O mural de licitações do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) é o mais importante manancial de informações sobre coisas úteis e, principalmente, gafes, pérolas e batatadas que os gestores públicos municipais aprontam no Pará. Em análise simplória, que nem precisaria de muita perícia sobre valores e itens, é possível pegar no pulo várias situações que causam constrangimento e vergonha alheia por conta de flagrantes quanto ao (mau) uso do dinheiro público. As situações são cotidianas e envolvem tantos os municípios mais ricos quanto, e lamentavelmente, os mais pobres. A população — e sempre ela — paga o pato.
Nesta sexta-feira (25), uma curiosa licitação foi publicada pela Prefeitura de Tucumã, um dos municípios mais importantes do mundo “agro” no Pará, com rebanho bovino estimado em 327 mil cabeças. O governo municipal publicou um registro de preços, para conferir propostas no próximo dia 8 de julho, visando à contratação de empresa fornecedora de medicamentos veterinários e produtos agropecuários para atender ao Poder Executivo. O valor estimado? R$ 4,983 milhões (veja aqui).
O processo, com parecer jurídico favorável, é devidamente acompanhado de justificativa que, em poucas linhas, diz que a aquisição de medicamentos de uso veterinário é pedida pela Secretaria Municipal de Saúde, dada a necessidade de tratamento dos animais atendidos pela pasta. Diz ainda que a compra dos produtos agropecuários justifica-se pela inexistência nas secretarias. Entre os 178 itens alvo da compra estão medicamentos diversos para rebanhos e equipamentos como roçadeiras, motosserras, além de sementes, adubos e agrotóxicos (como inseticidas, formicidas, cupinicidas e herbicidas).
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) levantados pelo Blog, com referência a 2019, mostram que, naquele ano, a pecuária de Tucumã movimentou R$ 11,813 milhões na praça enquanto as commodities agrícolas renderam R$ 44,055 milhões. Os cerca de 8 mil colonos do município são os grandes protagonistas desses números.
Contas públicas de Tucumã
Com orçamento inicial previsto para este ano de R$ 147,31 milhões líquidos, a receita real, no entanto, é de R$ 117,42 milhões para um período de 12 meses corridos. A maior parte dela vem de fora, sendo o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) as principais fontes.
A maior de todas as despesas, e da qual não há como se desvencilhar, a folha de pagamento, é prevista este ano em R$ 75 milhões, mas a Prefeitura de Tucumã apresentou um excelente grau de gestão fiscal no primeiro quadrimestre de 2021, comprometendo apenas 45,98% de sua receita líquida com o funcionalismo. O máximo permitido em lei 54%.
Se fosse uma dotação do orçamento de Tucumã, a licitação do “pacote agro”, de R$ 4,983 milhões, seria superior, por exemplo, às despesas do município para manter a Câmara de Vereadores (R$ 3,525 milhões), para bancar políticas de habitação e moradia à população local (R$ 2,335 milhões), para cuidar da gestão ambiental (R$ 4,142 milhões) ou para proporcionar esporte e lazer aos munícipes (R$ 4,508 milhões). O orçamento inicial da agricultura de Tucumã para este ano era de R$ 7,581 milhões, mas foi rebaixado a R$ 6,804 milhões