Brasília – Indicada pelo ex-presidente da Bolívia Evo Morales, onde exerceu o cargo de Ministra do Meio Ambiente e Água, durante o período de 2015 a 2017 em seu governo, a Secretária-Geral da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), María Alexandra Moreira López e toda a sua diretoria, permanecem no cargo irregularmente mesmo após o fim de seu mandato, eleito para o triênio de 2019 a 2021, encerrado no dia 31 de dezembro de 2021.
No rodízio acordado entre os países membros estabelecido em estatuto, fontes consultadas pela reportagem ligadas a diplomacia, explicaram reservadamente que nunca viram nada parecido.
A OTCA é uma organização intergovernamental constituída por oito Países Membros: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, cujo estatuto estabelece o rodízio em seu comando em mandatos de três anos e nunca houve recondução ao cargo.
Criada em 03 de julho de 1978, portanto há 44 anos, após a assinatura do tratado entre os países membros, cujo objetivo é o de promover o desenvolvimento harmônico dos territórios amazônicos, o Brasil, não se sabe a razão objetiva, nunca indicou um nome para assumir a Secretaria-Geral da OTCA.
Aparentemente, a falta de interesse diplomático para assumir o comando do organismo multilateral teve uma mudança radical em 2021, que coincide com a nova linha adotada na política de relações exteriores no 3º ano da gestão do Presidente da República Jair Bolsonaro (PL), redesenhada pelo chanceler Ernesto Araújo.
Guinada
O governo Bolsonaro, desde o início de sua gestão foi alvo de ataques interno e externos devido a adoção dessa nova concepção diplomática, que discutiu as bases do acordo que criou o Fundo Amazônia, os resultados efetivos ao país com as ações da OTCA, e sua política de fronteiras, quando foi fortalecido o Programa Acolhimento, no Norte do país, para receber os refugiados de regimes ditatoriais da região, principalmente o da Venezuela, de Nicolás Maduro.
O que se viu no período foi uma forte pressão internacional, o Vice-Presidente general Hamilton Mourão, assumiu o Conselho Nacional da Amazônia Legal, ocasião na qual ONGs com interesses distintos à nova política, intensificaram gestões sobre organismos como a OTCA e campanhas internacionais que acusaram o governo federal de ser conivente e fazer vista grossa para o desmatamento, exploração ilegal de recursos naturais como madeiras nobres, mineração e garimpagem ilegal em áreas protegidas e reservas indígenas da Amazônia.
O que se viu despois disso foi a queda do chanceler Ernesto Araújo, a destituição do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e um retorno a antiga política diplomática dos governos esquerdistas que governaram o Brasil nos últimos 15 anos, antes do impeachment da presidente Dilma Rousseff.
A sucessão na OTCA é tratada, estranhamente, por um departamento do Itamaraty, quando sempre foi assunto de primeira linha, sob responsabilidade do Gabinete da Chancelaria ou da Diretoria de Relações Internacionais.
Paralelamente a esses fatos, assume como novo chanceler o embaixador Carlos França, que mudou quase todo o corpo diplomático do Ministério das Relações Exteriores quando assumiu e não se sabe qual a razão de não existir diálogo com lideranças da região amazônica brasileira.
Indicação
No ano passado, um forte movimento a partir do estado do Amazonas, seguido de grande adesão de lideranças dos demais estados que compõem a Amazônia Legal, solicitaram ao Ministério das Relações Exteriores que avaliasse indicar o amazonense Belisário Arce para o cargo de Secretário-Geral da OTCA. Nunca, os líderes da região o haviam feito.
O pedido fora avalizado com o apoio de entidades de classe empresarial de todos os estados da Amazônia brasileira, quinze senadores da República, dezenas de deputados federais, além de generais e outras altas autoridades. Mais de sessenta cartas de apoio à referida eventual candidatura foram enviadas ao Presidente da República e ao Ministro de Estado das Relações Exteriores. O chanceler, de modo sequer respondeu.
A reportagem teve acesso a uma Nota de Repúdio, subscrita pela direção da Associação PanAmazônia, que reúne dirigentes de algumas das maiores empresas e empregadoras da Amazônia que juntas, superam faturamento de centenas de bilhões. Leia abaixo a íntegra do documento.
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“Custa entender o que leva o Itamaraty a agir de modo tão obscuro e desorientado. É incompreensível e inaceitável o acinte com o qual a Chancelaria brasileira trata os amazônidas, afastando completamente a sociedade regional da participação no Organismo, o que é antidemocrático e ilegítimo. Deve-se atentar também sobre a ilegalidade da permanência dos dirigentes atuais da OTCA, cujos mandatos expiraram em 31 de dezembro de 2021”, diz trecho da nota.
Muito estranho
O Itamaraty se recusa a falar sobre o assunto, entretanto, documento obtido pela reportagem revela, num despacho datado do dia 11 de janeiro desse ano, cujo cabeçalho está grafado a palavra “Urgente”, o Ministério das Relações Exteriores se dirige à Secretaria Permanente da OTCA e “entende que a manutenção da atual é absolutamente necessária a fim de garantir a continuidade das atividades e projetos desenvolvidos pela OTCA e evitar situação de acefalia na condução da Organização”.
O documento deixa claro que está decidido que apoiará a recondução da afilhada de Evo Morales e a diretoria que escolher, permanecerá a frente da OTCA. Com que aval? O do presidente Jair Bolsonaro? Do Vice-Presidente Hamilton Mourão? Ou é o chanceler que decide quem tem ou não competência para dirigir o organismo?
O documento encerra com um verniz típico da diplomacia. “Nesse contexto, solicita à Secretaria Permanente a gentileza de consultar os demais países membros sobre a permanência da atual diretoria até que seja alcançada definição sobre o encaminhamento do processo sucessório”. Ou seja, O Itamaraty faz de conta que não está fazendo campanha pela afilhada de Evo Morales para a recondução ao cargo. Leia abaixo a íntegra do documento.
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Quem é a alta funcionária da reportagem publicada na Bolívia?
Circula em toda a região e até em países membros da OTCA, com peso de escândalo, reportagem publicada na imprensa boliviana acusando o presidente Jair Bolsonaro de ter apoiado o suposto golpe que derrubou o presidente Evo Moralez.
A reportagem publica graves acusações contra o presidente brasileiro. Diz que Jair Bolsonaro reconheceu ter se encontrado com a ex-presidente boliviana Jeanine Añez, que assumiu o comando do país após a fugo de Morales para o México, “confirmando as suspeitas sobre o apoio brasileiro ao golpe que derrubou o presidente Evo Morales”.
O texto prossegue especulando que o “possível encontro pode ser a ponta de uma meada onde conspirações, fugas clandestinas, fuga de ministros e talvez entrega de armas se enredem. Em um ato aparentemente involuntário, o capitão e presidente afirmou: ‘A ex-presidente da Bolívia, Jeanine… Eu estive com ela uma vez, ela é uma pessoa legal que está na prisão’. Para depois acrescentar, com raiva, ‘você sabe qual é a acusação contra ela? (ter cometido) atos antidemocráticos’. Como até o momento não há notícias de nenhuma cúpula oficial entre os dois, essa conversa ocorreu secretamente.
A reportagem diz que: “Segundo essa declaração, para Bolsonaro, atacar instituições é algo que não deve ser punido com a prisão da ex-presidente, que permanece detida em um presídio em La Paz, onde se prepara para enfrentar um novo julgamento. O que Bolsonaro não disse é quando e onde ocorreu o encontro com a mulher que governou de fato entre novembro de 2019 e dezembro de 2020, quando o presidente Luis Arce tomou posse. Nesse período de pouco mais de um ano, o avião presidencial boliviano, que só pode decolar com autorização do chefe de Estado ou com ele a bordo, voou com frequência e clandestinidade para o Brasil.”
Jeanine Añez vai a julgamento nos próximos dias e será acusada de traição pelo STF da Bolívia.
Mas, quem é a personagem fonte da reportagem do jornal Página 12?
Identificada como uma ex-alto funcionária de Morales e diplomata que atualmente trabalha fora de seu país no Brasil, analisou, em diálogo com a condição de anonimato, a conexão Brasília-La Paz e os elementos que ela pode contribuir para o iminente novo julgamento. “Acredito que a declaração do presidente Bolsonaro é importante para este julgamento porque é mais uma prova de que o governo de Evo Morales foi atacado por uma organização internacional, isso significa que foi dada ajuda do exterior para um golpe de estado.” Devemos esperar a evolução deste julgamento oral, propõe o ex-funcionário, mas “se Añez aceitar que houve essa reunião, ela terá que explicar por que não a denunciou”.
“A senhora Añez está sendo investigada por não ter chegado ao poder constitucionalmente, usando o caminho da violência. O povo boliviano quer que ela seja investigada pelas mortes ocorridas para que ela chegue ao poder”, continuou a diplomata fonte da matéria.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.