Entrou água nos planos da mineradora multinacional Vale para obter a renovação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás (EFC), maior vetor do Produto Interno Bruto (PIB) do Pará e que responde pela circulação de um terço das riquezas do estado. A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) deu parecer rejeitando a proposta encampada pelo governo e não só: os técnicos da Secretaria de Infraestrutura (Seinfra) de Portos e Ferrovias do TCU pedem ainda o arquivamento da proposta.
As razões do TCU para reprovar a estratégia são diversas, mas os pontos principais são o estudo de demanda, o preço de transferência e a falta de vantajosidade para a renovação da proposta. O Blog do Zé Dudu apurou que no último dia 20 foram acostados documentos novos ao processo e no dia 28 a Seinfra finalizou seu parecer quanto à situação. O relator do processo, ministro Bruno Dantas, está analisando o documento há quase duas semanas.
A discussão agora gira em torno do convencimento do relator para a vantajosidade da renovação antecipada, antes que o processo seja levado a plenário. Há três situações a serem consideradas pelo ministro: levar em conta o parecer do TCU e encerrar a discussão, não permitindo a renovação; acatar a proposta do governo; ou propor uma espécie de meio de campo que atenda aos dois pontos de vista.
A prorrogação antecipada do contrato de concessão da Estrada de Ferro Carajás foi qualificada no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do Governo Federal. Os benefícios esperados a partir da prorrogação do contrato atual, por mais 30 anos, serão a obrigatoriedade de investimentos em segurança e o aumento de capacidade, que serão pactuados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). A prorrogação, que terminará em 30 de junho de 2027, também pode antecipar investimentos, que seriam feitos apenas depois de 2027.
Consequências para o Pará
Se a renovação antecipada da concessão da EFC não for aprovada, várias grandes obras podem ser, por tabela, afetadas, no todo ou em parte. Numa matemática rasteira, pelo menos R$ 20 bilhões podem deixar de circular em “elementos novos” apenas no eixo entre Parauapebas e Marabá.
A construção da segunda ponte rodoferroviária sobre o Rio Tocantins, na área urbana de Marabá, por exemplo, seria atingida em cheio. Isso porque a Vale ― que alardeou aos quatro cantos em 2019 obras da nova ponte inclusive para este ano ― ficaria desmotivada para tocar o projeto, que seria um complemento da duplicação da ferrovia para as suas ambições, mas também contribuiria sobremaneira para a infraestrutura de Marabá. A ponte sobre o Rio Tocantins é a obra de arte do interior do estado sobre a qual circula o maior número de veículos diariamente.
Outra programação que seria revista é a ampliação da capacidade nominal de produção da mina de S11D, em Canaã dos Carajás. Sem a possibilidade de renovação da Estrada de Ferro de Carajás, a programação, que começou a ser ventilada no ano passado após o sucesso comercial da mina, poderia ir parar na gaveta por um tempo maior que o esperado. Até o final do ano que vem, a Vale deve atingir a capacidade nominal de produção em seu maior projeto de mineração.
Também existem outras minas cuja abertura e ou ampliação dependem da segurança jurídica em torno da EFC, sobretudo os projetos já previstos no radar para começo na próxima década, como as minas de N1, N2 e N3 em Parauapebas, além da retomada da mina de Serra Leste em Curionópolis.
Nota da Vale
Em nota encaminhada ao Blog, a Vale informa que “acredita que a prorrogação antecipada das concessões ferroviárias vai ajudar na retomada do crescimento econômico do país. Entre 2006 e 2019, a empresa investiu R$ 23,7 bilhões na Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM) e na Estrada de Ferro Carajás (EFC) que as transformaram nas ferrovias mais seguras e produtivas do país, segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Apesar de a Vale ser responsável por apenas 6% da malha nacional, 62% de todos os produtos transportados por trens no Brasil passam por suas ferrovias. Deste total, quase 30% são cargas gerais, como combustíveis, fertilizantes e produtos agrícolas”.
Informa, ainda, que a “empresa segue acompanhando o processo de prorrogação antecipada de suas duas ferrovias, cujos estudos técnicos e documentos jurídicos estão, atualmente, em análise no Tribunal de Contas da União, e aguarda o fim do processo na esfera pública para submeter a proposta, com as contrapartidas requeridas, ao seu Conselho de Administração”.
Nota Governo do Pará
A Procuradoria Geral do Estado (PGE) informa que concorda com a decisão do TCU que reprovou a renovação antecipada e esclarece que o fato não vai gerar danos ao Estado. A PGE afirma que o processo de renovação tem que ser feito no prazo normal previsto no contrato e com o direcionamento dos investimentos para o estado do Pará.