Por uma larga margem de votos, 62 a favor, 2 contra, e uma abstenção, o Projeto de Lei (PL n° 2.253/2022) que restringe o benefício da saída temporária para presos condenados foi aprovado na sessão de terça-feira (20), no Plenário do Senado Federal. Devido as modificações no texto, a matéria volta ao exame e votação final dos deputados federais. A matéria tramitou durante onze anos até entrar em fase final de votação.
O projeto foi relatado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e previa a revogação total do benefício, mas foi alterado para permitir as saídas de presos que estudam, em emenda apresentada pelo senador Sergio Moro (União-PR). Na prática, o texto extingue a liberação temporária de presos em datas comemorativas e feriados, que tem sido chamada popularmente de “saidinha”.
O autor do projeto foi o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) e o texto que foi aprovado na Câmara revogava dispositivos da Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1984) que tratavam das saídas temporárias. Pela legislação em vigor, o benefício vale para condenados que cumprem pena em regime semiaberto. Atualmente eles podem sair até cinco vezes ao ano, sem vigilância direta, para visitar a família, estudar fora da cadeia ou participar de atividades que contribuam para a ressocialização.
O texto foi aprovado com mudanças pelo Senado. Uma das emendas aceitas, do senador Sergio Moro (União-PR), reverte a revogação total do benefício. Pelo texto aprovado, as saídas temporárias ainda serão permitidas, mas apenas para presos inscritos em cursos profissionalizantes ou nos ensinos médio e superior e somente pelo tempo necessário para essas atividades. As outras justificativas atualmente aceitas para as saídas temporárias — visita à família e participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social — deixam de existir na lei.
“O projeto acaba com as saídas temporárias em feriados, o que é diferente da autorização para o preso estudar ou trabalhar fora do presídio quando em regime semiaberto ou em regime aberto. (…) Por ter total pertinência, obviamente, nós resgatamos esse instituto, que, de fato, contribui para a ressocialização dos presos, que é a possibilidade de estudarem, de fazerem um curso profissionalizante”, explicou o relator, Flávio Bolsonaro, que disse considerar a solução apresentada por Moro a mais adequada.
Mesmo para os presos com autorização de saída para estudar, a emenda também amplia restrições já contidas na lei. Atualmente, não podem usufruir do benefício presos que cumprem pena por praticar crime hediondo com resultado morte. O novo texto estende a restrição para presos que cumprem pena por crime hediondo ou com violência ou grave ameaça contra pessoa.
“Então, estamos preservando, sim, aquilo que é realmente relevante para o preso do semiaberto, que é a saída para a educação e para o trabalho. Ainda assim, colocamos uma cláusula de segurança, uma norma de segurança estabelecendo que, mesmo para essas atividades, não tem o direito à saída temporária aquele que foi condenado por crime hediondo e por crime praticado com violência ou com grave ameaça contra a pessoa. Temos que ter salvaguardas para proteger a população, para proteger os outros indivíduos”, explicou Moro.
Durante a discussão, senadores pediram ao líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA) que intercedesse junto ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para que o texto não fosse vetado. O líder lembrou que o texto ainda voltará para a Câmara e negou que haja posição formada no governo para vetar o texto.
Mudança homenageia militar morto recentemente
O texto também foi modificado para incluir a determinação de que, caso sancionada, a lei seja denominada “Lei PM Sargento Dias”. Esse trecho foi incluído pelo relator em homenagem ao sargento Roger Dias da Cunha, da Polícia Militar de Minas Gerais. Ele foi baleado na cabeça no dia 5 de janeiro, após uma abordagem a dois suspeitos pelo furto de um veículo em Belo Horizonte. O autor dos disparos era um beneficiado pela saída temporária que deveria ter voltado à penitenciária em 23 de dezembro e era considerado foragido da Justiça.
“Foi liberado e matou um policial, um jovem a serviço da sociedade. Uma sociedade tão estranha que faz um concurso público, seleciona os nossos melhores jovens, coloca numa academia de polícia, dá a eles uma arma e uma carteira e os joga numa selva desprotegida. Nós condenamos os policiais todos os dias, não damos a eles o apoio necessário”, afirmou o senador Carlos Viana (Podemos-MG).
Novas regras aprovadas pelos senadores
Além da restrição das saídas temporárias, o projeto trata de outros temas. Um deles é a necessidade de exame criminológico para a progressão de regime de condenados. De acordo com o texto, um apenado só terá direito ao benefício se “ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento e pelos resultados do exame criminológico”. O teste deve avaliar, por exemplo, se o preso é capaz de se ajustar ao novo regime “com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade”. Esse dispositivo é utilizado nas leis dos Estados Unidos.
“A exigência de realização de exame criminológico para progressão de regime é admitida pelos nossos tribunais superiores, desde que por decisão fundamentada. Sobre o assunto, há a Súmula Vinculante nº 26, do STF [Supremo Tribunal Federal], e a Súmula 439, do STJ [Superior Tribunal de Justiça]. Assim, o condicionamento proposto pelo projeto de lei se encontra alinhado com a jurisprudência das nossas Cortes Superiores”, justificou o relator.O projeto também estabelece regras para a monitoração de presos. Pela proposição, o juiz pode determinar a fiscalização eletrônica para aplicar pena privativa de liberdade a ser cumprida nos regimes aberto ou semiaberto ou conceder progressão para tais regimes. Outras hipóteses previstas são para aplicar pena restritiva de direitos que estabeleça limitação de frequência a lugares específicos; e para concessão do livramento condicional.Ainda de acordo com o PL aprovado, o preso que violar ou danificar o dispositivo de monitoração eletrônica fica sujeito a punições como a revogação do livramento condicional e a conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade.
* Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.