Brasília – Não se maginava que a Agência Nacional de Mineração (ANM), a última das 11 agências reguladoras a ser criada por decreto, em 2017, sob a forma de autarquia de regime especial, após a extinção do antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), em tão pouco tempo sofresse um desmonte, como o relatado por seu recém-empossado diretor-geral, Mauro Henrique Moreira Sousa, durante a audiência pública na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados.
A ANM tem a função de regulamentar, controlar e fiscalizar a execução de serviços públicos transferidos para o setor privado por intermédio de concessões, permissões e principalmente a fiscalização de um dos setores cruciais da economia nacional, o da lavra e mineração no Brasil, mas hoje está praticamente em colapso.
Requerida pelos deputados Joaquim Passarinho (PL-PA), vice-presidente da CME, e Keniston Braga (MDB-PA), a reunião, ocorrida na terça-feira (18), expôs a equivocada política adotada pelo governo federal e executada pelo Ministério da Fazenda (Ex-Economia), de contingenciar os recursos destinados à autarquia, causa principal de seu sucateamento.
Após o diagnóstico apresentado pelo diretor-geral, os deputados membros da CME e o senador Zequinha Marinho (PL-PA) chamaram para si a tarefa de reverter o quadro de “terra arrasada” em que a ANM está enredada.
Não bastasse a falta de pessoal e recursos para atualizar dos softwares específicos para o trabalho da agência, gasolina e até a manutenção mínima dos escritórios que ainda permanecem abertos, os servidores da ANM entraram em “estado de greve” na segunda-feira (17), um dia antes da audiência na Câmara.
O comando de greve disse que a mobilização era o último recurso para chamar atenção da sociedade para a falta de pessoal necessário para realização dos serviços essenciais ligados à autarquia. A ação foi decidida em assembleia do Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação (Sinagências).
Embora o anúncio da direção da Sinagências cause desconforto para qualquer administrador, o diretor-geral Mauro Henrique Moreira Sousa elogiou o que chamou de “abnegados profissionais especializados e profissionais valorosos”. Ele entende a situação devido à defasagem salarial do quadro e o desânimo que tem gerado no ambiente de trabalho, uma vez que os salários pagos na ANM, em comparação com outras 10 agências, estão defasados na ordem de 60%, o que é incompreensível.
Cinco mil em busca da legalização
Se a ANM não fiscaliza nem autoriza a atividade minerária no país e deixa de despachar os mais de 40 mil processos esperando solução na região de uma Reserva Garimpeira do Tapajós, oeste do Pará, criada em 1983 pelo próprio governo federal, esse contingente de trabalhadores não pode ser enquadrado pela prática de crime ambiental.
Mauro Sousa disse na audiência que um dos procuradores do órgão alertou: “A situação da ANM é inconstitucional”. É um sinal de que um dos caminhos a serem trilhados para encaminhar solução do dilema da agência será judicializar algumas questões discutidas na audiência na CME.
A contradição é patente, os processos aguardam pessoal para que possam tramitar e, enquanto o tempo passa, é solução de continuidade que haja o cometimento de crimes ambientais. “O descaso do governo é evidente”, disse na CME, o deputado estadual Wescley Thomaz (PSC-PA), presente na última sexta-feira (14) numa audiência em Itaituba, oeste do Pará, que reuniu cinco mil pessoas ligadas ao garimpo e à mineração de pequena escala. Representando na ocasiçao a Comissão de Mineração da Assembleia Legislativa do Pará, o deputado defende que seja considerado judicializar o processo para forçar que os pedidos de legalização da atividade garimpeira na região tenham prosseguimento.
O senador Zequinha Marinho, que também estava na audiência pública em Itaituba, disse na CME que a atividade garimpeira na região é responsável por 50% de toda a atividade econômica qua ali é desenvolvida. “Quando a atividade mingua, lá no nascedouro, ela sai prejudicando, por tabela, tudo o mais. O comércio fecha, o emprego desaparece (…) a atividade econômica murcha. Como é que agente faz numa situação dessa?”, indagou.
Segundo o senador, o braço repressor do Estado consegue chegar, mas o braço que dá oportunidade para o garimpeiro exercer a sua atividade não consegue chegar. “São milhares de pessoas que vivem do garimpo, não sabem fazer outra coisa”, salientou.
”Quero fazer um apelo à ANM. São 11 mil requerimentos parados naquela região. Naturalmente, alguns devem estar em áreas que não são permitidas a atividade garimpeira e devem ser indeferidos. Mas, onde é possível regularizar, como na APA Tapajós, que deve dar 10% de toda essa demanda. Nas áreas brancas, que devem ter mais 20% dos pedidos, ou seja, do total, em torno de 30% é possível regularizar. Não dá mais para ficar assistindo o espetáculo da miséria chegando na porta. Da fome e da violência que vem em seguida. Sabemos das limitações da ANM, mas quando tem boa vontade a gente dá um jeito. Trata-se de um problema de emergência e urgência”, alertou o senador.
“Não tem dinheiro na ANM, se é necessário que agente vá ao ministro da Fazenda, Haddad, nós vamos. A atividade gera recursos, então é possível que o governo se convença de montar uma força-tarefa e dar solução para tudo isso”, sugeriu Zequinha Marinho, se prontificando a fazer o que for necessário para ajudar a ANM no que estiver ao seu alcance.
Durante a audiência na CME, uma das soluções do problema de “indigência institucional” na qual a ANM se encontra, é pautar e votar o Projeto de Lei (PL nº 4.054/2019), de autoria do deputado Joaquim Passarinho, que veda o contingenciamento de recursos à autarquia, de empenho e movimentação financeira das ações orçamentárias que tenham como fonte de recursos a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM).
O PL tramita em fase terminativa. Ou seja, não precisa ir a Plenário e está na CCJ desde o dia 17 de novembro de 2021 aguardando pauta para ser votado.
Outro que se colocou à disposição da ANM para buscar saídas para o descalabro em que se encontra foi o deputado federal Keniston Braga (MDB-PA), proponente da audiência no colegiado e que está sendo fortemente demandado pelo municípios mineradores e não mineradores, impactados pelos grandes projetos de mineração na área de sua base política, na maior Província Mineral do Mundo, a Região do Carajás, no sul e sudeste do Pará.
“Devido o problema de recursos humanos na ANM, os atrasos do repasses da Cfem tem prejudicado o planejamento financeiro das prefeituras e do próprio governo do Pará”, reclamou Braga.
Uma reunião ficou de ser agendada para discutir ações imediatas que podem ser consideradas a fim de encaminhar uma solução dos problemas da ANM. Sem dúvida, o primeiro é acertar a questão salarial e conter a ameaça de greve, avaliam os congressistas com o didetor-geral da ANM.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.