Brasília – Sob intensa pressão — a maior —, desde que o Congresso aprovou o status de instituição independente, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), se reúne nesta quarta-feira (21) e, no final do expediente, informará qual será a Selic, taxa básica de juros, para os próximos 45 dias. Agentes financeiros apostam na manutenção do índice no atual patamar de 13,75%, mas a expectativa é que haja, a partir de agosto, na próxima reunião do comitê, o início da série de queda dos juros.
Se pudesse, numa canetada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já teria ordenado a baixa — na marra — da taxa, mas desde a segunda vez em que foi presidente, as regras não são mais as mesmas.
No outro lado da rua que separa o Palácio do Planalto, sede do Poder Executivo Federal, da cúpula invertida na fachada do Palácio do Congresso Nacional, que representa o Senado Federal, garantidor da independência do Banco Central, há desconforto com a taxa Selic, mas, contrariando a vontade de Lula, não se cogita uma volta ao passado retirando a independência do Banco Central.
Clima político
Lula discursa desde o início do ano para que o BC baixe a taxa de juros. Parte do setor empresarial e um número incerto de senadores, dependendo do campo político de atuação, estão atentos às necessidades do setor produtivo e ecoam o pedido daquele que no passado foi um operário do setor metalúrgico. Alguns senadores, nas sombras, cumprem o papel de ameaçar, como é magistralmente descrito no livro “Política: quem faz, quem manda, quem obedece”, da jornalista Lucia Hipolito, que, infelizmente, acaba de falecer em um hospital no Rio de Janeiro.
Esses senadores, disseram as autoridades do governo, afirmaram a membros da equipe econômica que Campos Neto pode ser destituído de seu mandato se o banco não entregar um corte de juros ou pelo menos um sinal claro de uma flexibilização iminente nesta quarta-feira.
Outros, incluindo o senador Humberto Costa, do Partido dos Trabalhadores, foram mais cuidadosos. “Há uma insatisfação crescente entre os senadores, que esperam que os juros comecem a cair”, disse Costa, em entrevista a um jornal de São Paulo.
Questionado se os senadores poderiam aprovar uma possível moção para abreviar o mandato de Campos Neto, ele respondeu: “Tem um movimento no Senado, mas agora é para pressionar por um corte na taxa. Se isso não acontecer logo, esse movimento pode crescer”, ameaçou.
Embora a lei de autonomia do Banco Central aprovada em 2021 dê ao Senado a prerrogativa de destituir os integrantes do Copom cuja atuação seja considerada “insuficiente para cumprir as metas”, uma medida tão drástica não teria apoio da maioria da Câmara, mesmo entre os membros do Partido dos Trabalhadores, segundo três diferentes pessoas familiarizadas com tema, afirmou o jornal paulista.
Os senadores temem, em particular, que a remoção de Campos Neto agora enfraqueça a lei de autonomia que eles aprovaram há apenas dois anos, com provável repercussão negativa entre os investidores, disseram eles.
Além disso, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já disse que não vê razão para apoiar tal movimento, o que significa que é improvável que o leve a votação no plenário.
Lula já indicou que agora cabe ao Senado decidir sobre o futuro de Campos Neto. “O presidente do Banco Central precisa explicar por que não baixou os juros, não para mim que já sei o motivo, mas para o povo brasileiro e o Senado.”
Análise técnica
Sem economês, na prática, o Copom decide a Selic, a taxa básica de juros da economia. A decisão impacta a vida financeira dos brasileiros de duas formas: aumenta ou diminui o custo do crédito e o rendimento de aplicações financeiras de renda fixa e de renda variável (ações) de forma indireta.
A autoridade monetária aumentou os juros a partir de abril de 2021, de 2% para 13,75% ao ano, para combater a inflação, ao elevar a despesa com empréstimos e reduzir o consumo. Agora que conseguiu desacelerar a alta generalizada dos preços, o colegiado está perto de começar a cortar a Selic.
É praticamente certa a manutenção da taxa em 13,75% ao ano na decisão de hoje. Contudo, a comunicação do Copom será analisada com lupa pelos investidores. A desvalorização do dólar, a inflação abaixo do esperado e o risco fiscal menor levaram o mercado a antecipar as expectativas para o começo do ciclo de cortes de juros e a esperar um tom mais suave no comunicado. Na próxima semana sai a ata da reunião com a análise técnica completa da decisão do comitê.
O levantamento aponta, ainda, que a mediana das projeções indica uma diminuição na taxa em agosto, data da próxima reunião. É uma antecipação em comparação à pesquisa anterior, divulgada em 2 de maio, quando o ponto-médio das estimativas apontava o início das reduções em setembro. Para o fim do ano, a mediana das expectativas passou de 12,5% para 12,25%.
O banco BTG Pactual afirma em relatório que, ainda que não haja espaço para corte de juros hoje, espera um ajuste na comunicação que permita que o Copom comece a diminuir a Selic no encontro seguinte, em agosto.
“Na comunicação, esperamos a retirada da última frase do texto, onde diz que ‘não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como o esperado’. A manutenção deste trecho dará ao mercado a interpretação de um tom mais duro e dúvidas sobre o começo do ciclo de cortes em agosto”, diz a equipe da instituição financeira.
Se Copom não começar a agir em agosto, começa em setembro
O mercado começa a ficar mais confortável em projetar menos juros para 2023, indicando até mesmo no último Focus a chance de encerrar o ano em algo como 12,25% de Selic ao ano, o que seria um avanço ante os 13,75% atuais.Haveria, portanto, um espaço de 150 pontos-base disponíveis para corte no atingimento do nível projetado (mediana das estimativas).
Estão previstas mais quatro reuniões no calendário do Copom no segundo semestre, abrindo espaço para múltiplas interpretações sobre como a autoridade monetária deverá conduzir cada encontro.
Debate sobre meta de inflação perdeu força
Além disso, a percepção de que o Conselho Monetário Nacional (CMN) irá manter inalterada a meta de inflação em 3% na reunião da próxima semana também traz segurança ao mercado para continuar reduzindo as estimativas inflacionárias.Muito provavelmente, há indicadores que haverá uma alteração na forma de apuração da meta, passando de uma abordagem anual para uma apuração contínua, podendo também haver uma mudança na banda de tolerância ao redor da meta (menos provável, mas possível).“Grosso modo, se implementadas com cuidado, essas mudanças podem trazer benefícios adicionais ao regime de metas”, diz artigo assinado pelo financista Matheus Spiess para o site SeuDinheiro.
“A decisão do CMN terá um impacto significativo na formação das expectativas de inflação e, consequentemente, na condução da política monetária, garante Spiess.
“Isso evidencia a importância da reunião que ocorrerá no final deste mês, para além da reunião do Copom entre os dias 20 e 21. Os ativos de risco devem responder bem a todo o processo, assim como fizeram até aqui”, finaliza o especialista.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.