A articulação política do governo conseguiu, por duas vezes, o adiamento da primeira sessão conjunta do ano do Congresso Nacional. O esforço é justificado porque a pauta é francamente negativa à agenda política do Palácio do Planalto, que em cálculos preliminares dá como certa o risco de derrotas em séries nesta quinta-feira (9).
Deputados federais e senadores analisarão vetos presidenciais que estão trancando a pauta do Legislativo Federal. A tendência é que o Palácio do Planalto sofra diversas derrotas nas votações previstas para hoje. Um dos poucos acordos avançados entre o Poder Executivo e o Legislativo está nos vetos no orçamento, que ainda assim o governo precisou ceder em parte ao Congresso.
Por conta da ausência da sessão com senadores e deputados — nenhuma foi realizada ainda em 2024 —, outros temas também considerados importantes pelos parlamentares estão indefinidos, como mudanças na lei dos agrotóxicos, vetos nas leis orgânicas dos Policiais Militares e Civis, na lei geral do esporte, na regulamentação das apostas esportivas e na previsão de reserva de, no mínimo, 30% de recursos a programas de moradia, como o Minha Casa Minha Vida, para cidades com até 50 mil.
A sessão também deverá analisar dois projetos para mitigar os efeitos das enchentes no Rio Grande do Sul. Um dos textos retira as burocracias que existem quando um parlamentar quer mudar o direcionamento das emendas de seu estado para outro. Dessa forma, bastará o deputado ou senador enviar autorização para o remanejamento ao governo. A outra passa as emendas parlamentares direcionadas ao Rio Grande do Sul à frente na fila de pagamentos de todas as emendas. Os dois projetos foram aprovados pela Comissão Mista de Orçamento (CMO) na quarta-feira (8).
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou R$ 5,6 bilhões das emendas de comissão. A ideia agora é que o veto seja mantido parcialmente e que o governo recupere R$ 3,6 bilhões para os parlamentares, com a divisão sendo de dois terços para a Câmara e um terço para o Senado.
Ao todo, o Congresso havia aprovado a destinação de R$ 16,7 bilhões para emendas de comissão neste ano. Com o veto de Lula a parte dos recursos, o montante passou para R$ 11,3 bilhões, ainda assim acima dos R$ 6,8 bilhões de 2023. Esse tipo de emenda não tem o pagamento obrigatório, mas foi incrementado após o fim do orçamento secreto e passou a servir de moeda política para congressistas negociarem apoio ao Planalto.
Para viabilizar o acordo que retoma R$ 3,6 bilhões, o governo articulou a aprovação de um projeto de lei que antecipa R$ 15,7 bilhões em despesas neste ano. O dispositivo foi incluído no projeto de lei que recria o seguro DPVAT (Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres), que foi aprovado ontem (quarta-feira, 8), com o limite de votos necessários, levando um alívio para o governo, mas preocupação para todo o sistema financeiro nacional, uma vez que fragilizou ainda mais, o duvidoso Arcabouço Fiscal (Lei Complementar n° 200, de 2023) criado neste governo pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Apesar de a base do governo ter sido bem sucedida ao conseguir aprovar o texto no Plenário do Senado na quarta-feira, a iniciativa passou com uma margem bastante apertada. O número de votos favoráveis foi 41, justamente o mínimo necessário para a iniciativa ser enviada para a sanção.
Parlamentares da base do governo também avaliam que há maioria para manter o veto no calendário de liberação de emendas, que estabelece um cronograma definido até o dia 30 de junho, visto que esse ano é de eleições municipais e os parlamentares querem garantir os repasses. Como forma de convencer os deputados e senadores a manter o veto, o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que irá liberar as emendas no primeiro semestre mesmo sem um calendário definido, o que desagrada 9 de cada 10 congressistas.
Por isso, o acordo em relação às emendas de comissão tem sido tratado como prioridade por articuladores políticos do Planalto, como uma espécie de “contenção de danos” para evitar uma derrota maior, num espaço fiscal já esticado ao limite. Neste caso, a negociação é para preservar algumas das decisões do presidente.
De acordo com o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP), há uma tentativa de adiar alguns dos vetos, como os feitos, ainda no governo de Jair Bolsonaro, na cobrança de bagagens em viagens aéreas e a lei geral de esporte, sancionada por Lula ano passado, com alguns vetos parciais.
Vetos polêmicos que serão analisados e podem impor derrota ao governo
• “Saidinhas”: Lula vetou o ponto central do projeto alegando que proibir presos de saírem da cadeia para visitar a família contraria a Constituição, fere o princípio da dignidade humana e está em desacordo com convenções internacionais.
• Lei das PMs: Foram vetados 28 trechos da Lei Orgânica das Polícias Militares por gerar encargos financeiros à União e aos estados sem a previsão orçamentária, como pensão para o cônjuge ou dependente quando o militar for preso.
• Ações de moradia: A previsão de reserva de, no mínimo, 30% de recursos a programas de moradia, como o Minha Casa Minha Vida, para cidades com até 50 mil habitantes foi vetado. Parlamentares têm interesse na derrubada por ser ano eleitoral.
• Uso de agrotóxicos: Lula descartou da lei de uso de agrotóxicos o trecho que centralizava no Ministério da Agricultura a coordenação de reanálises de riscos e alterações nos produtos já registrados e excluía a Anvisa e o Ibama da ação.
• Emendas e calendário: O presidente vetou R$ 5,6 bilhões de emendas de comissão não obrigatórias e barrou o dispositivo que torna obrigatório o empenho das emendas parlamentares obrigatórias até o dia 30 de junho.
• Lei Geral do Esporte: Há vetos como o que barrou a criação da Autoridade Nacional para Prevenção e Combate à Violência e à Discriminação no Esporte. O veto foi decidido pela Casa Civil, por questões jurídicas.
• Taxação das ‘bets’: O trecho prevendo que prêmios de até R$ 2.112 ficariam livres de tributação foi barrado. O veto foi recomendado pelo Ministério da Fazenda sob alegação de “isonomia tributária”.
• Vítimas de barragens: A lei que institui a política nacional de direitos das populações atingidas por barragens foi sancionada por Lula com vetos aos trechos que garantiam a aplicação das regras a casos já ocorridos.
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.
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