Brasília – Não é só a crise da proibição da licença ambiental para estudos de uma provável exploração de petróleo off shore (na Foz do Rio Amazonas) que coloca em lados antagônicos os ministérios do Meio Ambiente e Minas e Energia. Outro projeto, vital para o país e para a Região Norte, a Estrada de Ferro Ferrogrão, coloca em rota de colisão o Ministério da Agricultura e Transportes e o recém-criado Ministério dos Povos Indígenas.
No final deste mês, o Supremo Tribunal Federal (SFT) volta a julgar o caso, suspenso cauterlamente pelo ministro Alexandre de Moraes, a pedido do PSol, que suspendeu a concessão da obra para a iniciativa privada em 2021.
Prestes a ter seu destino definido pelo STF, o projeto da Ferrogrão — ferrovia de 933 km que escoará a safra de soja do Mato Grosso para portos fluviais do Norte — é o primeiro grande empreendimento de infraestrutura a ter sinal verde tanto do Ministério do Meio Ambiente, quanto do Ministério da Agricultura e dos Transportes.
O Ministério do Meio Ambiente afirma que o empreendimento terá impacto ambiental positivo. Isso porque a Ferrogrão vai reduzir o fluxo de cargas na BR-163, o principal corredor de escoamento entre o Centro-Oeste e o Norte.
A pasta avalia que a emissão de poluentes dos caminhões e a ocupação desordenada no trajeto seriam diminuídos com o estabelecimento da ferrovia.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou publicamente que defende o projeto como forma de ampliar a vazão da carga do Centro-Oeste, tanto pelos portos do Norte, quanto pelo Porto de Santos (SP) — o maior da América Latina, mas com congestionamentos monumentais na época de pico, após a colheita e o incrementos das exportações.
Defensora da obra, a CNA (Confederação Nacional da Agropecuária) disse ao Supremo que a Ferrogrão operará com comboios de 160 vagões capazes de transportar 100 toneladas cada um. Serão três locomotivas, com quatro motores cada.
Pelas contas da entidade, cada viagem substituirá o equivalente a 400 caminhões que transportam as cargas atualmente.
Na semana passada, no entanto, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, que é do Psol, enviou ofício à AGU (Advocacia-Geral da União) pedindo que o órgão se manifeste contra a construção da Ferrogrão.
No documento, ela afirma que a ferrovia trará impactos para as populações originárias da região e que a intervenção na área precisa de aval do Congresso.
A situação causou constrangimentos no Planalto. O projeto tem aval pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), já afirmou publicamente que a ordem do presidente é levar o projeto adiante para melhorar o desempenho da safra brasileira.
A estimativa, feita em 2020, é de que a obra, com investimentos totais de R$ 21,5 bilhões, a cargo da iniciativa privada, vai gerar em 69 anos (nove de construção e 60 de operação) mais de 424 mil empregos.
Inicialmente, os trens devem transportar cerca de 21,2 milhões de toneladas (no primeiro ano) e 46,9 milhões no vigésimo ano.
A polêmica sobre a Ferrogrão envolve a supressão de parte do Parque Nacional do Jamanxim. Medida provisória enviada em novembro de 2016 pelo então presidente Temer ao Congresso autorizou a retirada de 464 hectares para comportar o traçado da ferrovia.
Em compensação, acrescentou outros 51 mil hectares à área protegida. O Congresso converteu a medida em lei em junho de 2017.
No entanto, mais de três anos depois, em setembro de 2020, o Psol questionou o ato no Supremo, alegando que a alteração no parque deveria ter sido proposta ao Congresso via projeto de lei, e não por MP. O ministro Alexandre de Moraes concedeu a liminar em março de 2021.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.