O Conselho de Administração da Vale S/A deve se reunir nos próximos dias, para avaliar a oferta de US$ 2,5 bilhões (R$ 11,85 bilhões, cotação de hoje) por 10% da participação na sua unidade de metais básicos, responsável pela produção de níquel e cobre da mineradora. A oferta é de um consórcio formado pelo fundo soberano da Arábia Saudita Public Investment Fund (PIF) e pela mineradora estatal saudita Ma’aden. A informação foi publicada na terça-feira (25), no jornal norte-americano The Wall Street Journal e pela Agência Bloomberg, que deu mais detalhes.
Nesta quarta-feira (26), após a abertura do pregão da Bolsa de Valores (B3), o preço das ações da mineradora deve aumentar mais ainda mais de preços das ações da mineradora. Há uma semana as ações VALE3, consideradas muito descontadas (baratas), que vinham andando de lado, vêm experimentando uma reversão e já subiram 6,70% nos últimos cinco dias (veja o gráfico). Ontem, o papel fechou a R$ 72,01.
Desde outubro de 2022, tornou-se pública a informação de que a companhia buscava um sócio para a unidade de metais básicos, o qual poderia comprar participação de 10% do negócio por cerca de US$ 2,5 bilhões. A unidade de metais básicos da Vale é avaliada em US$ 25 bilhões (R$ 118,75 bilhões na conversão da cotação de terça).
Segundo disseram fontes, ao “The Wall Street Journal”, a Vale está perto de fechar o acordo. Em dezembro de 2022, a Vale anunciou que estava estudando a venda da participação de 10% na sua unidade de metais básicos, sem revelar o preço que estava pedindo no mercado. A General Motors foi uma das empresas que se interessou, assim como o Qatar Investment Authority.
Em maio, a mineradora havia recebido uma série de propostas vinculantes envolvendo os metais básicos. A agência “Bloomberg” publicou no mês passado que o PIF apareceu como o principal candidato a comprar a participação de 10% no negócio de níquel e cobre da Vale. Fontes afirmaram que o acordo ainda não é definitivo e pode não avançar.
O fundo soberano da Arábia Saudita lançou em janeiro uma iniciativa conjunta de US$ 3 bilhões junto com a Ma’aden para investir em ativos de mineração estrangeiros com foco em minério de ferro, cobre, níquel e lítio, metais considerados estratégicos para várias aplicações.
Interessados
Houve muitos interessados na transação. A lista, dizem fontes, começou com mais de 20 potenciais parceiros, foi reduzida para pouco mais de uma dezena para ser limitada, no fim, a meia dúzia. Até maio, a lista de interessados incluía grandes empresas da indústria automobilística, caso da GM, mas também fundos soberanos e de pensão, aí considerados o CPP, do Canadá, e os árabes QIA, do Qatar, e PIF, da Arábia Saudita. A relação considerava ainda tradings como a japonesa Mitsui, cujo grupo econômico é sócio da Vale.
A Vale não endossa publicamente nenhum dos nomes em razão do sigilo da negociação, mas, em comunicado ao mercado divulgada em 26 de junho, a comunicação da Vale confirmou que está buscando “ativamente” parceria para o negócio de metais não ferrosos como parte da estratégia de atrair investimentos e acelerar o crescimento do negóci
“A Vale vem atualizando o mercado sobre este assunto de forma regular, no entanto, neste estágio, não pode confirmar ainda o valor de um eventual investimento nem as partes envolvidas”, disse em um trecho do comunicado. Informou ainda que a transação faz parte de uma série de ações estratégicas, tomadas ao longo dos últimos 18 meses, para melhor posicionar o que chamou de Vale Metais Básicos e acelerar os planos de crescimento da empresa no Brasil, Indonésia e Canadá, países onde tem suas operações de produção de cobre e níquel, os principais produtos metálicos do portfólio.
Especialistas habituados a operações de fusão e aquisição (M&A, na sigla em inglês) dizem que transações como a que a Vale conduz nos metais precisam passar por diferentes etapas. Esse processo começa com ofertas não vinculantes para se chegar a propostas firmes. O candidato escolhido faz auditorias (“due diligence”, na linguagem corporativa) e entra-se então na fase final de contratos e documentações.
Embora o preço seja um fator importante para a transação, há outros elementos considerados e que, no caso da Vale, também têm peso relevante. O alinhamento na visão de governança corporativa é um deles. Fontes dizem que a proposta do PIF foi mais interessante para a Vale por considerar esses fatores combinados. O fundo soberano saudita também teria sido mais flexível em alguns pontos, tendo exigido condições consideradas “mínimas” para o acordo.
Um executivo disse que há casos em que o potencial parceiro pode exigir um acordo mais restritivo, o que tenderia a dificultar, por exemplo, a entrada de outros parceiros no negócio no futuro. Não parece ser o caso com o PIF. A transação já recebeu sinal verde do conselho de administração da mineradora e existe a possibilidade, mesmo que remota, de que os sauditas, se assim o desejarem, tragam com eles outro investidor ao qual poderiam ceder uma parte da fatia dos 10% no negócio.
O M&A nos metais na Vale é complexo e vem demorando pois trata-se de um negócio de grande monta. A Vale é a segunda maior produtora de níquel do mundo, atrás da russa Nornickel, e tem ativos de porte em cobre, embora não esteja entre os líderes no setor. Tomando por base o montante da transação (US$ 2,5 bilhões por 10% do negócio), se conclui que a unidade de metais da mineradora está sendo avaliada na casa dos US$ 25 bilhões (R$ 120 bilhões).
Nova empresa e expansão
O presidente da Vale, Eduardo Bartolomeo, cujo mandato encerra em maio de 2024, disse, em dezembro, que a nova empresa de metais pode vir a superar o próprio valor de mercado da mineradora. Esse valor era de US$ 62,6 bilhões (R$ 299,1 bilhões).
Todo o dinheiro arrecadado na transação será destinado ao caixa da nova empresa, que deverá ter sede em Toronto, no Canadá. Esse aporte de caixa será importante para fazer crescer o negócio. Só no Brasil existe a expectativa de que a empresa invista cerca de R$ 50 bilhões na próxima década em projetos de cobre e níquel na região Norte do país, no Pará, entre expansões e projetos novos.
Em termos globais, considerando as operações também no Canadá e na Indonésia, a expectativa da Vale é triplicar a produção de cobre e também elevar o volume produzido de níquel. No Vale Day, encontro com investidores na bolsa de Nova York em dezembro de 2022, a Vale projetou que a produção de cobre possa chegar a cerca de 900 mil toneladas a partir de 2030 ante um volume de 253 mil toneladas em 2022. No níquel, a estimativa é alcançar mais de 300 mil toneladas no mesmo horizonte de tempo diante de 179 mil toneladas no ano passado.
Transição energética
O pano de fundo de todo esse movimento é a transição energética, a busca de governos e empresas por investir em fontes de energia mais limpas e reduzir as emissões de gases poluentes. Metais como cobre, níquel, cobalto e lítio são insumos para a produção de carros elétricos. O cobre também é usado como matéria-prima para projetos de geração eólica e solar.
A própria Vale indicou que a empresa vem trabalhando há um ano e meio na separação do negócio de metais do restante da companhia, cujo carro-chefe é o minério de ferro, insumo da indústria siderúrgica para produzir aço. Com a separação dos metais, a Vale deve ter dois negócios independentes: minério de ferro e metais básicos.
Em relatório sobre os metais este ano, o BTG Pactual avaliou que a transação vai permitir à Vale ter duas histórias diferentes. Uma é a do minério de ferro, atividade que continuará a ser uma forte geradora de caixa (“cash cow”, na linguagem corporativa). Nesse segmento, disse o banco, as oportunidades de crescimento são limitadas e há perspectiva de que a geração de caixa livre siga sendo destinada para os acionistas na forma de dividendos e recompra de ações. Já o negócio dos metais é visto como uma plataforma para a transição energética que vai exigir fortes investimentos para atender a demanda do mercado.
Nesse período de 18 meses, no qual a Vale vem trabalhando na cisão dos metais, houve a separação gerencial do negócio. Foi contratado Mark Cutifani, ex-CEO da Anglo American, para o cargo de “chairman” da nova empresa. O colegiado também será integrado por Jerome Guillen, ex-executivo da Tesla. O novo sócio da Vale nos metais também terá um assento no conselho da nova companhia, que contará ainda com a participação de Eduardo Bartolomeo, o CEO da mineradora.
O cargo de presidente-executivo da nova empresa deverá ser ocupado por Deshnee Naidoo, que assumiu a vice-presidência de metais básicos da Vale em dezembro de 2021. Apesar de todos os esforços, a Vale ainda tem um longo caminho e um dever de casa a fazer nos metais, negócio no qual a empresa perdeu muito dinheiro na última década e meia por problemas operacionais nas minas herdadas da antigo Inco, no Canadá e na Nova Caledônia, esta já vendida. A expectativa é que o novo sócio chegue para facilitar essa nova fase de crescimento. Mas só o tempo dirá se o casamento vai dar certo.
Decisão
De qualquer forma, é o Conselho de Administração da Vale que baterá o martelo. A composição acionária da empresa precisa de aval do governo porque até o fim de maio, o maior acionista individual da Vale é a Previ, com 8,69% do capital total, sendo seguida pelo Capital Group, fundo de ações norte-americano, com 7,04%.
Os demais acionistas com assento no board da da mega mineradora brasileira são: Cosan, Bradesco, Mitsui, Blackrock — maior empresa de investimentos do mundo —, e os acionistas minoritários. Todos com direito a voto no conselho.
Fonte: The Wall Street Journal e Bloomberg.com.
Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.
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