anos à frente da Casa. Com uma plataforma reformista alinhada com as pretensões do presidente Jair Bolsonaro (PSL), cujo partido anunciou apoio formal à reeleição, Maia superou outros seis candidatos, entre eles Marcelo Freixo (PSOL-RJ), seu adversário local e um dos líderes da oposição no Congresso.
Enquanto os trabalhos na Câmara transcorreram dentro da normalidade, uma confusão sem precedentes envergonhou os eleitores de todo o Brasil, protagonizada pelo Senado Federal, que patrocinou cenas deploráveis de xingamentos e ofensas pessoais transmitidas ao vivo pelas redes de TV e pela Internet.
O alvo dos ataques foi o senador David Alcolumbre (DEM/AP), pré- candidato à presidência e único remanescente da Mesa da legislatura passada, portanto, legitimado, de acordo com o Regimento Interno do Senado, a presidir as duas sessões preparatórias da eleição da Mesa.
Na Câmara
Sucessor de Eduardo Cunha (MDB/RJ) preso pela Operação Lava-Jato, o deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ) chega ao novo mandato com o apoio de bancadas como MDB (34 representantes), PSDB (29), DEM (29), PP (38) e PSL (52), que só perde para o PT em número de deputados eleitos (54).
Os demais componentes da Mesa Diretora são os seguintes: na primeira-vice-presidência Marcos Pereira (PRB-SP), com 398 votos; já na segunda-vice-presidência haverá segundo turno, pois não houve maioria de votos entre os dois candidatos – Luciano Bivar (PSL-PE) obteve 240 votos, enquanto Charlles Evangelista (PSL-MG), candidato avulso, alcançou 161 votos.
A primeira-secretaria será exercida pela deputada Soraya Santos (PR-RJ), que chegou a 315 votos na condição de candidata avulsa. Candidato oficial do bloco, o deputado Giacobo (PR-PR) obteve 183 votos.
Já o deputado Mário Heringer (PDT-MG) comandará a segunda-secretaria depois de receber 408 votos, enquanto a terceira-secretaria será comandada pelo deputado Fábio Faria (PSD-RN), que alcançou 416 votos. Por fim, a quarta-secretaria será conduzida pelo deputado André Fufuca (PP-MA), que teve 408 votos.
Reformas e modernização
Em seu discurso de plenário, Maia defendeu uma reforma do Estado com o objetivo de modernizar o país. Diante de uma maioria de aliados, ele disse que, transcorridos 30 anos desde a redemocratização, o Brasil foi “capturado por interesses de corporações públicas e privadas” que comprometeram suas contas públicas e o deixaram sem força de investimento.
“De cada R$ 100,00 do nosso orçamento, R$ 94,00 são de despesas obrigatórias que não podemos cortar. Se organizarmos a despesa, vamos enfrentar essa extrema pobreza vergonhosa e garantir recursos para saúde, educação e para a segurança pública”, discursou o parlamentar fluminense, defendendo o diálogo entre adversários políticos como forma de resolução dos problemas brasileiros.
No Senado
Após uma confusão generalizada, ao longo da tarde e início da noite de sexta-feira (1º), o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) suspendeu a sessão que deve definir o novo presidente do Senado, após mais de sete horas de discussões e hostilidades. Os trabalhos foram retomados neste sábado (2) às 11h.
À frente da sessão, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), um dos candidatos ao comando da Casa, acatou as sugestões dos colegas para interromper as discussões devido a um impasse sobre a forma de votação – aberta ou secreta. O congressista abriu a questão para o plenário e o painel apontou 50 votos a 2 pela votação aberta, mas o resultado não foi aceito pelos senadores contrários, especialmente os aliados de Renan Calheiros (MDB-AL).
O grupo de senadores que apoiam a candidatura de Calheiros ficou revoltado e começou uma sessão de xingamentos, ofensas pessoais e quase Calheiros e o senador Tasso Jereissati (PSDB/CE) vão às vias de fato, o que só não ocorreu porque foram contidos pelos seus pares.
A origem da confusão
Suplente da Mesa Diretora na última legislatura, Alcolumbre assumiu a sessão porque nenhum dos antigos membros titulares conseguiu reeleição. Os opositores dele questionaram o fato de o senador do DEM conduzir os trabalhos na condição de candidato, o que ele se recusou a assumir oficialmente.
A senadora Kátia Abreu (PDT-TO) roubou a cena ao protestar contra Alcolumbre. A tocantinense chamou o colega de “usurpador”, subiu na bancada e arrancou, das mãos do senador amapaense. uma pasta contendo os papéis referentes à sessão, obstruindo os trabalhos.
Ela e Renan invadiram a mesa presidida por Alcolumbre. “O senhor não é candidato, não pode sentar aqui, não vai. O senhor é candidato e não pode sentar aqui. O senhor não pode fazer isso. Não vai. Se você pode presidir, eu também posso. O senhor está usurpando o poder”, acusou Kátia, totalmente possessa.
Alcolumbre pediu, então “um minuto de sanidade” a Kátia. Já Renan chamou Alcolumbre de “canalha” e quase trocou agressões com o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que retirou a própria candidatura durante a tarde para apoiar Alcolumbre.
Jereissati (PSDB-CE) desistiu de se candidatar à Presidência do Senado. Ele anunciou a decisão antes da sessão de posse, a poucas horas da eleição, marcada para as 18h. Os tucanos estudam apoiar a candidatura de Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Sem entrar em detalhes, o senador disse que está havendo “falta de escrúpulo” e de “respeito pela instituição” na disputa pelo comando do Senado. A declaração foi interpretada como uma crítica a Renan Calheiros (MDB-AL), que articula para assumir a Presidência da Casa pela quinta vez.
Intervenção do STF
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, anulou na madrugada deste sábado (2) a decisão tomada pelo plenário do Senado na noite de sexta-feira (1º) de abrir a votação para a escolha do novo presidente da Casa e determinou que a escolha se dê com voto secreto.
Ele também afastou o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), que presidiu os trabalhos ontem, do comando da sessão marcada para começar às 11h e hoje.
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, classificou como “verdadeira manobra casuística” a abertura da votação, decidida pela maioria do plenário, para a presidência do Senado. No despacho que anulou a decisão de ontem e determinou que a eleição se dê por voto secreto, Toffoli diz que houve violação das regras regimentais, de pressupostos constitucionais e dos “princípios republicanos, da igualdade, da impessoalidade e moralidade”.
Segundo ele, foram várias as irregularidades cometidas na sessão presidida pelo senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), que conduziu os trabalhos na condição de único remanescente da Mesa Diretora em meio de mandato. Ele ordenou que Alcolumbre, que postula o comando da Casa, ceda a cadeira da presidência na sessão marcada para as 11h deste sábado ao senador mais idoso, José Maranhão (MDB-PB), um aliado de Renan Calheiros (MDB-AL), também candidato a presidente e principal interessado no sigilo da votação.
De acordo com o ministro, que atendeu às 3h45 da madrugada o pedido do MDB e do Solidariedade, o regimento interno do Senado é taxativo ao determinar que a votação para a eleição da Mesa Diretora seja secreta. O presidente do STF argumenta que o voto secreto, nesses casos, é comum também em outros países e que o objetivo da medida é preservar a independência entre os poderes e impedir que o Executivo exerça pressão sobre os parlamentares na escolha do presidente da Casa.
Desespero de Renan
“Embora a Constituição tenha sido silente sobre a publicidade da votação para formação da Mesa Diretora (art. 57, § 4º), o regimento interno do Senado Federal dispôs no sentido da eleição sob voto fechado”, afirma o ministro. “Importa ressaltar a finalidade política que subjaz à previsão de voto secreto na hipótese dos autos: proteger a mesa diretiva e a escolha dos dirigentes da Casa Legislativa de eventual influência do Poder Executivo. Ou seja, a necessidade de que os Poderes funcionem de forma independente”, ressaltou.
No entendimento do ministro, a necessidade de independência se sobrepõe, nesse caso, à necessidade de transparência da atuação do parlamentar. “De fato, conquanto se possa abordar a necessidade de transparência da atuação do parlamentar frente a seus eleitores, de outro lado não se pode descurar da necessária independência de atuação do Poder Legislativo face aos demais Poderes, em especial – pela relação de complementariedade dos trabalhos – face ao Poder Executivo.
Renan seria o maior prejudicado com o voto aberto, na avaliação de aliados e adversários. Toffoli sustenta ainda que a chamada reunião preparatória, como é chamada a sessão para escolha do novo presidente do Senado, é “imprópria” para qualquer alteração regimental porque o ano legislativo começa, oficialmente, apenas neste sábado (2).
“Logo, em reuniões preparatórias não há campo jurídico-legislativo para iniciativas tendentes à alteração do regimento interno da Câmara Alta, ato de chapada inconstitucionalidade, uma vez que sua finalidade é exclusivamente a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, frente ao que preconiza do art. 57 da Lei Maior”, assinalou o ministro.
“Mas não é só!”, destaca o presidente do Supremo em seu despacho. Ele afirma que Alcolumbre desrespeitou decisão proferida por ele, em janeiro, rejeitando pedido do senador Lasier Martins (PSD-RS) para que a corte garantisse o voto aberto na eleição do Senado. Por isso, sustenta, o senador do DEM não poderia submeter a abertura ou não da votação ao plenário.
“Ainda que a questão de ordem, sobre a forma de votação da eleição da mesa diretora, fosse proposta após iniciado o ano legislativo, considerando o escore apurado da votação, o resultado inegavelmente não seria outro senão o da manutenção da regra regimental, no tocante ao escrutínio secreto (art. 60 do RISF)”, alegou.
Senador mais idoso, com 85 anos, José Maranhão foi designado por Toffoli para presidir a sessão deste sábado. Foto: Agência Senado
Segundo ele, o regimento interno só permite que acordos de lideranças ou decisão do plenário se sobreponham às suas regras se houver o consentimento de todos os senadores presentes, em votação nominal, o que não ocorreu ontem. O plenário aprovou a abertura da votação por 50 votos a 2. Cerca de 30 senadores presentes não votaram.
Conflito de interesses
Por fim, Toffoli reprovou a condução da sessão de ontem por Alcolumbre, “não obstante ser de conhecimento geral e fato público e notório, que ele é candidato à Presidência do Senado Federal, ainda que formalmente não tivesse inscrito”. O ministro ressaltou que o próprio senador do DEM admitiu que será indicado formalmente pelo partido para a disputa da presidência da Casa em entrevista concedida às 22h47 de sexta à Globonews.
Nas palavras do ministro, além de afrontar norma regimental por caracterizar conflito de interesses, a condução dos trabalhos por um candidato fere os princípios republicanos, da igualdade, da impessoalidade e da moralidade.
“Assim, a conclusão lógica a que se chega é de que, por imperativo constitucional e regimental, candidato declarado à Presidência do Senado, como na espécie, não pode presidir reunião preparatória, já que interesses particulares não devem se sobrepor às finalidades republicanas das reuniões preparatórias. Há inegavelmente verdadeiro conflito de interesses”, assinalou.
Temperatura máxima
Toffoli diz que teve de tomar uma decisão rápida – o pedido foi apresentado pelo MDB e pelo Solidariedade por volta da meia-noite e seu despacho foi assinado às 3h45 – porque a situação assim exigia. “Esse impasse exige imediata solução tendo em vista a necessidade de que o ano legislativo se inicie na segunda-feira próxima, como determina a Constituição”, afirmou.
“Comunique-se, com urgência, por meio expedito, o senador da República José Maranhão, que, conforme anunciado publicamente, presidirá os trabalhos na sessão marcada para amanhã [este sábado].”
Na prática, a decisão de Toffoli torna ainda mais explosiva a sessão deste sábado, convocada após mais de cinco horas de discussões em plenário, com bate-bocas, ameaça de agressão física, invasão da mesa da presidência e até “sequestro” de uma pasta utilizada por Alcolumbre pela senadora Kátia Abreu (PDT-TO), defensora do voto secreto e aliada de Renan. O assunto esquentará a reunião convocada pelo grupo de senadores autodeclarados independentes, que atuaram em conjunto ontem, para as 10h deste sábado no gabinete do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).