Oito professores municipais e agentes educacionais declararam greve de fome em Xinguara, no interior do Pará, para chamar a atenção para intervenção do Ministério Público Estadual nas negociações de reajuste salarial da categoria. Os educadores da cidade estão em greve há quase um mês, quando decidiram cruzar os braços após semanas de disputas por reajuste salarial e outros direitos. A Justiça foi acionada e se posicionou inicialmente de maneira favorável aos educadores, não determinando a volta às aulas imediatos.
O caso foi levado ao Tribunal Regional do Trabalho, que ainda não decidiu sobre a legitimidade da paralisação. O que revoltou os professores e culminou na greve de fome foi o fato de, mesmo sem uma definição da Justiça, o promotor Renato Bellini ter emitido recomendação orientando o município a cortar pontos, abrir processo administrativo contra os grevistas e e contratar substitutos. Em outras cidades paraenses como Abaetetuba e Barcarena, e mesmo na capital Belém, professores municipais também estão mobilizados, mas em nenhuma delas a situação chegou a tal extremo.
“Estamos há mais de 58 horas sem se alimentar, tomando somente água de coco e água, com acompanhamento médico”, diz a professora Maria Reis, da comissão de negociação dos grevistas. “Estamos tentando negociar, mas a situação chegou a tal ponto que não deu mais. Temos legalidade por parte do judiciário, mas não houve nenhum esboço de tentativa do governo municipal negociar”, afirma. “Não temos tido espaço para cobrar nossos direitos. Não podemos mais entrar nos espaços educacionais ou nas plenárias em que o assunto é discutido na Câmara Municipal. Colocaram seguranças para barrar nosso acesso.”
A Repórter Brasil tentou contato com o prefeito Osvaldinho Assunção (PMDB), mas não obteve retorno. Com 22 anos de profissão, a educadora reclama da maneira como a prefeitura está conduzindo a situação. “Estamos preocupados com o ano letivo e por isso resolvemos radicalizar. São vidas que estão aqui. Estamos em greve de fome em frente ao Ministério Público e o sindicato estadual (Sintepp) está em Xinguara para tentar negociar. A prefeitura está contratando substitutos, que não são pessoas qualificadas. O prefeito chegou a falar que resolveria a situação com mutirões de outras secretarias. Educação não se faz com mutirão e sim com profissionais”, lamenta.
Denúncia de desvio de recursos
Alvo do protesto, o promotor Renato Bellini afirma que não vai revogar a recomendação a não ser que a Justiça determine que a greve é legal. Questionado sobre o fato de ter assumido a defesa da prefeitura sem que a paralisação tenha sido julgada, ele diz que agiu por estar sendo pressionado por pais e pelos professores contrários à paralisação. “Houve um problema entre o juiz e o advogado do município, e o processo subiu para um desembargador. A gente perdeu a autoridade judicial e a greve continuou, não teve jeito”, diz o promotor, que defende que a greve em questão é ilegal. “Os piquetes são agressivos, há diversos problemas. E se eles fazem uma greve, têm que respeitar algumas regras. Uma delas é abrir a assembleia com quórum de instalação, de deliberação, ouvir todo mundo e conferir direito a voto. A decisão tem que ser colegiada, mas temos depoimentos de professores que afirmam terem sido expulsos da assembleia.”
Professores querem que Corregedoria do MPE investigue conduta do promotor.
Ele diz que os professores que cruzaram os braços não representam toda a categoria e têm sido intransigentes. “Participamos de três tentativas de negociação, mas a postura dos grevistas foi infrutífera. Eles sempre tumultuavam, nem chegaram a debater a proposta. O município entrou com uma ação para declarar a ilegalidade”, defende, ressaltando que em Xinguara o piso da categoria é respeitado – o promotor diz que, em municípios em que atuou antes, como Pacajá e Anapu, chegou a “encabeçar a luta dos professores porque a prefeitura não estava pagando o piso”.
“O município apresentou as planilhas e questões de custo. Eles estão cumprindo a lei do piso. Qual é o problema então? É que eles chegam nessas reuniões e começam a levantar questões, que tem desvio aqui, recurso aplicado indevidamente aqui, que tem contratado assim, que tem aquilo. E querem que essas denuncias sejam inseridas nessa discussão”, diz.
As denúncias dos professores são em relação à maneira como os recursos federais do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) estão sendo distribuídos na cidade. Os educadores reclamam que falta transparência e nunca tiveram acesso a informações sobre os repasses. Questionado se chegou a abrir inquérito para verificar as denúncias feitas nas reuniões, o promotor diz não ter cogitado a possibilidade até então. “Na hora que ficaram falando, me pareceu acusação sem fundamento. Precisa de elementos mínimos. Mas eu pedi, venham conversar, entreguem depoimentos, isso vai ser apurado. Vou instaurar procedimento de administração para ver isso do Fundeb. Não cheguei a verificar ainda, estou concentrado nas questões da greve”, afirma.
Fonte: Repórter Brasil