O plenário da Assembleia Legislativa foi palco hoje (31) do lançamento, no Pará, da campanha “Contas Públicas são da Nossa Conta”, apresentada ao País em maio de 2018 numa iniciativa da Associação Nacional dos Ministros e Conselheiros Substitutos dos Tribunais de Contas do Brasil (Audicon), que busca transparência na gestão pública e, principalmente, maior envolvimento dos cidadãos brasileiros na fiscalização do uso e aplicação dos recursos públicos.
O tema é “árduo e complexo”, mas que precisa ser levado avante, como bem observou o ministro substituto do Tribunal de Contas da União (TCU) e presidente da Audicon, Marcos Bemquerer, que presidiu o evento na Alepa e do qual participaram os presidentes dos tribunais de Contas do Estado do Pará (TCE), Odilon Teixeira, e dos Municípios (TCM), Sérgio Leão; a subprocuradora de Justiça do Estado, Maria Cândida do Nascimento; a procuradora-geral do Ministério Público de Contas do Pará, Silaine Vendramin; e Stephenson Oliveira Victer, presidente da Associação Nacional do MP de Contas (Ampcon); entre outras autoridades.
Da Alepa, participaram os deputados Miro Sanova (PDT) e Carlos Bordalo (PT). O presidente da Casa, deputado Daniel Santos (MDB), de quem partiu o requerimento para realização do evento na Assembleia, teve compromisso de última hora com o governador Helder Barbalho, em Santarém.
“No Pará, a situação é de debater e buscar soluções viáveis para a sustentabilidade das contas públicas. É um tema complexo, mas que precisa ser bem produzido e trabalhado para despertar o interesse da população”, disse Marcos Bemquerer. “A transparência e a participação social ativa são elementos promotores da eficiência da gestão pública e do combate à corrupção”.
Marcos Bemquerer citou os últimos levantamentos sobre corrupção, que mostram que no mundo o roubo do dinheiro público chega à cifra estratosférica de U$ 3 bilhões a R$ 4 trilhões, por ano. No Brasil, os números variam anualmente entre R$ 120 bilhões e R$ 200 bilhões, que correspondem aos 3% de propina geralmente pagos aos corruptos.
“O maior problema não é a propina de 3% paga ao corrupto. Mas os 97% que ele (gestor público) desperdiça para pagar isso. Aí vemos obras paralisadas, que são pagas e não realizadas, obras superfaturadas, obras desnecessárias. Isso faz parte do dia a dia dos tribunais de contas”, disse Bemquerer, acrescentando que o desperdício, por ano, gira entre R$ 600 milhões e R$ 700 bilhões, por ano, quando a Reforma da Previdência quer economizar, em dez anos, cerca de R$ 800 bilhões. “Os números assustam realmente”, sublinhou o presidente da Audicon.
Desperdício no Pará
No Pará, o TCM tem exigido dos governos municipais informações sobre obras paradas no Estado. Em março deste ano, o levantamento do tribunal apontava para 255 obras abandonadas, um desperdício de quase R$ 1 milhão, valor que deveria ser bem maior porque dos 144 municípios apenas 75 responderam ao TCM.
Do Estado, o TCE tem exigido investimento nas escolas, principalmente no interior paraense, onde muitos prédios estão em condições precárias. Em 2017, o tribunal apresentou uma série de recomendações ao governo estadual, mas, segundo a conselheira Milene Cunha, do TCE, até hoje “apenas 20% das recomendações foram implementados, ainda assim, parcialmente”.
É nesse momento que os tribunais de contas esperam contar com a fiscalização da sociedade. “Os cidadãos são os verdadeiros olhos. A gente não consegue ter servidor em cada canto da cidade, mas o cidadão, sim, está em todos os cantos e ele é a melhor pessoa para nos dizer se aquela escola está sendo construída, se aquela política está funcionando, se o hospital tem remédio. Incentivar o controle social é algo que precisamos fazer constantemente”, reforçou a presidente do Ministério Público de Contas, Silaine Vendramin.
Para essa fiscalização, a campanha espera que entidades e os governos induzam o cidadão a participar ativa e efetivamente da fiscalização. “Cada cidadão deve perguntar: pra onde vai nosso dinheiro?”, sugeriu Marcos Bemquerer. “Daí, vem a importância que o Estado brasileiro precisa se modernizar constantemente para se tornar mais transparente”, complementou o ministro.
Até porque, arrematou Silaine Vendramin, o Estado tem obrigação de devolver os altos impostos que cobra da população, com obras e serviços. “O cidadão precisa se apropriar desse conhecimento porque muitas vezes parece que o Estado está fazendo um favor quando o Estado não está fazendo nenhum favor. É dever e obrigação do Estado trazer melhorias sociais para a população”, assinalou a presidente do MPC.
Parecer técnico x parecer político
Mas e quando os próprios tribunais de contas desconsideram pareceres técnicos contrários à prestação de contas governamentais, como ocorreu no Pará, quando o TCE deu parecer favorável às contas do ex-governador Simão Jatene depois de o Ministério Público de Contas apontar sérias e graves irregularidades no governo tucano?
O Blog do Zé Dudu tratou sobre o assunto com Silaine Vendramin, para entender o motivo dos pareceres divergentes. E perguntou se bate frustração quando um longo parecer técnico é desconsiderado. A presidente do MPC preferiu usar a diplomacia.
“Eu acho que são pontos de vista diferentes. Como eu falei, a Constituição nos deu esse dever do olhar mais legalista. Enquanto a Constituição deu este papel tanto para o Tribunal de Contas do Estado quanto para Assembleia Legislativa de um olhar mais político”, disse Silaine, para lembrar que o parecer das contas de Jatene ainda será submetido ao Legislativo, que deverá considerar o parecer das duas cortes de contas.